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Decreto
UNITATIS REDINTEGRATIO

I. PRINCÍPIOS CATÓLICOS SOBRE O ECUMENISMO

Unidade e unicidade da Igreja

2. A caridade de Deus para conosco se manifestou no fato de que o Filho Unigênito de Deus foi enviado ao mundo pelo Pai, para que, feito homem, regenerasse todo o gênero humano com a redenção e o reduzisse à unidade. Cristo, antes de oferecer-se a si mesmo no alto da cruz, como vítima imaculada, orou ao Pai pelos crentes, dizendo: "Que todos sejam um, como Tu, Pai, estás em mim e eu em ti; para que também eles sejam conosco e o mundo creia que Tu me enviaste" e instituiu em sua Igreja o admirável sacramento da Eucaristia, por meio do qual se demonstra e se realiza a unidade da Igreja. Impôs a seus discípulos o mandamento novo do amor mútuo e lhes prometeu o Espírito Paráclito, que permaneceria eternamente com eles como Senhor e vivificador.

Uma vez que o Senhor Jesus foi exaltado na cruz e glorificado, derramou o Espírito que havia prometido, pelo qual chamou e congregou, em unidade de fé, esperança e caridade, o povo do Novo Testamento, que é a Igreja, como ensina o Apóstolo: "Um só corpo e um só Espírito, como haveis sido chamados em uma esperança, a de vossa vocação. Um só Senhor, uma só fé, um só batismo"; visto que "todos os que haveis sido batizados em Cristo os haveis revestido de Cristo... porque todos vós sois um em Cristo Jesus". O Espírito Santo que habita nos crentes, que satisfaz e governa toda a Igreja, efetua essa admirável união dos fiéis e os congrega, todos, tão intimamente em Cristo, que Ele mesmo é o princípio da unidade da Igreja. Ele realiza a distribuição das graças e dos ministérios, enriquecendo a Igreja de Jesus Cristo com a variedade de dons "para a perfeição consumada dos santos, segundo a obra do ministério, e para a edificação do Corpo de Cristo".

Para o estabelecimento desta sua santa Igreja em todas as partes e até o fim dos tempos, confiou Jesus Cristo ao Calégio dos Doze o múnus de ensinar, governar e santificar. Dentre eles, destacou a Pedro, sobre o qual determinou edificar a sua Igreja, depois de exigir-lhe a profissão da fé; a ele prometeu as chaves do reino dos céus e, antecipando a manifestação de seu amor, lhe confiou todas as ovelhas, para que as confirmasse na fé e as apascentasse na perfeita unidade, reservando-se Jesus Cristo a ser Ele mesmo, para sempre, a pedra fundamental e o pastor de nossas almas.

Jesus Cristo quer que seu povo se desenvolva por meio da fiel pregação do Evangelho, pela administração dos sacramentos e pelo governo no amor, efetuado tudo isto pelos Apóstolos e seus sucessores, isto é, pelos bispos e sua cabeça, o sucessor de Pedro, com a ação do Espírito Santo; assim se realiza sua comunhão na unidade, na profissão de uma só fé, na comum celebração do culto divino e na concórdia fraterna da família de Deus.

Portanto, a Igreja, único rebanho de Deus, como um estandarte içado perante todos os povos, comunicando o Evangelho da paz a todo o gênero humano, peregrina cheia de esperança até a pátria celestial.

Este é o sagrado mistério da unidade da Igreja de Cristo e, por meio de Cristo, comunicando o Espírito Santo a variedade de seus dons, Ele, modelo supremo e princípio deste mistério, é a unidade de um só Deus na Trindade de pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo.

Relação dos irmãos separados com a Igreja católica

3. Nesta una e única Igreja de Deus, já desde os primeiros tempos, ocorreram algumas cisões que o Apóstolo condena com severidade; porém, com o passar dos tempos, surgiram discrepâncias maiores, separando-se da plena comunhão da Igreja não poucas comunidade, às vezes não sem responsabilidade de ambas as partes. Porém, os que agora nascem e se nutrem da fé em Jesus Cristo nessas comunidades não podem ser tidos como responsáveis do pecado da separação e a Igreja católica os abraça com fraterno respeito e amor, visto que aqueles que crêem em Cristo e receberam o batismo validamente, estão constituídos de alguma comunhão, ainda que não perfeita, com a Igreja católica.

Efetivamente, em razão das várias discrepâncias existentes entre eles e a Igreja católica, seja quanto à doutrina e às vezes também quanto à disciplina, seja também em relação à estrutura da Igreja, se interpõem à plena comunhão eclesiástica não poucos obstáculos, às vezes muito graves, que o movimento ecumênico tenta superar. Entretanto, justificados pela fé no batismo, acabam incorporados a Cristo de forma que recebem o nome de cristãos com todo o direito e são justamente reconhecidos como irmãos no Senhor pelos filhos da Igreja católica.

E mais: dentre o conjunto de elementos ou bens com que a Igreja se edifica e vive, alguns, ou melhor, muitíssimos e importantíssimo podem se encontrar fora do recinto visível da Igreja católica:a Palavra de Deus escrita, a vida de graça, a fé, a esperança e a caridade, e alguns dons interiores do Espírito Santo e elementos visíveis; tudo isto, que provém de Cristo e a Ele conduz, pertence, por direito, à única Igreja de Cristo.

Os irmãos separados praticam não poucos atos de culto da religião cristã, os quais, de várias formas, segundo a diversa condição de cada Igreja ou comunidade, podem, sem dúvida alguma, produzir a vida de graça e deve-se confessar que são aptos para deixar aberto o acesso à conhunhão da salvação.

Conseqüentemente, ainda que creamos que as Igrejas e comunidades separadas têm seus defeitos, não estão desprovidas de sentido e de valor no mistério da salvação porque o Espírito de Cristo não se recusou a servir-se delas como meios de salvação, cuja virtude deriva da mesma plenitude da graça e da verdade que se confiou à Igreja.

Os irmão separados, contudo, seja particularmente, sejam suas comunidades e suas igrejas, não gozam daquela unidade que Cristo quis dar aos que regenerou e vivificou em um corpo e em uma vida nova, que se manifestam na Sagrada Escritura e na venerável Tradição da Igreja. Somente por meio da Igreja católica de Cristo, que é auxílio geral da salvação, pode-se conseguir a plenitude total dos meios salvíficos. Cremos que o Senhor entregou todos os bens da Nova Aliança a um só colégio apostólico, a saber, o que é presidido por Pedro, para constituir um só Corpo de Cristo na terra, ao qual tem que se incorporar completamente todos os que de alguma maneira pertencem ao Povo de Deus. Povo que durante sua peregrinação pela terra, ainda permaneça sujeito ao pecado, cresce em Cristo e é conduzido suavemente por Deus, segundo seus inescrutáveis desígnios, até chegar feliz à total plenitude da glória eterna na Jerusalém celestial.

Ecumenismo

4. Hoje, em muitas partes do mundo, por inspiração do Espírito Santo, se fazem muitos experimentos com a oração, a palavra e a ação para se chegar àquela plenitude de unidade desejada por Jesus Cristo. Este Sacrossanto Concílio exorta a todos os fiéis católica a que, reconhecendo os sinais dos tempos, cooperem diligentemente na empreitada ecumênica.

Por "movimento ecumênico" se entende o conjunto de atividade e de empreendimentos que, conforme às distintas necessidades da Igreja e das circunstâncias dos tempos, se suscitam e visem favorecer a unidade dos cristãos.

Tais são, em primeiro lugar, todas as tentativas de se eliminar palavras, juízos e atos que não sejam conformes segundo a justiça e a verdade à condição dos irmãos separados e que, portanto, podem tornar mais difíceis as mútuas relações com eles; em segundo lugar, "o diálogo" estabelecido entre peritos e técnicos em reuniões de cristãos de diversas Igrejas ou comunidades, celebradas em espírito religioso. Neste diálogo, expões cada um, por sua vez, com toda a profundidade, a doutrina de sua comunhão, apresentando claramente as características da mesma. Por meio deste diálogo, todos adquirem um conhecimento mais autêntico e uma apreciação mais justa da doutrina e da vida de cada comunhão; em terceiro lugar, as diversas comunhões conseguem uma mais ampla colaboração em todas as obrigações exigidas por toda consciência cristã segundo o bem comum e, enquanto possível, participam na oração conjunta. Todos, finalmente, examinam sua fidelidade à vontade de Cristo com relação à Igreja e, como é devido, empreendem com ânimo a obra de renovação e reforma.

Tudo isto, realizado prudente e pacientemente pelos fiéis da Igreja católica, sob a vigilância dos pastores, conduz ao bem da equidade e da verdade, da concórdia e da colaboração, do amor fraterno e da união; para que pouco a pouco, por esta via, superados todos os obstáculos que impedem a perfeita comunhão eclesiástica, todos os cristãos se congreguem em uma única celebração da Eucaristias, segundo a unidade da una e única Igreja, a unidade que Cristo deu à sua Igreja desde o princípio, e que cremos subsistir indefectível na Igreja católica dos séculos.

É manifesto, porém, que a obra de preparação e reconciliação individuais dos que desejam a plena comunhão católica se diferencia, por sua natureza, da empreitada ecumênica, porém não encerra oposição alguma, já que ambas procedem do admirável desígnio de Deus.

Os fiéis católicos hão de de ser, sem dúvida, solícitos aos irmãos separados, na ação ecumênica, orando por eles, falando-lhes das coisas da Igreja, dando os primeiros passos até eles.Porém devem considerar também, por sua vez, com ânimo sincero e diligente, o que deve ser renovado e corrigido na mesma família católica, para que sua vida dê o mais fiel e claro testemunho da doutrina e das normas dadas por Cristo através dos Apóstolos.

Pois, ainda que a Igreja católica possua toda a verdade revelada por Deus e todos os meios da graça, contudo, seus membros não a vivem conseqüentemente com todo o fervor, a ponto da face da Igreja resplandecer menos perante os olhos de nossos irmãos separados e de todo o mundo, retardando-se com ele o crescimento do reino de Deus.

Portanto, todos os católicos devem buscar a perfeição cristã e esforçar-se cada um segundo a sua condição, para que a Igreja, portadora da humildade e da paixão de Jesus em seu corpo, se purifique e se renove dia após dia, até que se apresente gloriosa a Cristo, sem mancha nem ruga.

Guardando a unidade no necessário, todos na Igreja, cada um segundo o encargo que lhe tenha sido dado, observem a devida liberdade, tanto nas diversas formas de vida espiritual e de disciplina, como na diversidade de ritos litúrgicos, inclusive na elaboração teológica da verdade revelada; porém, em tudo pratiquem a caridade pois, com este proceder, manifestarão, cada dia mais plenamente, a autêntica catolicidade e apostolicidade da Igreja.

Por outro lado, é necessário que os católicos, com alegria, reconheçam e apreciem em seu valor os tesouros verdadeiramente cristãos que, procedentes do patrimônio comum, se encontram em nossos irmãos separados. É justo e saudável reconhecer as riquezas de Cristo e as virtudes na vida daqueles que dão testemunho de Cristo e, às vezes, alcancem o derramamento de seu sangue, porque Deus é sempre admirável e digno de admiração em suas obras.

Não há que se esquecer, tampouco, que em tudo que é trabalhado pelo Espírito Santo nos corações dos irmãos separados pode conduzir também à nossa edificação. O que de verdade for cristão não pode se opor, de forma alguma, aos autênticos bens da fé, mas, pelo contrário, sempre pode fazer que se alcance mais perfeitamente o próprio mistério de Cristo e da Igreja.

Contudo, as divisões dos cristãos impedem que a Igreja leve a efeito a sua própria plenitude de catolicidade naqueles filhos que, estando verdadeiramente incorporados a ela pelo batismo, estão, porém, separados de sua plena comunhão. Mais ainda, à mesma Igreja resulta muito difícil expressar, sob todos os aspectos, na realidade mesma da vida, a plenitude da catolicidade.

Este Sacrossanto Concílio adverte, com alegria, que a participação dos fiéis católicos na ação ecumênica cresce a cada dia e a recomenda aos bispos de todo o mundo, para que a promovam com diligência e a dirijam prudentemente.