A g n u s D e i

TERTIO MILLENNIO ADVENIENTE
João Paulo II
10.11.1994

V
« JESUS CRISTO É O MESMO ... SEMPRE »
(Heb 13,8)

56. A Igreja perdura há 2000 anos. Como o pequeno grão de mostarda do evangelho, ela cresce até se tornar uma grande árvore, capaz de cobrir com a sua ramagem a humanidade inteira (cf. Mt 13, 31-32). O Concílio Vaticano II, na Constituição dogmática Lumen gentium, ao considerar a questão da pertença à Igreja e da ordenação ao Povo de Deus, assim se exprime: « Todos os homens são chamados a esta unidade católica do Povo de Deus, à qual (...) pertencem, de vários modos, ou a ela se ordenam, quer os católicos quer os outros que acreditam em Cristo quer, finalmente, todos os homens em geral, pela graça de Deus chamados à salvação ».35 Por seu lado, Paulo VI, na Encíclica Ecclesiam suam, ilustra a inclusão universal dos homens no desígnio de Deus, ao sublinhar os vários círculos do diálogo da salvação.36

À luz desta impostação, pode-se compreender melhor também a parábola evangélica do fermento (cf. Mt 13, 33): Cristo, como fermento divino, penetra cada vez mais profundamente no momento presente da vida da humanidade, comunicando a obra da salvação cumprida no Mistério pascal. Além disso, Ele abraça no seu domínio salvífico também todo o passado do género humano, a começar do primeiro Adão.37 A Ele pertence o futuro: « Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e sempre » (Heb 13, 8). Por seu lado, a Igreja visa « unicamente este objectivo: continuar, sob a direcção do Espírito Consolador, a obra de Cristo que veio ao mundo para dar testemunho da verdade, para salvar e não para julgar, para servir e não para ser servido ».38

57. E por isso, desde os tempos apostólicos, continua sem interrupção a missão da Igreja no seio da família humana universal. A primeira evangelização estendeu-se sobretudo à região do Mediterrâneo. No decorrer do primeiro milénio, as missões, partindo de Roma e de Constantinopla, levaram o cristianismo a todo o continente europeu. Contemporaneamente, aquelas dirigiram-se para o coração da Ásia, até à Índia e à China. O fim do século XV, com a descoberta da América, marcou o início da evangelização naquele grande continente, ao Sul e ao Norte. Pelo mesmo tempo, as costas sud-saharianas da África acolheram a Luz de Cristo, e S. Francisco Xavier, padroeiro das missões, chegou ao Japão. Na passagem do século XVIII para o XIX, um leigo, André Kim, levou o cristianismo para a Coreia; naquela época, o anúncio evangélico atingiu a Península da Indochina, como também a Austrália e as ilhas do Pacífico.

O século XIX registou grande actividade missionária entre os povos da África. Todas estas obras deram frutos que perduram até hoje. O Concílio Vaticano II disso nos dá conta no Decreto Ad Gentes sobre a actividade missionária. Após o Concílio, a questão missionária foi tratada na Encíclica Redemptoris missio, relativa aos problemas das missões nesta última parte do nosso século. A Igreja continuará também no futuro a ser missionária: é que ser missionária faz parte da sua natureza. Com a queda dos grandes sistemas anticristãos no continente europeu - o nazismo primeiro e depois o comunismo -, impõe-se a tarefa urgente de oferecer de novo aos homens e mulheres da Europa a mensagem libertadora do Evangelho.39 Além disso, como afirma a Encíclica Redemptoris missio, reproduz-se no mundo a situação do Areópago de Atenas, onde falou S. Paulo.40 Muitos são hoje os « areópagos », e bastante diversos: os vastos campos da civilização contemporânea e da cultura, da política e da economia. Quanto mais o Ocidente se separa das suas raízes cristãs, tanto mais se torna terreno de missão, nas formas mais diversificadas de « areópagos ».

58. O futuro do mundo e da Igreja pertence às gerações jovens, que, nascidas neste século, serão maduras no próximo, o primeiro do novo milénio. Cristo acolhe os jovens, como acolhera o jovem que lhe pôs a pergunta: « Que hei-de fazer de bom para alcançar a vida eterna? » (Mt 19, 16). À admirável resposta que Jesus lhe deu, fiz referência na recente Encíclica Veritatis splendor, como já o fizera antes na Carta Apostólica aos jovens de todo o mundo em 1985. Os jovens, em qualquer situação e região da terra, não cessam de fazer perguntas a Cristo: encontram-n'O e procuram-n'O para O interrogarem de novo. Se souberem seguir o caminho que Ele indica, terão a alegria de dar o próprio contributo para a presença d'Ele no próximo século e nos sucessivos, até à conclusão dos tempos. « Jesus é o mesmo ontem, hoje e sempre ».

59. Na conclusão, revelam-se novamente oportunas as palavras da Constituição conciliar Gaudium et spes: « A Igreja acredita que Jesus Cristo, morto e ressuscitado por todos, oferece aos homens pelo seu Espírito a luz e a força para poderem corresponder à sua altíssima vocação; nem foi dado aos homens sob o céu outro nome, no qual devam ser salvos. Acredita também que a chave, o centro e o fim de toda a história humana se encontram no seu Senhor e Mestre. E afirma, além disso, que, subjacentes a todas as transformações, há muitas coisas que não mudam, cujo último fundamento é Cristo, o mesmo ontem, hoje, e para sempre. Quer, portanto, o Concílio, à luz de Cristo, imagem de Deus invisível e primogénito de toda a criação, dirigir-se a todos, para iluminar o mistério do homem e cooperar na solução das principais questões do nosso tempo ».41

Ao mesmo tempo que convido os fiéis a elevarem ao Senhor instantes preces para obter as luzes e auxílios necessários para a preparação e a celebração do Jubileu, já próximo, exorto os Venerados Irmãos no Episcopado e as comunidades eclesiais a eles confiadas a abrirem o coração às sugestões do Espírito. Este não deixará de mover os ânimos para se disporem a celebrar com renovada fé e generosa participação o grande evento jubilar.

Confio este empenho de toda a Igreja à celeste intercessão de Maria, Mãe do Redentor. Ela, a Mãe do belo amor, será para os cristãos a caminho do grande Jubileu do terceiro milénio, a Estrela que lhes guia os passos com segurança ao encontro do Senhor. A humilde Jovem de Nazaré que, dois mil anos atrás, ofereceu ao mundo inteiro o Verbo encarnado, oriente a humanidade do novo milénio para Aquele que é « a luz verdadeira, que a todo o homem ilumina » (Jo 1, 9).

Com estes sentimentos, sobre todos estendo a minha Bênção.

- Dado no Vaticano, em 10 de Novembro do ano de 1994, décimo sétimo de pontificado.