A g n u s D e i

RECONCILIATIO ET PAENITENTIA
João Paulo II
02.12.1984

VOTOS CONCLUSIVOS

35. No final deste Documento, sinto ressoar em mim e desejo repetir a todos vós a exortação que o primeiro Bispo de Roma, numa hora crítica dos primórdios da Igreja, quis endereçar «aos peregrinos da Dispersão (...), eleitos segundo a presciência de Deus Pai»: «sede todos concordes, sede compassivos, em amor de irmãos, misericordiosos, humildes». (200) O Apóstolo recomendava: «sêde todos concordes...»; mas imediatamente a seguir apontava os pecados contra a concórdia e a paz, que é preciso evitar: «Não retribuais o mal com o mal, nem a injúria com a injúria; ao contrário, respondei bendizendo, pois para isto fostes chamados, para conseguirdes a bênção». E concluía com uma palavra de encorajamento e de esperança: «quem vos poderá fazer mal, se fordes zelosos pelo bem?». (201)

Ouso ligar esta minha Exortação, numa hora não menos crítica da história, à do Príncipe dos Apóstolos, que foi o primeiro a sentar-se nesta Cátedra romana, como testemunha de Cristo e pastor da Igreja, e aqui «presidiu à caridade» diante do mundo inteiro. Também eu, em comunhão com os Bispos sucessores dos Apóstolos e confortado pela reflexão colegial que muitos deles, reunidos no Sínodo, dedicaram aos temas e problemas da reconciliação, desejei comunicar-vos, com o mesmo espírito do pescador da Galileia, o que ele dizia aos nossos irmãos na fé, longe de nós no tempo, mas bem unidos no coração: «sede todos concordes (...), não retribuais o mal com o mal (...), sede zelosos pelo bem». (202) E acrescentava: «É melhor padecer, praticando o bem, se assim agrada à vontade de Deus, do que fazendo o mal». (203)

Esta palavra de ordem está repleta de expressões que Pedro ouvira ao próprio Jesus e de conceitos, que faziam parte da sua «Boa Nova»: o mandamento novo do amor mútuo; o anelo e o empenho pela unidade; as bem-aventuranças da misericórdia e da paciência na perseguição pela justiça; o retribuir o mal com o bem; o perdão das ofensas; o amor dos inimigos. Em tais palavras e conceitos está a síntese original e transcendente da ética cristã ou, melhor e mais profundamente, da espiritualidade da Nova Aliança em Jesus Cristo.

Confio ao Pai, rico de misericórdia, confio ao Filho de Deus, feito homem como nosso Redentor e Reconciliador, confio ao Espírito Santo, fonte de unidade e de paz, este meu apelo de pai e de pastor à penitência e à reconciliação. Queira a Trindade Santíssima e adorável fazer germinar na Igreja e no mundo a pequenina semente que neste momento entrego à terra generosa de tantos corações humanos.

Para que daí provenham, num dia não muito longínquo, frutos abundantes, convido-vos a todos a dirigir-vos comigo ao Coração de Cristo, sinal eloquente da misericórdia divina, «propiciação pelos nossos pecados», «nossa paz e reconciliação», (204) para aí haurirmos a energia interior para a detestação do pecado e para a conversão a Deus, e aí encontrarmos a benignidade divina que amorosamente responde ao arrependimento humano.

Convido-vos também a dirigir-vos comigo ao Coração Imaculado de Maria, Mãe de Jesus, na qual «se operou a reconciliação de Deus com a humanidade (...), se realizou a obra da reconciliação, porque ela recebeu de Deus a plenitude da graça, em virtude do sacrifício redentor de Cristo». (205) Na verdade, Maria, em virtude da sua maternidade divina, tornou-se «a aliada de Deus» na obra da reconciliação. (206)

Nas mãos desta Mãe, cujo «fiat», na expressão de muitos autores, assinalou o início daquela «plenitude dos tempos» que viu ser realizada por Cristo a reconciliação do homem com Deus e ao seu Coração Imaculado — ao qual tenho repetidamente entregado e confiado toda a humanidade, turbada pelo pecado e dilacerada por tantas tensões e conflitos — confio agora de modo especial esta intenção: que, por sua intercessão, a mesma humanidade descubra e percorra o caminho da penitência, o único que a poderá conduzir à plena reconciliação!

A todos vós, que, com espírito de comunhão eclesial na obediência e na fé, (207) quiserdes acolher as indicações, as sugestões e as directrizes contidas neste Documento, esforçando-vos por traduzi-las em prática pastoral viva, concedo de todo o coração a minha Bênção Apostólica.

- Dado em Roma, junto de São Pedro, a 2 de Dezembro, I Domingo do Advento, do ano de 1984, sétimo do meu Pontificado.