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MARTÍRIO DE POLICARPO DE ESMIRNA
Fonte: Site "Ictis"

CAPÍTULO XV

1. Quando ele ergueu o seu Amém e terminou sua oração, os homens da pira acenderam o fogo. Grande chama brilhou e nós vimos o prodígio, nós a quem foi dado ver e que fomos preservados para anunciar estes acontecimentos a outros.

2. O fogo fez uma espécie de abóbada, como vela de navio inflada pelo vento, e envolveu como parede o corpo do mártir. Ele estava no meio, não como carne que queima, mas como pão que assa, como ouro ou prata brilhando na fornalha. Sentimos então um perfume semelhante a baforada de incenso ou outro aroma parecido.

CAPÍTULO XVI

1. Por fim, vendo que o fogo não podia consumir o seu corpo, os ímpios ordenaram ao carrasco que fosse dar o golpe de misericórdia com o punhal. Feito isso, jorrou tanto sangue que apagou o fogo. Toda a multidão admirou-se de ver tão grande diferença entre os incrédulos e os eleitos.

2. Entre estes, o admirável mártir Policarpo, que foi, em nosso dias, mestre apostólico e profético, o bispo da Igreja católica de Esmirna. Toda palavra que saiu de sua boca se cumpriu e se cumprirá.

CAPÍTULO XVII

1. Contudo, o invejoso, o perverso e o mau, o adversário da geração dos justos, vendo a grandeza do seu testemunho e de sua vida irrepreensível desde o início, vendo-o ornado com a coroa da incorruptibilidade e conquistando uma recompensa incontestável, procurou impedir-nos de levar o corpo, embora muitos de nós o desejassem fazer e possuir sua carne santa.

2. Ele sugeriu a Nicetas, pai de Herodes e irmão de Alce, que procurrase o magistrado, a fim que ele não nos entregasse o corpo. Ele disse: "Não aconteça que eles, abandonando o crucificado, passem a cultuar esse aí." Dizia essas coisas por sugestão insistente dos judeus, que nos tinham vigiado quando queríamos retirar o corpo do fogo. Ignoravam eles que não poderíamos jamais abandonar Cristo, que sofreu pela salvação de todos aqueles que são salvos no mundo, como inocente em favor dos pecadores, nem prestarmos culto a outro.

3. Nós o adoramos, porque é o Filho de Deus. Quanto aos mártires, nós os amamos justamente como discípulos e imitadores do Senhor, por causa da incomparável devoção que tinham para com o rei e mestre. Pudéssemos nós também ser seus companheiros e condiscípulos!

CAPÍTULO XVIII

1. Vendo a rixa suscitada pelos judeus, o centurião colocou o corpo no meio e o fez queimar, como era de costume.

2. Desse modo, pudemos mais tarde recolher seus ossos, mais preciosos do que pedras preciosas e mais valiosos do que o ouro, para colocá-los em lugar conveniente.

3. Quando possível, é aí que o Senhor nos permitirá reunir-nos, na alegria e contentamento, para celebrar o aniversário de seu martírio, em memória daqueles que combateram antes de nós, e para exercitar e preparar aqueles que deverão combater no futuro.

CAPÍTULO XIX

1. Essa é a história do bem-aventurado Policarpo, que foi, juntamente com os irmãos da Filadélfia, o décimo segundo a sofrer o martírio em Esmirna. Contudo, apenas dele se guarda a lembrança mais do que dos outros, a ponto de até os próprios pagãos falarem dele por toda parte. Ele foi, não apenas mestre célebre, mas também mártir eminente, cujo martírio segundo o Evangelho de Cristo todos desejam imitar.

2. Por sua perseverança, ele triunfou sobre o iníquo magistrado, e assim foi cingido com a coroa da incorruptibilidade. Juntamente com os apóstolos e todos os justos, na alegria, ele glorifica a Deus, Pai todo-poderoso, e bendiz nosso Senhor Jesus Cristo, o salvador de nossas almas, guia de nossos corpos, e pastor da Igreja católica no mundo inteiro.

CAPÍTULO XX

1. Havíeis pedido para ser informados com mais pormenores sobre esses acontecimentos. Por enquanto vos demos uma narração resumida por intermédio do nosso irmào Marcião. Quando tomardes conhecimento desta carta, transmiti-a aos irmão que estão mais longe, para que também eles glorifiquem o Senhor, que fez sua escolha entre seus servidores.

2. Àquele que, pela sua graça e pelo seu dom, nos pode introduzir no seu reino eterno, por seu Filho único Jesus Cristo, a ele a glória, a honra, o poder e a grandeza pelos séculos.

Saudai todos os santos. Aqueles que estão conosco vos saúdam, e também Evaristo, que escreveu esta carta, com toda a sua família.

CAPÍTULO XXI

1. O bem-aventurado Policarpo deu testemunho no início do mês Xântico, no décimo segundo dia, o sétimo dia antes das calendas de março, dia do grande sábado, na oitava hora. Ele fora preso por Herodes, sob o pontificado de Filipe de Trália e do proconsulado de Estácio Quadrato, mas sob o reino eterno de nosso Senhor Jesus Cristo, a quem seja dada a glória, a honra, a grandeza, o trono eterno de geração em geração Amém.

CAPÍTULO XXII (Apêndice)

1. Nós vos desejamos boa saúde. Irmãos, andai segundo o Evangelho, na palavra de Jesus Cristo. Com ele, glória a Deus Pai e ao Espírito Santo, para a salvação dso santos eleitos. Foi assim que o bem-aventurado Policarpo testemunhou. Possamos nós caminhar em suas pegadas e sermos encontrados com ele no Reino de Deus.

2. Gaio transcreveu estas coisas de Ireneu, discípulo de Policarpo; ele viveu com Ireneu. Eu, Sócrates, as copiei em Corinto, da cópia de Gaio. A graça esteja com todos.

3. Por minha vez, eu, Piônio, copiei do exemplar acima, que procurei, depois que o bem-aventurado Policarpo o mostrou a mim em revelação, como contarei em seguida. Reuni os fragmentos quase destruídos pelo tempo. Que o Senhor Jesus Cristo me reúna também com seus eleitos no Reino do céu. A ele seja dada a glória com o Pai e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.

Apêndice do manuscrito de Moscou:

1. Gaio copiou essas coisas dos escritos de Ireneu; ele viveu com Ireneu, que foi discípulo de Policarpo.

2. Esse Ireneu, que esteve em Roma na época do martírio do bispo Policarpo, instruiu muita gente. Temos dele numerosos escritos muito belos e ortodoxos. Ele mencionou Policarpo, dizendo que tinha sido discípulo dele. Refutou vigorosamente todas as heresias e nos transmitiu a regra eclesiástica e católica, tal como havia recebido do santo.

3. Ele diz também o seguinte: Marcião, do qual provém aqueles que se chamam marcionitas, certo dia, indo ao encontro de são Policarpo, lhe diz: "Reconhece-nos, Policarpo!" Este respondeu a Marcião: "Eu reconheço, reconheço o primogênito de satanás."

4. Lê-se também o seguinte nos escritos de Ireneu: No dia e na hora em que Policarpo sofria o martírio em Esmirna, Ireneu, encontrando-se em Roma, ouviu uma voz parecida com trombeta que dizia: "Policarpo foi martirizado."

5. Como foi dito, é dos escritos de Ireneu que Gaio copiou essas coisas. Em Corinto, Isócrates transcreveu da cópia de Gaio. E eu, Piônio, copiei do exemplar de Isócrates, que procurei, depois de uma revelação de sao Policarpo. Reuni os fragmentos quase destruídos pelo tempo. Que o Senhor Jesus Cristo me reúna também com seus eleitos na glória do céu. A ele seja dada a glória com o Pai e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.