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Constituição Dogmática
LUMEN GENTIUM
do Concílio Vaticano II
sobre a Igreja ("De Ecclesia")

FÓRMULA DA PROMULGAÇÃO

Todas e cada uma das coisas que nesta Constituição dogmática se estabelecem, pareceram bem aos padres do Concílio. E nós - pelo poder apostólico que nos foi confiado por Cristo - juntamente com os veneráveis padres, no Espírito Santo as aprovamos, decretamos e estabelecemos, e tudo quanto assim conciliarmente foi estatuído, mandamos que, para glória de Deus, seja promulgado.

- Roma, junto de São Pedro, aos 21 de novembro de 1964.

Eu, Paulo, bispo da Igreja Católica
(Seguem-se as assinaturas dos padres conciliares)


NOTIFICAÇÕES DAS ATAS DO CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II
Feitas pelo Exmo. Secretário Geral na 123 a Congregação Geral (16 de novembro de 1964)

  • Foi perguntado qual deva ser a qualificação teológica da doutrina exposta no esquema De Ecclesia, sujeito à votação.
    A Comissão Doutrinal, ao examinar os Modos relativos ao capítulo III do esquema De Ecclesia, respondeu com as seguintes palavras:

    "Como é evidente, um texto conciliar deve ser interpretado sempre de harmonia com as regras gerais que todos conhecem". E, a propósito, a Comissão Doutrinal manda para a sua Declaração de 6 de março de 1964, cujo texto passamos a transcrever: "Atendendo à praxe conciliar e tendo em conta a finalidade pastoral do Concílio Vaticano II, este Santo Concílio só entende pronunciar, em matéria de fé e costumes, aquelas definições que abertamente declarar como tais. Tudo o mais que o Concílio propõe, na qualidade de doutrina do Magistério Supremo da Igreja, devem todos e cada um dos fiéis acatá-lo e segui-lo, conforme a intenção do mesmo Concílio, que transparece quer da matéria versada, quer do modo de expressão, segundo as normas da interpretação teológica".

  • A autoridade superior comunica aos padres uma nota explicativa prévia, relativa aos Modos que foram apresentados sobre o capitulo III do Esquema De Ecclesia. A doutrina exposta neste capítulo III deve ser explicada e compreendida segundo o espírito e o sentido desta nota.

    Nota explicativa prévia

    "A Comissão decidiu fazer preceder o exame dos Modos das seguintes observações gerais:

    1. Colégio não se entende em sentido estritamente jurídico, isto é, como um grupo de iguais que delegassem o seu poder no presidente, mas como grupo estável, cuja estrutura e autoridade devem deduzir-se da revelação. Por isso é que na resposta ao Modo 12, se diz expressamente, a respeito dos doze, que o Senhor os constituiu à maneira de colégio ou "grupo estável" (cf. também o Modo 53, c). - Pela mesma razão, ao falar-se de colégio episcopal, se usam indistintamente os termos ordem e corpo. O paralelismo entre são Pedro e os demais apóstolos, por um lado, e o Sumo Pontífice e os bispos, por outro, não implica a transmissão dos poderes extraordinários dos apóstolos aos seus sucessores, nem como é evidente, a igualdade entre a cabeça e os membros do colégio; mas implica tão só uma proporcionalidade entre a primeira relação (Pedro-apóstolos) e a segunda (papa-bispos). Por isso, a Comissão resolveu escrever no n. 22: não da mesma maneira, mas de maneira semelhante (cf. Modo 57).

    2. Fica alguém constituído membro do colégio em virtude da consagração episcopal e da comunhão hierárquica com a cabeça e com os membros do colégio (cf. n. 22 § 1, ao fim).

    Na consagração é conferida uma participação ontológica nos ofícios sagrados, como indubitavelmente consta da tradição litúrgica. Emprega-se propositadamente o termo ofício e não poderes, porque este último termo poderia entender-se dum poder apto a exercer-se. Mas, para que haja um poder assim apto a exercer-se, é indispensável a determinação canônica ou jurídica da parte da autoridade hierárquica. Determinação de poder que pode consistir na concessão dum cargo particular ou na designação dos súditos, e é dada segundo as normas aprovadas pela autoridade suprema. Uma tal norma ulterior é requerida pela natureza das coisas, pois se trata de ofícios que devem ser exercidos por vários sujeitos, que por vontade de Cristo cooperam hierarquicamente. É evidente que esta "comunhão" teve aplicação na vida da Igreja, conforme as circunstâncias dos tempos, antes de ser codificada no direito.

    Por isso se diz expressamente que se requer a comunhão hierárquica com a cabeça e com os membros da Igreja. Comunhão é uma noção que foi tida em grande honra na antiga Igreja (e ainda hoje, sobretudo no oriente). Não é entendida como um sentimento vago, mas como realidade orgânica que exige uma forma jurídica e, ao mesmo tempo, é animada pela caridade. Daí que a Comissão tenha decidido, quase por unanimidade, escrever "em comunhão hierárquica", cf. Modo 40 e também o que se diz a respeito da missão canônica, n. 24.

    Os documentos dos sumos pontífices recentes, relativos à jurisdição dos bispos, devem entender-se desta necessária determinação de poderes.

    3. O colégio, que não existe sem a sua cabeça, diz-se "que é também sujeito do poder supremo e pleno sobre toda a Igreja". E isto tem necessariamente de aceitar-se para que se não levante problema sobre a plenitude do poder do Romano Pontífice. Colégio entende-se sempre e necessariamente como incluindo a sua cabeça, que, dentro do colégio, mantém íntegra a sua função de vigário de Cristo e de pastor da Igreja universal. Por outras palavras, a distinção não se faz entre o Pontífice Romano e os bispos tomados coletivamente, mas entre o Romano Pontífice sozinho e o Romano Pontífice junto com os bispos. E porque o Sumo Pontífice é a cabeça do colégio, só ele pode pôr determinados atos, que não são, de modo nenhum, da competência dos bispos, v. g. convocar e dirigir o colégio, aprovar normas para a sua atividade, etc., cf. Modo 81. Ao juízo do Sumo Pontífice, a quem foi entregue o cuidado de toda a grei de Cristo, compete determinar, de harmonia com as necessidades da Igreja que variam com os tempos, como convém que esta missão se exerça, quer de maneira pessoal, quer de maneira colegial. O Romano Pontífice, quando se trata de ordenar, promover e aprovar o exercício da colegialidade em vista do bem da Igreja, procede segundo a sua própria discrição.

    4. O Sumo Pontífice, como pastor supremo da Igreja, pode exercer o seu poder em qualquer tempo, à sua vontade, como é exigido pelo seu cargo. Ao contrário, o colégio, que existe sempre, nem por isso age permanentemente com ação estritamente colegial, como atesta aliás a tradição da Igreja. Por outras palavras, não está sempre "em pleno exercício"; mas a intervalos; é só com o consentimento da cabeça que ele age de modo estritamente colegial. Diz-se "com o consentimento da cabeça"', não se vá pensar numa dependência a respeito de alguém estranho ao colégio; o termo "com o consentimento" insinua, pelo contrário, comunhão entre a cabeça e os membros, e implica a necessidade dum ato que propriamente compete à cabeça. Isto é afirmado explicitamente no n. 22 § 2, e aparece desenvolvido no fim do mesmo parágrafo. A fórmula negativa "só" compreende todos os casos: é evidente portanto que as normas aprovadas pela autoridade suprema devem ser observadas sempre (cf. Modo 84).

    De tudo isto ressalta que se trata duma união estreita dos bispos com a sua cabeça, e nunca duma ação dos bispos independentemente do Papa. Neste caso, faltando a ação da cabeça, os bispos não podem agir como colégio, o que resulta da própria noção de "colégio". Esta comunhão hierárquica de todos os bispos com o Sumo Pontífice é afirmada constantemente pela tradição.

    N. B. - Sem a comunhão hierárquica não pode exercer-se a função sacramental-ontológica, que deve ser distinguida do aspecto canônico-jurídico. No entanto, a Comissão entende não dever entrar em questões de liceidade e validade; deixa-as à discussão dos teólogos, em especial no que diz respeito ao poder que, de fato, é exercido pelos orientais separados e em cuja explicação as opiniões divergem."

    † PÉRICLES FELICI
    Arcebispo tit. de Samosata
    Secretário Geral do Sacrossanto Concílio Ecumênico Vaticano II