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Autor: Rochus Zuurmond Editora: Loyola Páginas: 128 Formato: 24 x 17 cm Preço: * * Apresentação | O Autor | Conteúdo | Amostra | Maiores Informações | Pedidos via Internet |
» APRESENTAÇÃO
Na atual proliferação de estudos sobre o "Jesus histórico", é tanta a divergência e a projeção
da imaginação dos pesquisadores, que a "voz do bom senso" do autor chega como uma brisa suave.
Depois de dois séculos e três "ondas" de discussões em torno do assunto, a "reconstituição" do
Jesus histórico continua tão subjetiva como antes, se não impossível, pois Jesus nunca foi
testemunhado fora do contexto da fé cristã (e daqueles que a combatiam). E é impossível "crer
em Jesus" sem ler os textos iniciais como testemunhos da fé. Com esta consciência, o autor
apresenta uma sóbria, mas relevante síntese das questões em pauta e explicita o que o historiador
e o teólogo podem dizer a respeito.
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1) EVANGELHOS APÓCRIFOS
O termo "apócrifos" geralmente é usado para indicar os apócrifos veterotestamentários,
mas há também apócrifos do Novo Testamento, isto é, livros que
em determinadas épocas e regiões, em determinadas comunidades cristãs, foram
mais ou menos aceitos como Sagrada Escritura, mas não foram colocados no
cânon pela Igreja universal. Geralmente trata-se de escritos demonstravelmente
tardios (século III e depois), evidentemente imitações e/ou pretensos suplementos
dos escritos canônicos do Novo Testamento. A essa categoria pertencem os evangelhos
apócrifos, alguns dos quais continuaram conhecidos em toda a tradição
cristã, e até o dia de hoje podem ser adquiridos em traduções modernas.
O evangelho mais importante dessa categoria é o Proto-evangelho de Tiago.
Admite-se geralmente que foi escrito no século II. Descreve o nascimento e a
infância de Jesus, mas começa com vários detalhes da juventude da Virgem
Maria. É tipicamente uma tentativa de satisfazer à curiosidade popular em torno
de coisas não mencionadas nos evangelhos canônicos. A teologia desse "evangelho"
é a de um docetismo popular: Jesus tem um Corpo não sujeito às leis do
espaço e do tempo. O escrito não tem valor como fonte histórica sobre Jesus.
Os apócrifos do Novo Testamento têm valor para nosso conhecimento da
piedade popular no século II e depois. Alguns deles tiveram no passado uma
influência pelo menos tão grande quanto a dos evangelhos canônicos. O evangelho
do Pseudo-Mateus, por exemplo, foi muito conhecido na Idade Média.
É uma compilação (do início da Idade Média) de textos mais antigos, entre os
quais o Proto-evangelho de Tiago. Teoricamente, devia ser possível encontrar
nesse tipo de escritos tardios um caminho para chegar às fontes mais antigas.
Mas há tantas incertezas que na prática tal programa se mostra inexeqüível.
Uma segunda categoria é formada por alguns evangelhos sobre cuja existência
informa a literatura cristã antiga, mas dos quais nada ou quase nada foi conservado.
Dispomos apenas de alguns textos citados por Santos Padres ou teólogos
da Igreja antiga. Devem ser mencionados: o Evangelho dos Egípcios, o
Evangelho dos Hebreus e o Evangelho dos Ebionitas. Sem dúvida trata-se de
textos bastante antigos. Clemente de Alexandria (falecido por volta de 215)
cita o Evangelho dos Egípcios e o Evangelho dos Hebreus. Orígenes (falecido
em 254) conheceu possivelmente o Evangelho dos Ebionitas.
Qual foi o conteúdo desses textos e como devemos avaliá-los? Quem
estiver esperando novidades sensacionais ficará decepcionado. Grande parte
deles baseia-se evidentemente nos evangelhos canônicos. Acrescentam-se
pormenores; o texto é tornado mais impressionante: indício indubitável de
adaptação. Às vezes o teor de uma palavra de Jesus é ligeiramente modificado.
Uma característica geral que pode ser constatada é a tendência encratista.
Precisa-se de muita imaginação para encontrar nessas palavras uma tradição
autêntica sobre Jesus.
Uma terceira categoria de evangelhos apócrifos consta de textos em papiros
e pergaminhos descobertos neste último século. Fazendo abstração, por ora, da
biblioteca copta de Nag Hammadi (cf. infra), trata-se de um pequeno grupo de
escritos dos quais possuímos também apenas alguns fragmentos. Os mais conhecidos
são os textos evangélicos do Papiro 2 de Egerton e o Evangelho de Pedro.
Ambos os textos foram escritos provavelmente no século II. Egerton 2 conta
quatro cenas, três das quais, as primeiras, têm paralelos nos evangelhos
canônicos; a quarta está tão danificada que é difícil formar sobre ela uma
opinião sensata. Quanto a esses papiros, a maioria dos especialistas julga tratar-se
de uma compilação; alguns, porém, defendem ardentemente a tese de
que são independentes dos evangelhos canônicos. Estou inclinado a concordar
com a maioria, acrescentando que esses fragmentos, ainda que fossem independentes,
contribuem pouco ou nada para nosso conhecimento a respeito do
Jesus histórico. O Evangelho de Pedro (o fragmento que se conservou) descreve
o processo contra Jesus, sua execução e sua ressurreição. Característica é a
tendência antijudaica ainda mais forte que nos evangelhos canônicos. Teologicamente,
ele está mais próximo de João; em contraste com João, porém, a
cristologia é a do docetismo: aquele que sofre e morre é apenas uma aparição
do verdadeiro Jesus, que é divino e por isso não pode sofrer e morrer. As
opiniões sobre esse texto são as mesmas que sobre o papiro de Egerton. Para
mim, é um rewritten gospel, uma adaptação baseada nos evangelhos canônicos.
Finalmente. temos a grande biblioteca copta, encontrida, pouco depois
da Segunda Guerra Mundial, perto de Nag Hammadi, no Egito superior.
Além de um texto completo do Evangelho de Tomé, esta coleção contém
dois outros evangelhos apócrifos: o Evangelho de Filipe e o Evangelho da
Verdade. Esse último não é um evangelho no sentido costumeiro da palavra;
é antes uma meditação, uma espécie de sermão sobre a redenção pelo conhecimento
(gnosis) de Deus. É atribuído ao gnóstico Valentino, que viveu em
meados do século II; por conseguinte, não ajuda em nada a pesquisa sobre
o Jesus histórico. O Evangelho de Filipe foi escrito antes de 350; é evidentemente
uma compilação de materiais mais antigos. Como sempre, coloca-se
ai a questão se seria possível destacar do texto atual as fontes utilizadas.
Também no caso do Evangelho de Filipe isso parece muito problemático. O
texto causou certo sensacionalisnio porque sugere uma relação amorosa entre
Jesus e Maria Madalena. Coisa semelhante consta no Evangelho de Maria
Madalena, não encontrado em Nag Hammadi, mas proveniente de um ambiente
semelhante. Alegando esses apócrifos, pessoas não-especializadas no assunto
proferiram a suspeita de que a Igreja teria escamoteado valiosos documentos
antigos. Sem dúvida, a Igreja estabeleceu seu cânon com base em determinadas
suposições dogmáticas, freqüentemente em consciente polêmica contra
grupos que invocavam a autoridade de escritos cuja autenticidade reivindicavam.
Eu seu julgamento, o historiador terá de ponderar também esse fato.
Não é impossível que em semelhantes grupos tradições originais tenham sido
transmitidas, embora seja praticamente certo que elas então passaram por
adaptações mais ou menos profundas. Porém, ao ler esses escritos, é difícil
não chegar à conclusão de que a Igreja, com relação a eles, traçou os limites
de seu cânon com razoável objetividade e com certeira avaliação da qualidade.
Divergem muito entre si as opiniões acerca do valor desses escritos como
fontes para a biografia de Jesus. O certo é que nenhum desses evangelhos
apócrifos vem diretamente de testemunhas oculares; mas isso vale também
para os evangelhos canônicos. Sobre fragmentos pequeninos não se pode
dizer muita coisa. Textos de maior envergadura sempre têm uma motivação
teológica, não biográfica ou histórica no sentido moderno. Mas também isso
vale igualmente para os evangelhos canônicos. O fato de muitos desses escritos
apresentarem traços ligeiramente "gnósticos" é para alguns motivo de
desconfiança de seu valor como testemunhas, ao passo que outros lhes dão
tanto mais crédito, já que para eles o próprio Jesus foi um mestre gnosticizante.
Onde, então, estão as diferenças? Principalmente nas datações. Os evangelhos
canônicos foram escritos antes do fim do século I. Os textos evangélicos
apócrifos, porém, na forma em que os possuimos agora, são todos posteriores.
Se é que contém material historicamente confiável, teremos de investigar sua
origem. Em si, isso não tem nada de extraordinário. Esse tipo de literatura
costuma utilizar fontes: raramente uma narrativa sobre Jesus ou uma palavra
atribuida teria nascido inteiramente da piedosa fantasia de um autor. Mas o que
a fantasia piedosa fez com as fontes não pode ser mais apurado. Aí inevitavelmente
a subjetividade do pesquisador vai desempenhar importante papel.
2. PALAVRAS ATRIBUÍDAS A JESUS POR COPIADORES DE MANUSCRITOS
São os chamados agrapha, declarações de Jesus ou sobre ele que se
encontram em um ou em alguns manuscritos, mas faltam naqueles mais
confiáveis, e por isso não constam das edições críticas dos textos dos evangelhos.
Podem ser encontradas, naturalmente, no aparato crítico. Esses textos
provam que circulavam diversas tradições sobre Jesus que não foram integradas
aos quatro evangelhos. Se são historicamente confiáveis, é outra
questão.
O exemplo mais conhecido é provavelmente o texto que se encontra no
códex Bezae depois de Lc 6,5: "Naquele dia, (Jesus), vendo alguém trabalhar
no sábado, disse-lhe: 'Homem, bem-aventurado és tu se sabes o que estás
fazendo; mas, se não o sabes, és amaldiçoado e um transgressor da Lei'".
Também do "final não-autêntico" de Marcos existem algumas variantes nos
manuscritos.
3. AUTORES CRISTÃOS ANTIGOS
Também aí encontramos agrapha a provar que, além das canônicas, circulavam
ainda outras tradições sobre Jesus. Sabemo-lo igualmente por uma
observação de Papias, transmitida por Eusébio: "Quando me encontrava com
alguém que fora discípulo dos anciãos, perguntava sempre pelas declarações
("palavras") dos anciãos: o que dizia André ou Pedro ou Filipe ou Tomé ou
Tiago ou João ou Mateus ou um dos demais discípulos do Senhor... Pois partia
do princípio de que as coisas escritas nos livros não são tão úteis quanto aquilo
que eu podia ouvir de uma voz viva que continuava presente".
Papias é uma das testemunhas mais antigas de palavras canônicas
de Jesus, mas até no século IV encontramos semelhantes agrapha. Como em
outros casos, reconhecer autenticidade é em grande parte questão de gosto.
Conforme já observamos, não devemos esquecer nunca que personagens
famosos como Jesus muitas vezes são citados como autores de sentenças na
realidade formuladas por outros, menos conhecidos.
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Fontes cristãs não-canônicas
Texto retirado das páginas 95 a 99. Notas omitidas.
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