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Autor: Medard Kehl Editora: Loyola Páginas: 416 Formato: 23 x 16 cm Preço: * * * * Apresentação | Conteúdo | Amostra | Maiores Informações | Pedidos via Internet |
» APRESENTAÇÃO
Uma eclesiologia que não quer legitimar todas as estruturas e medidas ministeriais da Igreja e
enfrenta criticamente os conflitos, visando servir à renovação da Igreja, pode receber aplausos
fáceis, como por exemplo, dos meios da burguesia liberal. Aos olhos deles, a Igreja Católica
representa uma relíquia de épocas pré-modernas, fadada à ruína. Esses meios se aproveitam com
ódio de todo conflito intra-eclesial, de toda crítica ao ofício eclesial, difundindo-os com
prazer. Todavia, prestaríamos péssimo serviço à Igreja se, em vista disso, silenciássemos toda
crítica pública dentro dela. Isso aproximaria a Igreja dos sistemas mortos e totalitários.
A reconciliação não se baseia em abafar problemas, mas em elaborá-los comunicativamente ("ecclesia
semper reformanda"), para que se chegue a uma autocompreensão da Igreja como "communio".
» CONTEÚDO
» AMOSTRA
Ainda na primeira metade do nosso século, quando o movimento da
juventude católica levou a Igreja a ser experienciada de uma forma inteiramente
nova como comunidade dos fiéis, a experiência da santidade e da
"glória" da Igreja esteve, para muitos cristãos, no primeiro plano de sua
relação com ela. I.F. Görres fala-lhes de coração ao escrever sobre aquele
tempo: "Pudemos, por uma hora, olhar para a Igreja em sua glória... as
sombras e as manchas eram, com efeito, conhecidas por todos com tristeza
e aborrecimento, mas não valia mais a pena descrevê-las; a glória, porém,
foi surpreendente e atraente, e não se podia enaltecê-la suficientemente".
Manifestamente não causava muita dificuldade pôr em relação as palavras dd
Efésios (Ef 5,25s) não só com a Igreja consumada escatologicamente mas
tamhém com a Igreja experimentada no presente: "Cristo amou a Igreja e se
entregou por ela, para torná-la pura na água e pela palavra. Ele quer assim
fazer aparecer diante de si a Igreja gloriosa, sem manchas, sem rugas e sem
outros defeitos; ela deve ser santa e imaculada (sancta et immaculata)".
Em conexão com a mudança social geral das relaçôes de muitos fiéis
com a Igreja em meados da década de 60, que coincidiu com a época da
primeira fase da recepção do Vaticano II e de sua visão renovada da Igreja
como "povo peregrinante de Deus", entrou para o segundo plano a infrangível
alegria pela Igreja "santa". Em vez disso, com a nova percepçao da sacramentalidade
da Igreja, ou seja, do significado teológico do lado humano-simbólico
da Igreja, emergiu tamhém uma consciência muito mais forte da pecaminosidade
da Igreja. Sem negar o perigo, ligado a isso e muito freqüente, de
uma febre exagerada de crítica destituída de qualquer compreensão realista,
vamos nos prender a justificacao fundamental dessa maneira de ver. A Igreja
é - em perspectiva teológica - não apenas a Igreja santificada por Jesus
Cristo, mas tamhém a Igreja que se tornou pecadora por nós pecadores.
O Concílio Vaticano II expressa este estado de coisas com cuidado:
"Mas enquanto Cristo, 'santo, inocente, imaculado'(Hb 7,26), não conheceu
o pecado (cf. 2Cor 5,21), mas veio para expiar apenas o pecado do povo (cf.
Hb 2,17), a Igreja, reunindo em seu próprio seio os pecadores, ao mesmo
tempo santa e sempre na necessidade de purificar-se, busca sem cessar a
penitência e a renovação" (LG 8). Os "pecadores do povo" tornam o povo
de Deus, a Igreja, um povo pecador, sempre necessitado de contínua
penitência e renovação.
1. OS PECADOS DOS INDIVIDUOS E A IGREJA PECADORA
Para entender em que sentido podemos falar de uma Igreja pecadora,
recorramos à nossa imagem sistemática de Igreja da primeira parte [desta obra], ou seja,
ao conceito teológico de Igreja como "communio" sanctorum (A V 2) e a sua
tradução sociofilosófica (B III 2) como "espaço de vida comunicativo da fé".
Nas duas vezes chegamos ao resultado de que a Igreja deve-se entender ao
mesmo tempo como Igreja para os indivíduos e Igreja constituída dos fiéis
individuais; ou seja, que ela é a Igreja prévia aos indivíduos como dom de
Cristo e do seu Espírito, "Igreja que os santifica" na palavra e no sacramento,
e também "Igreja dos santos" que se edifica a partir dos indivíduos assim
santificados. Enquanto "nós" dos fiéis, a Igreja representa, portanto, também
a forma de expressão comum, marcada pelos fiéis individuais, de sua fé
pessoal.
Visto, porém, que os fiéis (com a exceção de Cristo e de Maria, a mãe
de Deus) são ao mesmo tempo pecadores, ou seja, pessoas que não se
entregam inteiramente ao amor de Deus manifestado em Cristo e à sua
vontade salvífica, apesar do sim fundamental pronunciado no batismo e na
fé, fecham-se parcialmente a ele e não se deixam conduzir ao pleno desdobramento
na vida de fé, esperança e amor, essa fé deficiente dos pecadores
também marca a configuração comum de sua fé, ou seja, a Igreja; ela abaixa,
no todo, o "nível" de sua santidade. Donde o pecado não é apenas uma
realidade na Igreja na medida em que os indivíduos são pecadores, mas
também uma realidade da Igreja mesma na medida em que, como comunidade
dos pecadores, ela não existe incólume acima das pessoas concretas,
mas é desfigurada por seus pecados. Por isso muitos padres da Igreja puderam
chamar com razão a Igreja de "pecadora".
O pecado do indivíduo e a pecaminosidade da Igreja têm obviamente
estrutura formal diversa: o indivíduo é o sujeito pessoal, a origem do pecado;
este nasce de sua liberdade e de seu agir responsável. A Igreja, por sua vez,
é forma social objetivada desta fé prejudicada pelos pecados dos indivíduos;
Aparece nela o "resultado" social do pecado dos sujeitos individuais.
Ora, esse lado da Igreja relativo ao sujeito (Igreja constituída dos pecadores
individuais) não se pode separar (mas apenas distinguir!) do seu outro
lado; ou seja, que ela - a partir de Cristo, sua origem pessoal, e de Maria,
sua imagem original personificada - constitui o dom prévio santo e "objetivo"
da salvação em prol dos indivíduos. Em unidade "sem mistura e inseparável",
isto é, sacramental (ver anteriormente), a Igreja concretamente existente
sempre representa ao mesmo tempo os dois aspectos. Por isso, o seu
tornar-se pecadora com base nos pecados dos individuos afeta também sua
dimensão como fundamento prévio de possibilitação da fé; ou seja, mesmo
seus dados prévios mais santos, a palavra e o sacramento, não pairam sem
risco acima dos homens pecadores, mas se vêem também marcados por estes
(quer destinatários quer administradores). Neste sentido, também o espaço
de vida pré-dado (o "onde") da fé pode por sua vez tornar-se para os indivíduos
base para o pecado pessoal, ou seja, na forma de uma estrutura
possibilitadora, que provoca ou fortalece o pecado. Se a Igreja, enquanto o "nós"
dos fiéis, não pode existir separada de maneira hipostasiada dos fiéis individuais,
resulta inevitavelmente essa influência recíproca entre o dado prévio
"objetivo" e a apropriação "subjetiva" da fé comum; e, com efeito, não só no
campo da santidade (ver anteriormente), mas também no campo do pecado.
Por exemplo, essa "pecaminosidade estrutural" da Igreja manifesta-se
quando uma mediocridade e saciedade geral atenua quase "a priori" para
número cada vez maior de fiéis todo apelo radical do Evangelho que visa
penetrar nas raízes da existência de fé; ou quando uma Igreja ou uma
comunidade se fecha num "meio" intra-eclesial e aí se dissolve numa auto-satisfação
institucional de tal forma que não está mais aberta realmente para
as necessidades dos homens dentro e fora da Igreja; ou quando a pregação da
palavra se degenera em doutrinação inimiga da liberdade, a administração dos
sacramentos (por exemplo, do sacramento da penitência) se torna exercício
subliminar do poder sobre as consciências, e a diaconia se torna cuidado rotineiro
etc. Em toda parte aí a Igreja se torna "Igreja pecadora", que por sua vez pode
ser para os indivíduos ocasião e impulso para o pccado. Por isso ela
própria como Igreja (e não só cada indivíduo nela) deve orar diariamcnte por
perdão e renovação (como, por exemplo, no pai-nosso, na conflssão das culpas
na eucaristia, em diversas orações da santa missa, nas preces comunitárias).
2. A SANTIDADE INDESTRUTÍVEL DA IGREJA
Quando falamos de Igreja santa e pecadora, esse "e" não significa absolutamente
uma adição de duas propriedades contraditórias da Igreja que estejam,
no entanto, no mesmo nível "ontológico". Ao contrário, onde a Igreja, nos fiéis
individuais e em sua constituição social, oferece espaço à ação santificante do
Espírito Santo, surgem sua natureza verdadeira, sua vocação e sua missão dadas
por Deus como lgreja "santa". Onde, pelo contráio, ela se fecha a esse Espírito
Santo, tornando-se assim pecadora, nela se manifesta "somente" a contradição
(que permanece, com eleito, intra-historicamente, mas desarmada "em princípio"
por Cristo e por isso no fundo impotente) dos homens (como indivíduos
e como comunidade) contra sua santidade operada pelo Espírito. Por isso a
Igreja não é absolutamente - como frisa com rãzào K. Rahner - o "puro
paradoxo de uma unidade de pecado constatável e graça oculta". Sua identidade
teológica própria está antes no fato de que ela representa a resposta visível,
configurada pelo Espírito Santo conforme Filho Jesus Cristo, à autocomunicação
definitiva de Deus na história de que ela em todos os seus desempenhos
fundamentais participa - acolhendo, respondendo e seguindo - do
amor incondicionalmente salvífico de Jesus Cristo para com o Pai e para com
os homens, e, por isso, é mantida por ele em sua santidade de maneira indestrutível.
Ainda que a contradição pecaminosa da Igreja possa às vezes desfigurar
esta sua identidade (mesmo para muitos fiéis) até o ponto de se tornar irreconhecível,
a fé mantém a confiança de que o pecado (tanto intra-historicamente
como no fim dos tempos) jamais ganhará supremacia sohre a obra do Espírito
Santo na Igreja e não poderá destruir a comunidade santa de Deus.
Essa última certeza salvífica refere-se, porém, apenas à lgreja como
todo, e não a cada indivíduo ou a grupos individuais nela. Quanto aos
indivíduos, permanece, a partir de nós, aberta a questão da salvação ou não -
salvação definitiva, uma vez que seu pecado pode separá-los delinitivamente
de Deus -, o que todavia não esperamos para ninguém. Que isso
não vale de maneira igual na Igreja fica claro ainda uma vez mais pelo fato
de ela ser mais que a soma de seus memhros pecadores, a saber, o povo de
Deus renovado irrevogavelmente por Jesus, o corpo de Cristo configurado
indissoluvelmente com ele, o sacramento da "communio" de Deus unido pelo
Espírito Santo inseparavelmente. Se a questão da salvação ficasse para a Igreja
como um todo tão aberta quanto para os indivíduos, que se inserem nessa
Igreja com intensidade muito diversa ou também podem abandoná-la inteiramente,
eliminar-se-ia o especílico da aliança nova e definitiva que Deus fez
com o seu povo (e por meio dele com todos os homens). Pois neste caso
mesmo essa aliança poderia ser rompida e destruída pelo pecado do povo
de Deus. Isso, porém significaria que o mal venceria, de modo retroativo,
o Cristo crucificado e ressuscitado e o Reino de Deus que nele irrompeu
definitivamcnte. Toda a mensagem do Novo Testamento acerca da salvação
escatológica de Deus, isto é, manifestada definitivamente, perderia com isso
o seu caráter de verdade e credibilidade. Mas porque a força santificante de
Deus, ou seja, o seu Espírito Santo permanece presente na Igreja (cf. Jo
l4,16-18; l6,7-l5; Mt 16,l8; 28,2O; Rm 8,34-39 etc.), podemos ter a confiança
de que o pecado do povo de Deus não pode mais invalidar a vontade
salvífica incondicional de Deus.
Essa confiança acha seus pontos de apoio confiáveis primariamente nos
santos, que tornam indubitavelmente transparente o amor de Deus. Isso vale
sobretudo para Maria, o "cerne santo" da Igreja (H. U. v. Balthasar). Nela,
a serva do Senbor sem pecado e incondicionalmente fiel, a fé vê o símbolo
real original da Igreja indestrutivelmente santa. Essa santidade da Igreja,
fundamentada pessoalmente em Maria e em toda a "communio sactorum", age
também na estrutura sacramental-objetiva da Igreja: tanto a pregação da
palavra de Deus (regulada eclesialmente) como a administração dos sacrimentos
valem para a fé como sinal insofismável de que o Espírito Santo
conserva a Igreja definitivamente na verdade da fé e na santidade do amor.
Pois enquanto essas realizações são ainda reconhecíveis de alguma maneira
como sinal de Cristo e de sua Igreja, e assim são aceitos pelos homens, eles
conservam sua força mediadora de salvação, que também não pode ser
destruída pela pecaminosidade, por maior que seja do pregador e do ouvinte,
do administrador e do destinatário.
Nesta simultaneidade de santidade e pecaminosidade, simultaneidade
em última análise de peso desigual, na Igreja, manifesta-se a participação
especial da Igreja na cruz e ressurreição de Jesus. Assim como no Senhor
crucificado se faz visível a força do pecado com suas consequências sofrimento
e morte), mas que também a um só tempo foi suportada e vencida,
assim também a Igreja surgida da cruz (ver acima) é chamada a experimentar
em si mesma a contradição do pecado, precisamente do seu próprio pecado,
contra a vontade salvífica de Deus, a suportá-la no sofrimento e confiar-se
humildemente à misericórdia indulgente e salvadora de Deus. A pecaminosidade
da Igreja é uma das marcas do povo peregrino de Deus, que só pode carregar
o "tesouro" na santidade em meio à história em "vasos de barro".
De mais a mais, a consciência vigilante de ser a Igreja do Crucificado
por causa do pecado e como tal Ressuscitado por Deus constitui um eficaz
corretivo contra uma compreensão triunfalista da Igreja, que com demasiada
certeza de salvação gostaria de esquecer o caráter da Igreja de ser sinal
sacramental identificando-a apressadamente com a realidade salvífica que
nela aparece. Escrcve com razão Hans Urs von Balthasar:
3. REPRESENTAÇÃO: SOLIDARIEDADE NA SALVAÇÃO
Podemos considerar neste contexto um pouco mais aquela dimensão
da Igreja que constitui com certeza o seu mistério mais profundo e
consolador como "communio sanctorum", a saber, o fato de os
fiéis poderem existir vicariamente pelos outros. Apresentemos antes um texto muito
claro de Martinho Lutero, ainda da época em que era católico:
Assim quando sentimos dores, quando sofremos, quando morremos,
volte-se nosso olhar para isso. Creamos firmemente e nos convençamos de
que não somos nós ou nós sozinhos que sentimos dores e sofrimentos, mas
é Cristo e a Igreja que conosco também suportam dores, sofrem, morrem.
Cristo quis que o nosso caminho de morte, de que todo homem tem pavor,
não fosse solitário, mas que percorrêssemos, acompanhados de toda a
Igreja, o caminho da paixão e da morte, e que a Igreja sofresse aí
mais do que nós próprios..."
Esse texto deixa claro o que quer dizer "representação" no contexto
eclesiológico: os membros todos da "communio" são responsáveis uns pelos outros até
no campo mais pessoal de sua vida e morte, sua alegria e sofrimento, sua
santidade e pecaminosidade; carregam-se mutuamente e são mutuamente
carregados. A igual originalidade da fé pessoal e da fé comunitária e até mesmo
o "possuir em comum no campo mais pessoal" abrangem o núcleo existencial
no qual o homem ouve o apelo de Deus e o acolhe na fé para sua salvação,
onde, todavia, sempre é de novo tentado pelo pecado da incredulidade. Assim,
o encontro singular é insubstituível de todo indivíduo com Deus realiza-se, já
sempre no "ambiente" comunitário dos que vivem "de corpo e alma" na "communio"
do amor entre Pai e Filho, isto é, no Espírito Santo; cujo eu cada vez mais "se
põe a caminho" e "se relativiza", pela força deste Espírito relacional, rumo aos
outros e em prol dos outros.
A eucaristia é o evento central em que acontece essa transposição do "ser
para os outros" trinitário para o "ser para os outros" eclesial. Ela torna presente
a doação da vida de Jesus "por vós e por todos", na qual o Inocente tomou sobre
si representativamente a violência e a distância de Deus imanentes ao pecado,
para, com sua não-violência e proximidade de Deus, suportá-las até não mais
poder, e assim atingi-las em suas raízes e desarmá-las. Na celebração eucarística
da memória, o Espírito Santo assume os fiéis nesta ação libertadora e reconciliadora
de Jesus; nela se lhes faculta abandonar o seu "ser-para-si" pecador e
assimilar a forma de Jesus de "ser-para-os-outros" (2Cor 5,14s; Rm 14,7). Na
medida em que as pessoas deixam acontecer em si essa ação libertadora do
Espírito Santo, elas se tornam realmente conformes (à sua maneira finita) à figura
do Filho que aí se ilumina, pura abertura ao amor do Pai e doação sem reservas
aos homens. Assim a comunidade que celebra comunitariamente participa
do "pelos outros" do Deus trino, podendo realizar esse "pelos outros" também no
nível inter-humano-eclesial precisamente como comunidade do corpo de Cristo,
comunidade formada pelo entretecimento mútuo dos seus membros, pela
responsabilidade de uns pelos outros e pela capacidade de uns levarem os outros.
Essa mútua ligação solidária na salvação pode ser expressa concretamente
de diversas maneiras: na prece de intercessão pelos vivos e mortos,
no alívio recíproco e perceptível em toda penúria, na aceitação espontânea
do sofrimento (cf. Teresa de Lisieux e Carlos de Foucauld) para suportar no
próprio corpo "pelo corpo de Cristo, a Igreja" e seus membros o que "falta
à Paixão de Cristo" (Cl 1,24; cf. Rm 9,3 e Ex 32,32); na obediência a uma
vocação doada pelo Espírito que renuncia a realização dos próprios desejos
em benefício dos outros etc. Quanto mais se incorpora este agir no contexto
de uma espiritualidade da "communio" e do "pelos outros", tanto mais se pode
fugir da tentação de uma mística do sofrimento salvífico-individualista
ou inimiga da vida que atribui ao solrimento "em si" uma qualidade salvífica.
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Santidade: a Igreja Santa e Pecadora
"Quem haveria de qualificar a Igreja real, que é tão real e multicolorida
quanto a antiga Jerusalém, fazendo dela uma pura grandeza escatológica
que estaria de uma vez para sempre além de todas as vicissitudes, de todos
os naufrágios paulinos (At 27)..., quem haveria de limitá-la a suas
estruturas concedidas e garantidas pelo alto, separando-a assim de
toda historicidade autêntica, de... toda fé, esperança e amor? O
'sujeito' que se poderia identificar com garantias sem reveses não existe nem
'na Igreja' nem 'como Igreja'. Pois a 'Igreja' não pode ser salva e
garantida em nenhum outro lugar senão na cruz do seu Senhor (e não em si mesma). E,
quando se reconhece como fruto da cruz..., ela jamais se reconhece
de outra forma senão caminhando na penitência rumo a essa cruz"
"Esta é a comunhão dos santos da qual nos orgulhamos... Não é bom que
fiquemos aqui onde todos os membros sofrem quando um membro sofre, e,
se um é glorificado, todos também se alegram? Quando, pois,
sofro, não sofro sozinho, mas comigo sofre Cristo e sofrem todos os cristãos;
assim como diz o Senhor: 'Quem vos tocar, tocará a menina de meus olhos'.
Portanto, minha carga outros a carregam; a força deles é minha força. A fé da
Igreja vem em auxílio da minha fé, a castidade de outros ampara minha tentação de luxúria,
o jejum de outros torna-se-me um ganho, a prece de outros preocupa-se
comigo. Posso assim verdadeiramente me gloriar nos bens dos outros como
dos meus próprios; e são de verdade meus, com eles me deleito e me alegro
também. Ainda que eu seja desonrado e sujo, aqueles que eu amo e a que
presto reverência são belos e agraciados. Com esse amor faço meus não só
seus bens, mas tamhém eles mesmos, e, assim, chega à honra, em virtude de
sua honra, minha desonra; por força de sua abundància sacia-se minha
necessidade, e, em virtude de seus méritos, curam-se meus pecados. Quem, pois,
haveria de se desesperar por seus pecados? Quem não se alegraria em seus
castigos, se carrcga seus pecados e castigos, ou, ao menos, não sozinho, uma
vez que tantos santos filhos de Deus e o próprio Cristo estão a seu lado? Essa
coisa tão grandiosa acontece na comunhão dos santos e na Igreja de Cristo.
Quem, no entanto, não crê que isso acontece é descrente que negou a Cristo
e a Igreja. Mesmo que não se sinta assim, todavia, acontece; e quem afinal não
o sente? Se não te desesperas e não perdes a paciência, onde esta o motivo?
Em tua virtude? Com certeza, na verdade não, mas na comunhão dos santos.
Que outra coisa quer dizer crer que a Igreja é santa a não ser crer que ela é
a comunhão dos santos? Com quem os santos têm comunhão? Com os bons
e os maus, tudo pertence a todos, como o sacramento do altar o expressa
simbolicamente no pão e no vinho: somos designados aí pelo Apóstolo como
um só corpo, um só pão e uma só bebida. O que outrem sofre, sofro e suporto
eu, o que lhe ocorre de bom, ocorre a mim. Assim também Cristo diz, o que
se faz aos pequeninos a ele se faz. Quem recebe a menor partícula do
sacramento do altar recebe com certeza pão. Quem despreza essa pequena partícula
despreza o pão como tal.
Texto retirado das páginas 361 a 368. Notas omitidas.
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