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Autor: Marcel Chappin Editora: Loyola Páginas: 144 Formato: 21 x 14 cm Preço: * * Apresentação | O Autor | Conteúdo | Amostra | Maiores Informações | Pedidos via Internet |
» APRESENTAÇÃO
Seguindo as determinações da Dei Verbum, esta introdução procura mostrar que quem estuda
teologia deve conhecer também a história da Igreja: a historicidade da própria revelação e da
teologia o exigem, a adoção das categorias históricas pela teologia e os novos métodos que daí
resultam o impõem. Deve-se constatar que o estudo da história leva ao progresso teológico. A
história da Igreja, que hoje deve ser escrita à luz da Lumen Gentium, é igualmente relevante
para a formação eclesial e poderá fortalecer no cristão a identidade com o passado, oferecer
inspiração para o presente e dar esperança para o futuro.
Esta obra trata também de outros temas. Quem estuda a história da Igreja deve ter consciência dos
fatores que condicionam a pesquisa, os quais podem ser agrupados sob três palavras-chaves: a
pessoa do historiador, as fontes da historiografia e as estruturas da história. O difícil problema
dos juízos morais encontra uma solução no único critério da dignidade humana. A presença de Deus
na história dos homens pode ser concebida, seguindo Paulo VI na encíclica Ecclesiam Suam,
nos termos do diálogo.
» O AUTOR
Marcel Chappin nasceu em Nijmegen (Países Baixos) em 1943. Estudou filosofia na Faculdade
dos Jesuítas de sua cidade natal, história na Universidade de Amsterdã e teologia na Pontifícia
Universidade Gregoriana, onde doutorou-se em história da Igreja. Nesta mesma Universidade leciona
história da Igreja na Faculdade de Teologia (desde 1981) e dirige o curso superior para os Bens
Culturais da Igreja. É também o responsável pelo arquivo.
» CONTEÚDO
» AMOSTRA
A SOCIALIDADE DO HISTORIADOR
Ao falar do sexo do autor, evidenciamos já a ligação entre a
individualidade e a socialidade do historiador. A socialidade é
a segunda dimensão do historiador, e, provavelmente, a mais
importante. Apesar de os valores fundamentais se encontrarem
no coração de cada homem e, portanto, sua responsabilidade
pessoal para com seu comportamento moral - e seus juízos de
valor - permanecer irrenunciável, para a descoberta de tais
valores, de qualquer maneira, faz-se necessária uma mediação
(na visão de fé esta é a palavra de Deus), para que eles possam
ser mais facilmente reconhecidos pelo indivíduo.
Quando se procura descrever a dimensão da socialidade do
historiador em relação ao seu produto historiográfico, deve-se
logo constatar que neste mundo existem muitas sociedades e
que uma pessoa normalmente pertence a mais de uma. Essencial
é a sociedade da família, clã ou tribo, ou seja, aquilo que
oferece em primeiro lugar o nome à pessoa, e com isso uma identidade
fundamental; as convicções mais pessoais formam-se, provavelmente,
nessas pequenas unidades.
Muitos aspectos da existência, porém, são determinados pelas
ligações de unidades maiores, permeadas, nos tempos recentes,
pelo nacionalismo e pelo centralismo (com todas as suas variações
e diversos estágios e fases); em boa parte do mundo, a
unidade predominante em sua determinação é o Estado
nacional. Diante do estrangeiro, o historiador apresentar-se-á
provavelmente como cidadão deste ou daquele Estado; e o estrangeiro,
com toda probabilidade, começará sua identificação neste ponto.
Mas é preciso desde já fazer algumas matizações.
A realidade do Estado nacional não deve ser superestimada.
Essa valorização excessiva pode vir de certo "monopólio de
publicidade" do Estado, que colocará o Estado e seus simbolos
no centro das atenções ou advir do fato de que, especialmente
na historiografia, esta unidade oferece um hábil instrumento de
organização da matéria, ou ainda ser estimulada por dois outros
fatores em historiografia:
Por outro lado, seria preciso considerar que o historiador
profissional provém, em geral, das camadas médias e altas da
sociedade, se é licito generalizar cautelosamente - pelo menos
para os outros países europeus - os resultados de uma pesquisa
feita a respeito dos historiadores alemães entre 1800 e 1970
(essa consideração não se aplica totalmente ao caso dos
historiadores da Igreja, na medida em que entre eles ainda há um
elevado número de clérigos, recrutados de uma forma diferente do
que os profissionais). Esse fato poderia levar a pensar que o
historiador profissional se identifica, em geral, mais com o
Estado nacional do cidadão médio; de qualquer maneira, isso vale
de forma explícita para alguns países durante alguns períodos
de tempo. Portanto, tendo em mãos um texto historiográfico,
deve-se atentar cuidadosamente para a data e levar em conta a
virulência do nacionalismo do momento específico (e procurar
descobrir em que medida o autor terá sido influenciado por
ele).
Com relação ao cidadão médio, há, porém, outra diferença:
se a pertença à camada dos intelectuais em certo período de
tempo pode ter como resultado um sentimento nacionalista mais
forte do que o do cidadão médio, o mesmo fato também pode
levar a um sentimento internacionalista, pois sua profissão
torna o historiador membro do mundo acadêmico internacional. Isso
oferece algumas possibilidades, na medida em que uns entram
em contato com outros, por meio de leituras, correspondência,
participações em congressos, visitas a outras universidades
etc.
Essa internacionalidade do historiador poderia ser analisada
ainda sob outro aspecto: o da divisão do mundo em várias
regiões, aliás em vários mundos. O mundo internacional acadêmico -
mesmo o dos historiadores - até há poucas décadas
limitava-se exclusivamente ao que chamamos de Primeiro Mundo,
e ainda hoje continua sendo "primeiro-mundista", mesmo
quando se trabalha naquilo que, geograficamente, seria o
Terceiro Mundo.
Apenas recentemente existe também uma historiografia que
se identifica com o Terceiro Mundo; uma historiografia do Segundo
Mundo, ou seja, a do socialismo real, existia a partir da
Revolução de Outubro, mas depois do "ano admirável" de 1989
e de suas consequências, poucos lugares restaram onde ela poderia
ainda ser cultivada. Sua existência, entretanto - em sua
fácil identificação - pode ainda em nossos dias ajudar-nos a
perceber como as demais historiografias também estão em função
de certo sistema, ainda que no Primeiro Mundo aquele sistema
não seja tão monolítico. Esse processo de tomada de consciência
no Primeiro Mundo é também promovido pela historiografia
do Terceiro Mundo, exatamente porque a realidade do
Terceiro Mundo se define exclusivamente (sobretudo no passado)
em relação ao Primeiro Mundo. Mesmo que no Primeiro
Mundo o nacionalismo (na realidade vivida e, a seguir, na historiografia)
tivesse sido superado - a vitória parecia próxima há
poucos anos - o resultado não teria sido ainda um verdadeiro
universalismo.
A própria terminologia de Primeiro, Segundo e Terceiro
Mundo evoca uma série de problemas dos quais devemos tomar
consciência, inclusive para "purificar" nossa historiografia. A
terminologia não está completa; o Time Magazine de 22 de dezembro
de 1975 fala de um Quarto e de um Quinto Mundo:
enquanto o Terceiro Mundo seria formado pelos países mais
desenvolvidos e mais ricos dentre aqueles que não pertencem ao
Primeiro e ao Segundo Mundo, o Quarto Mundo constituir-se-ia
daqueles países que têm grandes dificuldades e necessidade de
ajuda, mas que ainda têm a possibilidade de alcançar um nível
melhor, enquanto os países do Quinto Mundo são aqueles que se
encontram em um estado catastrófico e talvez permaneçam para
sempre na miséria. E, analogamente, como se pode falar de um
Terceiro Mundo no Primeiro Mundo (com a possível identificação
do historiador com ele), assim também no Terceiro Mundo há
"bolsões do Primeiro Mundo", em especial in accademicis.
Outro problema: a terminologia é uma criação européia e
atlântico-cêntrica. De fato, "Terceiro Mundo" é utilizado pela
primeira vez pelo demógrafo Alfred Sauvy, em L'Observateur de
14 de agosto de 1952, que chega a essa expressão por causa de
uma comparação, lisonjeira, com a Revolução Francesa, em que
o Terceiro Estado, afinal, resultava vitorioso; entretanto, quem
não tem conhecimento disso lê "terceiro" como uma classificação
condescendente feita pelo autoproclamado "Primeiro Mundo".
Além do mais, há o problema de que os critérios de identificação
dos diversos mundos não são uniformes, como observou
P. Worsley em seu "The Three Worlds. Culture and World Developmen".
Para o Primeiro e para o Segundo Mundo vale um
critério político-econômico, para o Terceiro apenas o econômico,
a ser resumido com a palavra dependência, ou talvez exploração;
dessa maneira, a identificação do Terceiro Mundo baseia-se em
um critério não apenas unilateral, mas também negativo.
Em um nível mais microssociológico encontra-se outra dimensão
da socialidade em seu caráter condicionante, à qual já
aludimos: muitas vezes, o historiador é membro do mundo acadêmico,
ainda que haja casos em que alguns se movem em outros
ambientes, por exemplo o do jornalismo e da publicidade. Além
do aspecto da camada social, média ou alta, que impõe determinados
comportamentos, tradições, convenções e convicções
(mas não de maneira uniforme), o mundo acadêmico ou o da
publicidade farão com que sinta seu peso e sua importância. Já
dissemos que o mundo acadêmico pune o comportamento desonesto,
ou seja, aquele que esconde ou destrói fontes, inventa
resultados ou comete plágio; até a superficialidade é punida.
Michel de Certeau indicou como o verdadeiro leitor do texto
científico não é o público, mas o milieu dos historiadores; o
livro não reçu será considerado uma vulgarização, nunca parte
da historiografia. Trata-se de um controle a ser avaliado
positivamente, mas que poderia estimular certo conformismo em vez
de inovação; certo conformismo nos métodos, na interpretação,
até mesmo no estilo de escrever: tudo deve ser como "entre
professores". O fechamento diante dos não "profissionais" poderia
ser um bloqueio muito condicionante, mas nem sempre de
forma negativa. Fernand Braudel (1902-1985) é o clássico exemplo
de alguém que, mesmo estando envolvido na pesquisa científica
e no ensino acadêmico, foi considerado, durante longo
tempo, um "herético", antes de ser admitido, seis meses antes
de morrer, na Accadémie Française, na qualidade de membro,
como um "príncipe".
Os que não pertencem ao mundo acadêmico não terão o apoio,
os meios, os assistentes, o confronto com os colegas; todavia,
encontrando-se em outro ambiente poderão ser estimulados a ser
inovadores, polêmicos, agressivos. Quem toma nas mãos um estudo,
às vezes, deverá levar em conta também esse aspecto.
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A Pessoa do Historiador
Um aspecto deve vir da consideração de que há Estados de
caráter mais federal, fato que já torna menos forte a
"determinação", sobretudo sociocultural, ou seja, no nível em que se
encontra a categoria profissional do historiador; ainda que o
Estado centralizador condicione quase que exclusivamente a
qualidade da vida econômica, política e jurídica dos cidadãos (mas
com diferenças para os Estados de caráter federal), o cidadão
médio vive a realidade talvez em sua cidade ou em sua região.
O Estado unitário muitas vezes é uma criação bastante recente,
e mesmo em pequenos Estados pode haver diferenças regionais
consideráveis, com todas as tradições culturais e, portanto,
avaliações diferenciadas. Em um Estado pode haver não apenas
mais de uma nação, mas no interior da própria nação as diferenças
entre norte e sul, leste e oeste podem ser consideráveis;
fatores econômicos e religiosos podem ter gerado e continuado
tais diferenças. É importante levar em conta também esses
fatores para melhor conhecer o autor que se está estudando.
Texto retirado das páginas 82 a 86.
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