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Autor: Salvador Pié-Ninot Editora: Loyola Páginas: 110 Formato: 21 x 14 cm Preço: * * Apresentação | O Autor | Conteúdo | Amostra | Maiores Informações | Pedidos via Internet |
» APRESENTAÇÃO
Esta Introdução à Eclesiologia quer aproximar-nos do paradoxo e do mistério da Igreja,
contribuindo para que os cristãos de hoje - e com eles, o mundo atual - se sintam novamente
atraídos pela fecundidade inesgotável de uma Igreja que é Mãe e pela renovada oferta de uma
Igreja que é Fraternidade.
» O AUTOR
Salvador Pié-Ninot é sacerdote da diocese de Barcelona. Realizou seus estudos teológicos
na Pontifícia Universidade Gregoriana, onde concluiu o doutorado em 1971. É professor titular
de Teologia Fundamental e Eclesiologia na Faculdade de Teologia da Catalunha e professor convidado
da Pontifícia Universidade Gregoriana. Participou como perito na preparação do Sínodo sobre o
Laicato de 1987 e no IV Simpósio Luterano-Católico de 1988. Escreveu diversas obras sobre
Teologia para diversas editoras estrangeiras.
» CONTEÚDO
» AMOSTRA
1. ELEMENTOS INICIAIS: PATRÍSTICA, DIREITO CANÔNICO E SUMAS TEOLÓGICAS
Os estudos atuais sobre a história da eclesiologia estão de acordo em
situar o verdadeiro nascimento do tratado "De Ecciesia" na obra de Tiago de
Viterbo, "De Regimine Christiano", publicada em 1301-1302. Com eleito,
trata-se de um opúsculo que já pode ser considerado um verdadeiro
tratado sobre a Igreja, no qual encontramos doutrinas de origem agostiniana -
por exempio, a doutrina teocrática - e outras de matriz tomista - por
exemplo, a idéia do direito natural do Estado - combinadas num esforço
conciliador que confere a essa obra um aspecto peculiar que permite
classificá-la como uma obra de transição. Mas isso não significa que essa temática
não estivesse presente antes disso, especialmente na eclesiologia patrística,
nos primórdios da ciência canônica e nas "sumas medievais". Damos a seguir os
pontos mais relevantes dessas etapas.
A Eclesiologia Patrística
Nos primeiros séculos, a eclesiologia era mais vida e
consciência do que teologia sistemática. No centro dessa eclesiologia ante
litteram está a realidade da comunhão entendida como vínculo entre bispos e fiéis,
bispos e fiéis entre si, que se realiza e se manifesta de forma preeminente na
celebração-comunhão eucarística. Essa comunhão era percebida como
estrutura da Igreja e vivida muito intensamente na experiência cotidiana da
Igreja, embora não fosse ainda objeto de reflexão sistemática.
Surge, além disso, a consciência muito viva da maternidade da
Igreja, a "Ecclesia Mater", como portadora da salvação e geradora do
homem novo graças ao batismo. Portanto, nessa etapa, a eclesiologia, mais
do que num tratado à parte, se encontra nas reflexões sobre a soteriologia
e a antropologia trazidas por Cristo.
Nessa etapa, ainda se revestem de capital importância os
diversos simbolos da fé da Igreja na medida em que mostram a sua relação com
Cristo. Mais do que tratar especificamente da Igreja, os Padres, a liturgia
e a catequese da época englobam tudo no sentire Ecciesiam, expressão que
exemplifica a experiência real e a criteriologia própria da confissão de fé sobre
ela.
A eclesiologia nos primórdios da ciência canônica (séc. XII)
A ciência canônica aparece como disciplina própria no século
XII, com Graciano. Muitas questões relativas aos sacramentos, ao
matrimônio e à
ordem pertencem desde então ao direito canônico. Este, por sua
vez, a partir da reforma gregoriana (último terço do século XI) e das disputas
entre o papado e os reis ou imperadores, começou a elaborar uma eclesiologia
dos poderes, das prerrogativas e dos direitos da Igreja. Por isso, durante
muitos séculos, para tratar de tais questões, os teólogos se documentaram com
os canonistas, especialmente com as Decretais de Graciano, que lhes forneciam
argumentos.
Dois pontos são importantes na contribuição trazida à
eclesiologia pelos "decretistas" - como se chamavam os adeptos das Decretais de
Graciano. Em primeiro lugar, a formação da distinção entre poder de ordem e
de jurisdição, que chegou a comportar certa autonomia do aspecto jurisdicional em
relação ao sacramental e até ao pastoral; em segundo lugar, a visão da
Igreja como corporação - corpus - no sentido corporativo-sociológico que implica
cabeça e membros.
A eclesiologia nas "sumas medievais"
Falta às sínteses ou sumas medievais um tratado especial de
eclesiologia, tanto na corrente franciscana (Alexandre de Hales,
Boaventura...) como na escola dominicana (Alberto Magno, Tomás de Aquino...).
Qual seria o motivo de tal ausência? Observando bem aquela
época histórica, podemos constatar que a realidade da Igreja penetrava
de maneira espontânea a vida e a mensagem cristãs, de tal forma que não
parecia ser necessária uma reflexão direta sobre si mesma, uma vez que toda
a reflexão teológica se dava in medio Ecclesiae. O próprio Tomás de Aquino
não explicitou esse tema, pois a Igreja estava presente e incluída em todas e
em cada uma das partes de sua teologia como espaço e quadro vital.
Por outro lado, a própria "Summa Theologica" destaca a
importância do esclarecimento doutrinal acerca das verdades de fim e das
verdades de meio. Com efeito, de acordo com a própria expressão do credo
apostólico, a Igreja não é objeto de fé do mesmo modo que Deus, Jesus Cristo e o
Espírito Santo, pois não se aplica a ela o credere in que se aplica às três
pessoas divinas, mas o mero verbo credere Ecciesiam. Assim, se crê antes em Deus na
Igreja, uma vez que esta se encontra no contexto da pneumatologia, sendo o
Espírito que torna presente a revelação de Deus em Jesus Cristo no mundo e
na história.
Eis as claras palavras de Santo Tomás a esse respeito: "Se se
usa o in, o sentido deve ser: 'Creio no Espírito Santo que santifica a
Igreja'; mas seria melhor prescindir do in e dizer simplesmente: 'crer a santa Igreja
católica'" ("Quod si dicatur in sanctam Ecclesiam catholicam, Spiritum Sanctum, qui
santificat Ecclesiam; ut sit sensus: Credo in Spiritum Sanctum,
sanctificantem Ecclesiam. Sed melius est ut non ponatur ibi in, sed simpliciter dicatur
sanctam Ecciesiam catholicam", S. Th., 11-11, q. 1, a. 9).
Nessa linha de pensamento, o próprio Catecismo do Concílio de
Trento afirma: "Professamos crer a santa Igreja e não na santa
Igreja. Com esse modo de falar, distinguimos Deus - autor de todas as coisas - de
todas as suas criaturas e de todos os bens inestimáveis que ele deu à Igreja;
recebendo-os, nós os relacionamos com sua divina bondade" (I, art. 9, n. 22).
De fato, o credore in Deum não pode ser aplicado à Igreja. Por mais que
esta possa e deva ser "personificada", por mais que possa ser algo mais que
a soma meramente numérica de todos os cristãos, por mais que seja uma
realidade, que não é apenas jurídica e muito menos uma ficção, nem construção
ideológica, mas "unidade moral", ela não é, todavia, pessoa, e como tal
não é eterna. Mas, uma vez esclarecido que a Igreja não merece a preposição
que pareceria assimilá-la a Deus, convém reconhecer o lugar privilegiado que
ela ocupa, apesar de tudo, na economia da fé cristã.
2. OS TRATADOS APOLOGÉTICOS DESDE O SÉCULO XVI ATÉ O VATICANO I
O problema da demonstração científica da verdade da Igreja
católica, ou seja, a verificação de que o cristianismo católico romano está
em continuidade total com as intenções e a obra de Jesus Cristo, fundador da
Igreja, foi uma questão que se pôs desde o inicio, quando apareceram os
primeiros cismas. Mas o capítulo da eclesiologia apologética clássica que se
designa como demonstratio catholica é uma criação moderna: de fato, nem
as heresias da antiguidade nem a separação entre o Oriente e o Ocidente
cristãos ocorrida na Idade Média haviam provocado a crise religiosa que se
verificou no século XVI, na qual se confrontaram diversas comunhões rivais que
pretendiam ser as verdadeiras herdeiras de Cristo: catolicismo, anglicanismo e
protestantismo de vários tipos. O tratado "De Vera Ecclesia", não obstante
certas antecipações como a de Tiago de Viterbo, a que já nos referimos, só é
elaborado no século XVI e se consolida, se desenvolve e se transforma
incessantemente por diversos séculos até ser relançado no Concilio Vaticano I (em
1870).
Três são as formas tradicionais dessa eclesiologia configurada
em três vias. A via historica, que, por intermédio do exame dos
documentos antigos, procura mostrar que a Igreja católica romana é a Igreja cristã
de sempre, que aparece na história como uma sociedade una, visível, permanente
e hierarquicamente organizada. Essa via se reduz na prática a assim
chamada via primatus, que é uma simplificação da via historica, pois se limita a
mostrar a verdade da Igreja romana a partir da prova de que o seu chefe, o bispo
de Roma, é o legítimo sucessor de Pedro, prescindindo de todos os outros
aspectos de continuidade histórica.
A segunda é a via notarum, que se desenvolve seguindo este
silogismo: Jesus Cristo dotou a sua Igreja de quatro notas distintivas: a
unidade, a santidade, a catolicidade e a apostolicidade; ora, a Igreja
católica romana é a única a possuir essas quatro notas, portanto, é a verdadeira
Igreja de Cristo, ficando assim excluidas as demais confissões cristãs, como o
luteranismo, o calvinismo, o anglicanismo e a ortodoxia, por não as possuírem.
A terceira, finalmente, é a via empirica, adotada pelo Concílio Vaticano I,
graças ao seu promotor, o cardeal Dechamps, que segue um método mais simples:
abandona toda e qualquer comparação entre a Igreja romana atual e a
antiguidade, para evitar as dificuldades suscitadas pela interpretação dos
documentos históricos, como também a verificação concreta das notas, e avalia
a Igreja em si mesma como milagre moral, que é como o sinal divino que
confirma sua transcendência.
Dessas três vias, a via notarum foi a mais utilizada nos
tratados eclesiológicos, e, embora seja distinta das outras duas, nem sempre
essa distinção foi muito clara, uma vez que ela deve buscar o seu espírito na via
historica devido às constantes referências à verificação histórica das notas, e
sua matéria está muito ligada à via empirica, pois as notas são percebidas como
um milagre de ordem moral.
Assim, depois das primeiras tentativas no século XIV com Tiago
de Viterbo, no século XV com João de Ragusa e João de Torquemada,
o tratado sobre a Igreja no século XVI costuma aparecer no âmbito da
apologética, que assume dois graus: depois do tratado "De Vera Religione" se
constitui o "De Ecclesia". Este último adquire uma clara perspectiva
introdutória e apologética, porque aparece justamente num momento em que estão em andamento
as primeiras lutas contra o luteranismo e o calvinismo. Assim,
pode-se afirmar que, por volta de 1550, já circula por toda a Europa um tratado
semelhante, se bem que com nuanças bem diferenciadas.
Nesses tratados sobressai a via notarum, como via eclesiológica
por excelência que, embora criada no século XVI, extrai os seus
argumentos da Escritura e dos Padres, em parte já trabalhados na Idade Média, e
fornece ao mesmo tempo diversos tipos de nota. O primeiro grupo de notas surge
da Escritura, especialmente do Novo Testamento, e são: a indefectibilidade e
universalidade da Igreja, prometidas por Cristo aos apóstolos; a
visibilidade que deriva da missão apostólica; a santidade própria dos homens chamados à
conversão; a unidade que Cristo havia pedido aos seus; finalmente, os
milagres como sinais dos seguidores de Cristo.
O segundo grupo é formado pelas notas provenientes da
patrística, especialmente de Santo Agostinho e S. Vicente de Lérins. Com
efeito, num trecho da carta (Contra Epistulam Manichei, Santo Agostinho expõe as
razões que conservam a unidade da Igreja desta forma: a sabedoria
perfeita, o acordo universal na fé, os milagres, a sucessão dos pastores e o
próprio qualificativo de católico (cf. PL 42,175). Por outro lado, o famoso cânon de
S. Vicente de Lérins, "quod ubique, quod semper, quod ab omnibus", fornece
três critérios - a universalidade, a antiguidade e o acordo universal - para
distinguir a fé eclesial das opiniões particulares (Comm. 2,5).
O terceiro grupo de notas é tirado do símbolo de Constantinopla
no seu artigo nono: "[...] et unam, sanctam, catholicam et
apostolicam Ecclesiam". Trata-se, sem dúvida, do grupo mais sólido desde o princípio,
que dará à via notarum a estrutura definitiva.
A partir dessa formulação inicial, a via notarum sofre diversas
alterações de acordo com a sensibilidade do momento. Assim, nos séculos XVI e
XVII as notas se apresentam como derivadas mais da Escritura e dos Padres. Já
nos séculos XVIII e XIX prefere-se sublinhar que as quatro notas se impõem
por si mesmas à sociedade eclesiástica. No final do século XIX - quer dizer,
entre o Vaticano I e o Vaticano II - tais notas são descritas de maneira
predominantemente romântica e se destaca a expansão mundial do catolicismo, a
coesão e a fecundidade da Igreja. Em última análise, conservando o processo de
argumentação da via notarum - existem notas e somente o catolicismo as cumpre -
a eclesiologia apologética adaptou a sua forma de acordo com as circunstâncias,
quando predominavam ora a fé nos livros inspirados - primeira etapa da via
notarum - ora as tendências racionalistas - segunda etapa - ora o gosto
pelos dados empíricos - terceira etapa. Mas, com esta terceira etapa, já nos
encontramos no primeiro Concílio eclesiológico por excelência: o Vaticano I.
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O Nascimento do Tratado "De Ecclesia"
Texto retirado das páginas 13 a 18.
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