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Exortação Apostólica Pós-Sinodal
ECCLESIA IN AMERICA

VI. A MISSÃO DA IGREJA NA AMÉRICA ATUAL: A NOVA EVANGELIZAÇÃO

«Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós» (Jo 20, 21)

Enviados por Cristo

66. Cristo ressuscitado, antes da sua ascensão ao céu, enviou os Apóstolos a anunciar o Evangelho pelo mundo inteiro (cf. Mc 16, 15), conferindo-lhes os poderes necessários para realizar essa missão. É significativo que, antes de confiar o último mandato missionário, Jesus tenha feito referência ao poder universal que recebera do Pai (cf. Mt 28, 18). Na realidade, Cristo transmitiu aos Apóstolos a missão recebida do Pai (cf. Jo 20, 21), tornando-os assim participantes dos seus poderes.

Mas também «os fiéis leigos, precisamente por serem membros da Igreja, têm por vocação e por missão anunciar o Evangelho: para essa obra foram habilitados e nela comprometidos pelos sacramentos da iniciação cristã e pelos dons do Espírito Santo». (239) De fato, eles foram «feitos participantes, a seu modo, da função sacerdotal, profética e real de Cristo». (240) Por conseguinte, «os fiéis leigos, devido à sua participação no múnus profético de Cristo, estão plenamente comprometidos nesta tarefa da Igreja» (241) e, portanto, devem sentir-se chamados e enviados a proclamar a Boa Nova do Reino. As palavras de Jesus: «Ide vós também para a minha vinha» (Mt 20, 4), (242) devem ser vistas como dirigidas não só aos Apóstolos, mas a todos aqueles que desejam ser autênticos discípulos do Senhor.

A tarefa fundamental para a qual Cristo envia os seus discípulos é o anúncio da Boa Nova, isto é, a evangelização (cf. Mc 16, 15-18). Segue-se daí que «evangelizar constitui, de fato, a graça e a vocação própria da Igreja, a sua mais profunda identidade». (243) Como já disse em outras ocasiões, a singularidade e novidade da situação em que o mundo e a Igreja se encontram, às portas do terceiro milênio, e as exigências que daí derivam, fazem com que a missão evangelizadora atualmente requeira também um novo programa que, no seu conjunto, pode definir-se «nova evangelização». (244) Como Pastor supremo da Igreja, desejo ardentemente convidar todos os membros do Povo de Deus, e de modo especial os que vivem no Continente americano — donde fiz, pela primeira vez, apelo a um compromisso novo «no seu entusiasmo, nos seus métodos, na sua expressão» (245) — para assumirem este projeto e colaborarem nele. Cada um, ao aceitar esta missão, lembre-se de que o núcleo vital da nova evangelização deve ser o anúncio claro e inequívoco da pessoa de Jesus Cristo, isto é, o anúncio do seu nome, da sua doutrina, da sua vida, das suas promessas e do Reino que Ele nos conquistou por meio do seu mistério pascal. (246)

Jesus Cristo, «boa nova» e primeiro evangelizador

67. Jesus Cristo é a «boa nova» da salvação comunicada aos homens de ontem, de hoje e de sempre; mas, ao mesmo tempo, Ele é também o primeiro e supremo evangelizador. (247) A Igreja deve colocar o centro da sua atenção pastoral e da sua ação evangelizadora em Cristo crucificado e ressuscitado. «Tudo o que se projeta no campo eclesial deve partir de Cristo e do seu Evangelho». (248) Por isso, «a Igreja na América deve falar cada vez mais de Jesus Cristo, rosto humano de Deus e rosto divino do homem. É este anúncio que verdadeiramente mexe com os homens, que desperta e transforma os ânimos, ou seja, que converte. É preciso anunciar Cristo com alegria e fortaleza, mas sobretudo com o testemunho da própria vida». (249)

Cada cristão poderá cumprir eficazmente a sua missão, na medida em que assumir a vida do Filho de Deus feito homem como o modelo perfeito da sua ação evangelizadora. A simplicidade do seu estilo e as suas opções devem ser regras para todos na obra da evangelização. Nesta perspectiva, os pobres hão de ser considerados entre os primeiros destinatários da evangelização, a exemplo de Cristo que dizia de Si mesmo: «O Espírito do Senhor (...) Me ungiu para anunciar a Boa Nova aos pobres» (Lc 4, 18). (250)

Como já indiquei antes, o amor pelos pobres deve ser preferencial, mas não exclusivo. O ter limitado a atenção pastoral pelos pobres com um certo exclusivismo — como assinalaram os Padres Sinodais —, levou, às vezes, a descurar os ambientes dos dirigentes da sociedade, com o conseqüente afastamento da Igreja de muitos deles. (251) Os prejuízos derivados da difusão do secularismo nesses ambientes, tanto políticos como econômicos, sindicais, militares, sociais ou culturais, demonstram a urgência da sua evangelização, que deve ser animada e guiada pelos Pastores, chamados por Deus para cuidar de todos. Estes poderão contar com o apoio daqueles que — e, felizmente, são ainda numerosos — permaneceram fiéis aos valores cristãos: a este respeito, os Padres Sinodais recordaram «o empenho de não poucos (...) dirigentes na construção de uma sociedade justa e solidária». (252) Com o seu apoio, os Pastores enfrentarão a difícil tarefa de evangelização destes setores da sociedade: com renovado fervor e uma metodologia atualizada, dirigir-se-ão aos dirigentes, homens e mulheres, para levar-lhes o anúncio de Cristo, insistindo principalmente sobre a formação das consciências, através da doutrina social da Igreja. Esta formação constituirá o melhor antídoto contra os inúmeros casos de incoerência e, em certos casos, de corrupção existentes na estrutura sócio-política. Vice-versa, se se descura esta evangelização dos dirigentes, não deve surpreender que muitos deles sigam critérios alheios e, às vezes, claramente contrários ao Evangelho.

O encontro com Cristo impele a evangelizar

68. O encontro com o Senhor gera uma profunda transformação em todos aqueles que não se fecham a Ele. O primeiro impulso que nasce dessa transformação é comunicar aos outros a riqueza descoberta neste encontro. Não se trata apenas de ensinar aquilo de que tivemos conhecimento, mas de fazer também, à semelhança da mulher samaritana, com que os outros encontrem pessoalmente Jesus: «Vinde ver» (Jo 4, 29). O resultado será igual ao que então se verificou no coração dos samaritanos: «Já não é por causa das tuas palavras que acreditamos; nós próprios ouvimos e sabemos que Ele é realmente o Salvador do mundo» (Jo 4, 42). A Igreja, que vive da presença permanente e misteriosa do seu Senhor ressuscitado, tem como centro da sua missão o empenho de «levar todos os homens a encontrar-se com Cristo». (253)

Ela é chamada a anunciar que Cristo é verdadeiramente o Vivente, o Filho de Deus, que Se fez homem, morreu e ressuscitou. Ele é o único Salvador de todos os homens e do homem todo e, como Senhor da história, atua continuamente na Igreja e no mundo, por meio do seu Espírito, até ao fim dos séculos. Esta presença do Ressuscitado na Igreja torna possível o nosso encontro com Ele, graças à ação invisível do seu Espírito vivificante. Aquele encontro realiza-se na fé recebida e vivida na Igreja, o corpo místico de Cristo. Este, portanto, possui essencialmente uma dimensão eclesial e leva a um compromisso de vida. De fato, «encontrar Cristo vivo significa acolher o amor com que Ele primeiro nos amou, optar por Ele, aderir livremente à sua pessoa e ao seu projeto, que consiste no anúncio e realização do Reino de Deus». (254)

A chamada faz-nos ir à procura de Jesus: «"Rabbi — que quer dizer Mestre —, onde moras?". "Vinde ver", respondeu-lhes. Foram, pois, e viram onde morava e permaneceram junto dEle nesse dia (Jo 1, 38-39). Este permanecer não se limita ao dia da vocação, mas estende-se a toda a vida. Segui-Lo implica viver como Ele viveu, aceitar a sua mensagem, assumir como próprios os seus critérios, abraçar o seu destino, partilhar o seu projeto que é o desígnio do Pai: convidar a todos para a comunhão trinitária e para a comunhão com os irmãos numa sociedade justa e solidária». (255) O desejo ardente de convidar os outros para se encontrarem com Aquele que nós encontramos, está na raiz da missão evangelizadora a que é chamada toda a Igreja mas que é sentida com particular urgência hoje na América, depois de ter celebrado os 500 anos da primeira evangelização e quando se prepara para comemorar com gratidão os 2000 anos da vinda do Filho unigênito de Deus ao mundo.

Importância da catequese

69. A nova evangelização, na qual todo o Continente está empenhado, indica que a fé não pode ser pressuposta, mas deve ser explicitamente proposta em toda a sua amplitude e riqueza. Este é o objetivo principal da catequese, sendo esta, por sua própria natureza, uma dimensão essencial da nova evangelização. «A catequese é um itinerário de formação na fé, na esperança e na caridade, que forma a mente e toca o coração, levando a pessoa a abraçar Cristo de modo pleno e completo. Introduz o crente mais plenamente na experiência da vida cristã, que inclui a celebração litúrgica do mistério da redenção e o serviço cristão aos outros». (256)

Conhecendo bem a necessidade de uma catequese completa, aceitei a proposta feita pelos Padres da Assembléia Extraordinária do Sínodo dos Bispos de 1985, para se elaborar «um catecismo ou compêndio de toda a doutrina católica, tanto em matéria de fé como de moral», que pudesse ser «ponto de referência para os catecismos ou compêndios que venham a ser preparados nas diversas regiões». (257) Essa proposta ficou concretizada com a publicação da edição típica do Catechismus Catholicæ Ecclesiæ. (258) Além do texto oficial do Catecismo e para uma melhor utilização dos seus conteúdos, quis que fosse elaborado e publicado também um Diretório Geral da Catequese. (259) Recomendo vivamente o uso destes dois instrumentos, com valor universal, a todos os que se dedicam à catequese na América. É desejável que ambos os documentos sejam utilizados «na preparação e revisão de todos os programas paroquiais e diocesanos de catequese, tendo presente que a situação religiosa dos jovens e dos adultos requer uma catequese mais querigmática e mais orgânica na apresentação dos conteúdos da fé». (260)

É necessário reconhecer e estimular a missão benemérita que muitos catequistas desempenham, por todo o Continente americano, como autênticos mensageiros do Reino: «A sua fé e o seu testemunho de vida são parte integrante da catequese». (261) Desejo encorajar cada vez mais os fiéis a assumirem, com abnegação e amor ao Senhor, este serviço da Igreja, consagrando-lhe generosamente o seu tempo e os seus talentos. Por seu lado, os Bispos preocupem-se por oferecer aos catequistas uma formação adequada para que possam desempenhar esta tarefa tão indispensável à vida da Igreja.

Sobretudo num Continente como a América onde a questão social constitui uma dimensão saliente, convém ter presente na catequese que «o crescimento na compreensão da fé e a sua expressão prática na vida social estão intimamente relacionados. As forças que trabalham para favorecer o encontro com Cristo não podem deixar de ter uma positiva repercussão na promoção do bem comum numa sociedade justa». (262)

Evangelização da cultura

70. O meu predecessor Paulo VI, com sábia inspiração punha em relevo que a «ruptura entre o Evangelho e a cultura é sem dúvida o drama da nossa época». (263) Justamente por isso, os Padres Sinodais consideraram que «a nova evangelização requer um esforço lúcido, sério e organizado para evangelizar a cultura». (264) O Filho de Deus, quando assumiu a natureza humana, encarnou-Se no âmbito de um determinado povo, embora a sua morte redentora tenha trazido a salvação a todos os homens, qualquer que seja a sua cultura, raça e condição. O dom do seu Espírito e o seu amor são destinados a todos e cada um dos povos e culturas para os unir entre si à imagem daquela perfeita união que existe em Deus Uno e Trino. Para que isso seja possível, é necessário inculturar a pregação, de forma que o Evangelho seja anunciado na linguagem e na cultura de quantos o ouvem. (265) Simultaneamente, porém, é preciso não esquecer que só o mistério pascal de Cristo, suprema manifestação do Deus infinito na finitude da história, poderá ser válido ponto de referência para toda a humanidade peregrina à procura da unidade autêntica e da verdadeira paz.

O rosto mestiço da Virgem de Guadalupe constituiu, desde o início, um símbolo da inculturação da evangelização, da qual Ela foi a estrela e a guia. Com a sua poderosa intercessão, a evangelização poderá penetrar no coração dos homens e mulheres da América, e permear as suas culturas transformando-as a partir de dentro. (266)

Evangelizar os centros educacionais

71. O mundo da educação é um campo privilegiado para promover a inculturação do Evangelho. Todavia, os centros educacionais católicos, e os que, mesmo sem ser confessionais, têm de fato uma clara inspiração católica, só poderão desenvolver uma ação de autêntica evangelização se souberem conservar, com clareza e a todos os níveis, incluindo o universitário, a sua orientação católica. Os conteúdos do projeto educativo deverão fazer referência constante a Jesus Cristo e à sua mensagem, tal como a Igreja a apresenta na sua doutrina dogmática e moral. Somente assim será possível formar dirigentes autenticamente cristãos nos diversos campos da atividade humana e da sociedade, especialmente na política, na economia, na ciência, na arte e na reflexão filosófica. (267) Neste sentido, «é essencial que a Universidade Católica seja, ao mesmo tempo, verdadeira e realmente ambas as coisas: Universidade e Católica (...). A índole católica é um elemento constitutivo da Universidade enquanto instituição, não dependendo, portanto, da simples decisão dos indivíduos que, em certo momento, dirigem a Universidade». (268) Por isso, há de ser objeto de particular solicitude o trabalho pastoral nas Universidades Católicas: deve-se promover o empenho apostólico dos estudantes, para se tornarem eles próprios evangelizadores do mundo universitário. (269) Além disso, «é preciso estimular a cooperação entre as Universidades Católicas da América inteira para que se enriqueçam mutuamente», (270) contribuindo dessa forma para a realização, também a nível universitário, do princípio da solidariedade e de intercâmbio entre os povos de todo o Continente.

Algo parecido deve ser dito a propósito também das escolas católicas, sobretudo no âmbito do ensino secundário: «É preciso fazer um esforço especial para reforçar a identidade católica das escolas, cuja natureza específica se fundamenta num projeto educacional que tem a sua origem na pessoa de Cristo e a sua raiz na doutrina do Evangelho. As escolas católicas devem procurar não só oferecer uma educação qualificada do ponto de vista técnico e profissional, mas também e sobretudo cuidar da formação integral da pessoa humana». (271) Vista a importância da tarefa que desempenham os educadores católicos, uno-me aos Padres Sinodais que, de ânimo agradecido, encorajaram todos aqueles que se dedicam ao ensino nas escolas católicas — sacerdotes, homens e mulheres consagrados, e leigos comprometidos —, «para que perseverem na sua missão, tão importante». (272) É preciso fazer com que a influência destes centros de ensino chegue, sem distinções nem exclusivismos, a todos os setores da sociedade. É indispensável fazer todo o esforço possível para que as escolas católicas, não obstante as dificuldades econômicas, continuem a oferecer «a educação católica aos pobres e aos marginalizados da sociedade». (273) Nunca será possível libertar os indigentes da sua pobreza, se primeiro não forem libertos da miséria resultante da carência de uma digna educação.

No projeto global da nova evangelização, o setor da educação ocupa um lugar privilegiado. Por isso, há que encorajar a atividade de todos os docentes católicos, inclusive daqueles empenhados em escolas não confessionais. Faço também um apelo urgente aos consagrados e às consagradas, para que não abandonem este campo que é tão importante para a nova evangelização. (274)

Como fruto e expressão da comunhão entre todas as Igrejas particulares da América, reforçada com certeza pela experiência espiritual da Assembléia Sinodal, não há de negligenciar-se a promoção de simpósios para educadores católicos, de âmbito nacional e continental, procurando assim organizar e incrementar a ação pastoral educativa em todos os ambientes. (275)

Para cumprir todas estas tarefas, a Igreja na América tem necessidade, no campo do ensino, de um próprio espaço de liberdade que deve ser entendido, não como um privilégio, mas como um direito, em virtude da missão evangelizadora que lhe foi confiada pelo Senhor. Além disso, os pais têm o direito fundamental e primário de decidir sobre a educação de seus filhos e, por esse motivo, os pais católicos devem ter a possibilidade de escolher uma educação de acordo com suas próprias convicções religiosas. A função do Estado neste âmbito é de caráter subsidiário. Ele tem a obrigação «de garantir a todos a educação e de respeitar e defender a liberdade de ensino. O monopólio do Estado neste campo deve ser denunciado como uma forma de totalitarismo, lesivo dos direitos fundamentais que deve defender, especialmente do direito dos pais à educação religiosa dos seus filhos. A família é o primeiro espaço educativo da pessoa». (276)

Evangelizar através dos meios de comunicação social

72. Para a eficácia da nova evangelização, é fundamental um profundo conhecimento da cultura atual, na qual têm grande influência os meios de comunicação social. Por isso, é indispensável conhecer e servir-se destes meios, tanto nas suas formas tradicionais como nas formas introduzidas mais recentemente pelo progresso tecnológico. A realidade atual requer que se saiba dominar a linguagem, a natureza e as caraterísticas dos mídia. Utilizando-os de maneira correta e competente, pode-se levar a termo uma autêntica inculturação do Evangelho. Por outro lado, estes mesmos meios contribuem para modelar a cultura e a mentalidade dos homens e mulheres do nosso tempo, pelo que os agentes no campo dos instrumentos de comunicação social devem ser destinatários de uma especial ação pastoral. (277)

A este respeito, os Padres Sinodais apontaram numerosas iniciativas concretas para uma presença eficaz do Evangelho no mundo dos meios de comunicação social: a formação de agentes pastorais para esse âmbito; o incremento de centros de produção qualificada; o uso prudente e atento de satélites e das novas tecnologias; a formação dos fiéis para que sejam usuários «críticos»; a união de esforços para adquirir e depois gerir em conjunto novas emissoras e redes televisivas, e também para coordenar as que já existem. Quanto às publicações católicas, estas merecem ser apoiadas e têm necessidade de alcançar, como desejado, um progresso qualitativo.

É preciso animar os empresários para apoiarem economicamente os produtos de qualidade que promovem os valores humanos e cristãos. (278) Mas, um programa tão vasto supera amplamente as possibilidades de cada uma das Igrejas particulares do Continente americano. Por isso, os Padres Sinodais propuseram a coordenação interamericana das atividades existentes no campo dos meios de comunicação social, que ajude ao recíproco conhecimento e cooperação nas realidades já em ato no setor. (279)

O desafio das seitas

73. A atividade de proselitismo, que as seitas e novos grupos religiosos desenvolvem em várias regiões da América, constitui um grave obstáculo ao esforço evangelizador. A palavra «proselitismo» tem sentido negativo quando reflete um modo de conquistar adeptos não respeitador da liberdade daqueles que são atingidos por uma determinada propaganda religiosa. (280) A Igreja Católica na América critica o proselitismo das seitas e, por esta mesma razão, na sua ação evangelizadora exclui o recurso a tais métodos. Ao propor o Evangelho de Cristo em toda a sua integridade, a atividade evangelizadora deve respeitar o santuário da consciência de cada indivíduo, onde se desenrola o diálogo decisivo, absolutamente pessoal, entre a graça e a liberdade do homem.

Deve-se levar isto em conta, especialmente quando se trata dos irmãos cristãos das Igrejas e Comunidades eclesiais separadas da Igreja Católica, que estão estabelecidas já há muito tempo em determinadas regiões. Os vínculos de comunhão verdadeira, embora imperfeita, que, segundo a doutrina do Concílio Vaticano II, (281) essas Comunidades já possuem com a Igreja católica, devem iluminar as atitudes desta e de todos os seus membros face àquelas. (282) Entretanto, estas atitudes não poderão chegar a prejudicar a firme convicção de que somente na Igreja Católica se encontre a plenitude dos meios de salvação estabelecidos por Jesus Cristo. (283)

As conquistas do proselitismo das seitas e dos novos grupos religiosos na América não podem ser encaradas com indiferença. Exigem da Igreja neste Continente um profundo estudo, a ser realizado em cada nação e também a nível internacional, para se descobrir os motivos porque bastantes católicos abandonam a Igreja. É necessário fazer uma revisão dos métodos pastorais adotados, para que cada Igreja particular preste aos fiéis uma assistência religiosa mais personalizada, reforce as estruturas de comunhão e missão, e aproveite as possibilidades evangelizadoras que oferece uma religiosidade popular purificada, tornando assim mais viva a fé de todos os católicos em Jesus Cristo, através da oração e da meditação da Palavra de Deus oportunamente comentada. (284) Ninguém ignora a urgência de uma oportuna ação evangelizadora, naqueles setores do Povo de Deus mais expostos ao proselitismo das seitas: a faixa dos imigrados, os bairros periféricos das cidades ou das zonas do campo privadas de uma presença sistemática do sacerdote e, portanto, caracterizados por uma profunda ignorância religiosa, as famílias de pessoas simples que padecem todo o tipo de dificuldades materiais. Neste mesmo ponto de vista, revelam-se de grande utilidade, as comunidades de base, os movimentos, os grupos de famílias e outras formas associativas onde é mais fácil cultivar relações interpessoais de recíproco apoio espiritual e, inclusive, econômico.

Porém, é necessário ter sempre em conta o risco recordado por alguns Padres Sinodais: uma pastoral orientada quase exclusivamente para as necessidades materiais dos destinatários termina frustrando a fome de Deus destes povos, deixando-os assim numa situação vulnerável perante qualquer suposta oferta espiritual. Por isso, «é indispensável que todos se mantenham unidos a Cristo, por meio do anúncio querigmático jubiloso e visando a conversão, especialmente no caso da pregação na liturgia». (285) Uma Igreja que viva intensamente a dimensão espiritual e contemplativa, e que se dedique, com generosidade, a serviço da caridade, será testemunha de Deus sempre mais convincente para homens e mulheres em busca de um sentido para a própria vida. (286) Em vista disso, cresce sempre mais a necessidade que os fiéis passem de uma fé rotineira, sustentada talvez apenas pelo ambiente, a uma fé consciente, vivida pessoalmente. Renovar-se na fé será sempre o melhor caminho para conduzir todos à Verdade que é Cristo.

Para conseguir que seja eficaz a resposta ao desafio das seitas, requer-se uma adequada coordenação das iniciativas a nível supradiocesano, para se chegar a uma real cooperação através de projetos comuns que poderão dar maiores frutos. (287)

A missão ad gentes

74. Jesus Cristo confiou à sua Igreja a missão de evangelizar todas as nações: «Ide, pois, ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a observar tudo quanto vos tenho mandado» (Mt 28, 19-20). A consciência da universalidade da missão evangelizadora que a Igreja recebeu deve permanecer viva, como aliás o testemunha continuamente a história do Povo de Deus que peregrina na América. A evangelização torna-se mais urgente junto de todos aqueles que, vivendo neste Continente, ainda não conhecem o nome de Jesus, o único nome dado aos homens para se salvarem (cf. At 4, 12). Infelizmente, este nome é desconhecido por larga parte da humanidade e em muitos ambientes da sociedade americana. Basta pensar nas etnias indígenas ainda não cristianizadas ou na presença de religiões não cristãs tais como o Islamismo, o Budismo, o Induísmo, sobretudo entre os imigrantes vindos da Ásia.

Isto obriga a Igreja na América a permanecer disponível para a missão ad gentes. (288) O programa de uma nova evangelização no Continente, objetivo de muitos projetos pastorais, não pode limitar-se a revitalizar a fé dos crentes habituais, mas deve também procurar anunciar Cristo nos ambientes onde Ele é desconhecido.

Além disso, as Igrejas particulares da América são chamadas a estender este ímpeto evangelizador para além das fronteiras do seu Continente. Não podem reservar só para elas as riquezas imensas do seu patrimônio cristão. Devem levá-lo ao mundo inteiro e comunicá-lo a quantos ainda o ignoram. Trata-se de muitos milhões de homens e mulheres que, sem a fé, padecem da mais grave das pobrezas. Diante de tal pobreza, seria um erro deixar de promover a atividade evangelizadora fora do Continente com o pretexto de que ainda há muito para fazer na América, ou à espera de se chegar primeiro a uma situação, fundamentalmente utópica, de plena realização da Igreja na América.

Com votos de que o Continente americano, em sintonia com a sua vitalidade cristã, tome parte na grande tarefa da missão ad gentes, faço minhas as propostas concretas que os Padres Sinodais apresentaram: «apoiar uma maior cooperação entre as Igrejas irmãs; enviar missionários (sacerdotes, consagrados e fiéis leigos) para dentro e fora do Continente; revigorar ou criar Institutos missionários; favorecer a dimensão missionária da vida consagrada e contemplativa; dar maior impulso à animação, formação e organização missionária». (289) Estou certo de que o zelo pastoral dos Bispos e dos outros filhos da Igreja em toda a América conseguirá suscitar iniciativas concretas, inclusive a nível internacional, que levem a realizar com grande dinamismo e criatividade estes propósitos missionários.