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Exortação Apostólica Pós-Sinodal
ECCLESIA IN AFRICA

I. UM HISTÓRICO MOMENTO ECLESIAL

9. «Esta Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos é um acontecimento providencial pelo qual devemos dar graças e glorificar o Pai omnipotente e misericordioso, por seu Filho, no Espírito Santo».8 Foi com estas palavras, proferidas durante a primeira Congregação Geral, que os Padres abriram solenemente a discussão relativa ao tema do Sínodo. Já numa ocasião anterior, eu mesmo tinha expresso idêntica convicção, reconhecendo que «a Assembleia Especial é um acontecimento eclesial de primária grandeza para a África, um kairós, um momento de graça, no qual Deus manifesta a sua salvação. Toda a Igreja é convidada a viver plenamente este tempo de graça, a aceitar e difundir a Boa Nova. O esforço de preparação para o Sínodo irá beneficiar não apenas a própria celebração sinodal, mas redundará já agora em benefício das Igrejas locais que peregrinam em África, cuja fé e testemunho se reforçam, tornando-se elas cada vez mais maduras».9

Profissão de fé

10. Este momento de graça concretizou-se, antes de mais, numa solene profissão de fé. Congregados ao redor do Túmulo de Pedro para a inauguração da Assembleia Especial, os Padres do Sínodo proclamaram a sua fé, a fé de Pedro que, retorquindo à pergunta de Cristo «Também vós quereis retirar-vos?», respondeu: «Senhor, para quem havemos nós de ir? Tu tens palavras de vida eterna; e nós acreditamos e sabemos que és o Santo de Deus» (Jo 6,67-69). Os Bispos da África, na pessoa dos quais a Igreja Católica encontrava naqueles dias uma singular expressão junto do Túmulo do Apóstolo, reiteraram que criam firmemente que a omnipotência e a misericórdia do único Deus se manifestaram sobretudo na Encarnação redentora do Filho de Deus, Filho que é consubstancial ao Pai na unidade do Espírito Santo, e que, nesta unidade trinitária, recebe em plenitude glória e honra. Esta — afirmaram os Padres — é a nossa fé, esta é a fé da Igreja, esta é a fé de todas as Igrejas locais que, disseminadas pelo Continente Africano, caminham para a casa de Deus.

Esta fé em Jesus Cristo foi manifestada, de modo constante, forte e unânime, nas intervenções dos Padres do Sínodo ao longo de toda a Assembleia Especial. Com a força desta fé, os Bispos da África confiaram o seu Continente a Cristo Senhor, convictos de que só Ele, com o seu Evangelho e com a sua Igreja, pode salvar a África das dificuldades actuais e curá-la dos seus numerosos males.10

11. Ao mesmo tempo, por ocasião da abertura solene da Assembleia Especial, os Bispos da África proclamaram publicamente a sua fé na «única Igreja de Cristo, que no Credo confessamos ser una, santa, católica e apostólica».11 Estes atributos indicam traços essenciais da Igreja e da sua missão. E ela «não os confere a si mesma; é Cristo quem, pelo Espírito Santo, dá à sua Igreja ser una, santa, católica e apostólica, e é ainda Ele quem a chama a realizar cada uma destas qualidades».12

Todos aqueles que tiveram o privilégio de assistir à celebração da Assembleia Especial para a África, congratularam-se por ver que os católicos africanos estão a assumir cada vez maiores responsabilidades nas suas Igrejas locais e esforçam-se por compreender sempre melhor o que significa ser simultaneamente católico e africano. A celebração da Assembleia Especial manifestou ao mundo inteiro que, na comunhão eclesial, existem legitimamente as Igrejas locais da África, que têm o direito de conservar e desenvolver «tradições próprias, sem detrimento do primado da Cátedra de Pedro, que preside à universal assembleia da caridade, protege as legítimas diversidades e vigia para que as particularidades ajudem a unidade e de forma alguma a prejudiquem».13

Sínodo de ressurreição, Sínodo de esperança

12. Por singular desígnio da Providência, a solene inauguração da Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos teve lugar no segundo Domingo de Páscoa, isto é, na conclusão da Oitava de Páscoa. Os Padres Sinodais, naquele dia reunidos na Basílica Vaticana, estavam bem conscientes do facto de a alegria da sua Igreja brotar do mesmo acontecimento que tinha enchido de júbilo os corações dos Apóstolos no dia de Páscoa: a ressurreição do Senhor Jesus (cf. Lc 24,40-41). Estavam profundamente conscientes da presença do Senhor ressuscitado no seu meio, que lhes dizia como aos Apóstolos: «A paz esteja convosco» (Jo 20,21.26). Eles estavam conscientes da sua promessa de permanecer com a sua Igreja para sempre (cf. Mt 28,20), e, portanto, também durante a realização da Assembleia Sinodal. Este clima pascal em que a Assembleia Especial iniciou os seus trabalhos, com os membros unidos na celebração da sua fé em Cristo ressuscitado, espontaneamente trazia ao meu espírito as palavras dirigidas por Jesus ao apóstolo Tomé: «Bem-aventurados os que, sem terem visto, acreditam!» (Jo 20,29).

13. Foi, realmente, o Sínodo da ressurreição e da esperança, como declararam, com alegria e entusiasmo, os Padres Sinodais nas primeiras frases da sua Mensagem, dirigida ao Povo de Deus. São palavras que de bom grado faço minhas: «Como Maria Madalena na manhã da ressurreição, como os discípulos de Emaús com o coração ardente e a mente esclarecida, a Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos proclama: Cristo, nossa esperança, ressuscitou. Ele alcançou-nos, Ele caminhou connosco. Ele comentou-nos a Escritura; eis aqui o que Ele nos disse: "Eu sou o Primeiro e o Último, O que vive; Eu estava morto, mas eis-Me vivo pelos séculos, e Eu detenho as chaves da morte e da região dos mortos" (Ap 1,17-18). (...) E como S. João em Patmos, em tempos particularmente difíceis, recebeu profecias de esperança para o Povo de Deus, nós também anunciamos a esperança. Neste momento mesmo em que tantos ódios fratricidas, provocados por interesses políticos, dilaceram os nossos povos, no momento em que o peso da dívida internacional ou da desvalorização da moeda os oprimem, nós, Bispos da África, juntamente com todos os participantes neste Santo Sínodo, unidos ao Santo Padre e a todos os nossos Irmãos no Episcopado que nos elegeram, queremos pronunciar uma palavra de esperança e de conforto para ti, Família de Deus que estás em África; para ti, Família de Deus espalhada por todo o mundo: Cristo, nossa Esperança, está vivo, nós viveremos!».14

14. Exorto todo o Povo de Deus em África a acolher, com espírito confiante, a mensagem de esperança que lhes foi dirigida pela Assembleia Sinodal. Durante os seus debates, os Padres do Sínodo, plenamente conscientes de serem portadores das expectativas não só dos católicos africanos, mas de todos os homens e mulheres daquele Continente, afrontaram com clareza os inúmeros males que oprimem a África de hoje. Exploraram, em toda a sua complexidade e extensão, aquilo que a Igreja é chamada a realizar para favorecer a mudança desejada, mas fizeram-no numa atitude livre de pessimismos ou de desespero. Não obstante o panorama prevalentemente negativo que numerosas regiões da África apresentam hoje, e apesar das dolorosas experiências que não poucos países atravessam, a Igreja tem o dever de afirmar vigorosamente que é possível superar estas dificuldades. Ela deve fortalecer, em todos os Africanos, a esperança numa verdadeira libertação. A sua confiança está fundada, em última instância, na certeza da promessa divina que nos assegura que a nossa história não está fechada em si mesma, mas aberta ao Reino de Deus. Eis porque não se podem justificar o desespero nem o pessimismo, quando se pensa no futuro da África ou de qualquer outra parte do mundo.

Colegialidade afectiva e efectiva

15. Antes de entrar na explanação dos vários argumentos, queria pôr em relevo como o Sínodo dos Bispos constitui um instrumento verdadeiramente propício para favorecer a comunhão eclesial. Quando, quase no final do Concílio Vaticano II, o Papa Paulo VI, de veneranda memória, instituiu o Sínodo, indicou claramente que uma das suas finalidades essenciais haveria de ser a de exprimir e promover, sob a guia do Sucessor de Pedro, a comunhão recíproca dos Bispos dispersos pelo mundo.15 O princípio subjacente à instituição do Sínodo dos Bispos é simples: quanto mais firme for a comunhão dos Bispos entre si, tanto mais rica se revelará a comunhão da própria Igreja no seu conjunto. A Igreja em África é testemunha da verdade destas palavras, porque fez a experiência do entusiasmo e dos resultados concretos que acompanharam os preparativos da Assembleia do Sínodo dos Bispos a ela dedicada.

16. Por ocasião do meu primeiro encontro com o Conselho da Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos, que se reunira tendo em vista a Assembleia Especial para a África, indiquei a razão pela qual pareceu oportuno convocar esta Assembleia: a promoção de «uma orgânica solidariedade pastoral em todo o território africano e nas ilhas contíguas».16 Com esta expressão, pretendia abraçar os intuitos e objectivos principais para os quais se deveria orientar a dita Assembleia. Para esclarecer ainda melhor as minhas expectativas, acrescentei que as reflexões preparatórias da Assembleia deveriam abarcar «todos os aspectos importantes da vida da Igreja em África e, em particular, deveriam abranger a evangelização, a inculturação, o diálogo, a solicitude pastoral no campo social e os meios de comunicação social».17

17. Durante as minhas visitas pastorais a África, frequentemente me referi à Assembleia Especial e aos principais objectivos para que fora convocada. Quando tomei parte, pela primeira vez em terra africana, numa reunião do Conselho do Sínodo, não deixei de sublinhar a minha convicção de que uma Assembleia Sinodal não pode reduzir-se a uma consulta sobre argumentos práticos. A sua verdadeira razão de ser está no facto de a Igreja não poder crescer senão reforçando a comunhão entre os seus membros, a começar pelos seus Pastores.18

Cada Assembleia Sinodal manifesta e desenvolve a solidariedade entre os responsáveis das Igrejas particulares no cumprimento da sua missão para além dos confins das respectivas dioceses. Como ensinou o Concílio Vaticano II, «os Bispos, como legítimos sucessores dos Apóstolos e membros do colégio episcopal, considerem-se unidos sempre entre si e mostrem-se solícitos de todas as Igrejas, pois cada um, por instituição divina e por exigência do múnus apostólico, é responsável por toda a Igreja, juntamente com os outros Bispos».19

18. O tema que confiei à Assembleia Especial — «A Igreja em África e a sua missão evangelizadora rumo ao ano 2000: "Vós sereis minhas testemunhas" (Act 1,8)» — manifesta o meu desejo de que esta Igreja viva o tempo que falta até ao Grande Jubileu como um «novo Advento», tempo de expectativa e de preparação. De facto, considero a preparação para o ano 2000 como uma das chaves de interpretação do meu Pontificado.20

As Assembleias Sinodais que se sucederam neste arco de quase trinta anos — as Assembleias Gerais e as Especiais continentais, regionais ou nacionais — colocam-se todas nesta perspectiva de preparação do Grande Jubileu. O facto de a evangelização ser o tema de todas estas Assembleias Sinodais indica quão viva seja hoje na Igreja a consciência da missão salvífica recebida de Cristo. Esta tomada de consciência manifesta-se, com singular evidência, nas Exortações Apostólicas pós-sinodais dedicadas à evangelização, à catequese, à família, à penitência e à reconciliação na vida da Igreja e da humanidade inteira, à vocação e missão dos leigos, à formação dos presbíteros.

Em plena comunhão com a Igreja Universal

19. Desde o início da preparação da Assembleia Especial que tive bem vivo o desejo, plenamente compartilhado pelo Conselho da Secretaria Geral, de fazer com que este Sínodo fosse autêntica e inequivocamente africano. Mas, simultaneamente, era de importância fundamental que a Assembleia Especial fosse celebrada em plena comunhão com a Igreja Universal. E, de fa- cto, a Assembleia sempre teve em consideração a Igreja Universal. Reciprocamente, quando chegou o momento de publicar os Lineamenta, não deixei de convidar os meus Irmãos no Episcopado e todo o Povo de Deus, espalhado pelo mundo, a recordarem na oração a Assembleia Especial para a África e a sentirem-se implicados nas actividades promovidas em ordem a tal acontecimento.

Esta Assembleia, como frequentemente tive ocasião de afirmar, reveste uma notável importância para a Igreja Universal, não só por causa do interesse que a sua convocação suscitou por todo o lado, mas também pela natureza mesma da comunhão eclesial, que transcende qualquer fronteira de tempo e espaço. De facto, a Assembleia Especial inspirou muita oração e boas obras, pelas quais os fiéis e as comunidades da Igreja nos outros continentes acompanharam o desenrolar do Sínodo. E como duvidar de que, no mistério da comunhão eclesial, tenham vindo também em apoio dele as orações dos Santos no Céu?

Quando estabeleci que a primeira fase dos trabalhos da Assembleia Especial tivesse lugar em Roma, fi-lo para sublinhar mais eloquentemente ainda a comunhão que liga a Igreja que está em África à Igreja Universal, de modo a evidenciar o empenho de todos os fiéis a favor da África.

20. A solene concelebração eucarística de abertura do Sínodo, que presidi na Basílica de S. Pedro, pôs em relevo de modo maravilhoso e emocionante a universalidade da Igreja. Esta universalidade, « que não é uniformidade, mas comunhão de diferenças compatíveis com o Evangelho»,21 foi vivida por todos os Bispos. Todos eles, enquanto membros do corpo episcopal que sucede ao Colégio Apostólico, tinham consciência de terem sido consagrados não só em benefício duma diocese, mas para a salvação do mundo inteiro.22

Dou graças a Deus Todo-Poderoso pela ocasião que nos deu de experimentar, por meio da Assembleia Especial, o que comporta uma autêntica catolicidade. «Em virtude desta mesma catolicidade, cada uma das partes traz às outras e a toda a Igreja os seus dons particulares».23

Uma mensagem pertinente e credível

21. Segundo os Padres Sinodais, a questão principal que a Igreja em África deve enfrentar, consiste em descrever, com toda a clareza possível, aquilo que ela tem de ser e realizar em plenitude, para que a sua mensagem seja pertinente e credível.24 Todos os debates na Assembleia fizeram referência a esta exigência, verdadeiramente essencial e fundamental, um autêntico desafio para a Igreja em África.

É verdade, sem dúvida, «que o Espírito Santo é o agente principal de evangelização: é Ele que impele a anunciar o Evangelho, como é Ele que, no íntimo das consciências, leva a aceitar a Palavra da salvação».25 Mas, uma vez reafirmada esta verdade, a Assembleia Especial quis justamente acrescentar que a evangelização é também uma missão que o Senhor Jesus confiou à sua Igreja, sob a guia e a força do Espírito Santo. É necessária a nossa cooperação através da oração fervorosa, duma grande reflexão, de projectos adequados e da mobilização de todos os recursos.26

O debate sinodal sobre o tema da pertinência e credibilidade da mensagem da Igreja em África não podia deixar de implicar uma reflexão sobre a credibilidade dos próprios arautos dessa mensagem. Os Padres enfrentaram a questão de modo directo, com profunda sinceridade, sem qualquer indulgência. Disto se ocupara já o Papa Paulo VI que, com palavras memoráveis, recordara: «Ouve-se repetir, com frequência hoje em dia, que este nosso século tem sede de autenticidade. A propósito dos jovens, sobretudo, afirma-se que eles têm horror ao fictício, àquilo que é falso, e que procuram, acima de tudo, a verdade e a transparência. Estes sinais dos tempos deveriam encontrar-nos vigilantes. Tacitamente ou em altos brados, mas sempre com grande vigor, eles fazem-nos a pergunta: acreditais verdadeiramente naquilo que anunciais? Viveis aquilo em que acreditais? Pregais vós verdadeiramente aquilo que viveis? Mais do que nunca, portanto, o testemunho da vida tornou-se uma condição essencial para a eficácia profunda da pregação. Sob este ângulo, somos, até certo ponto, responsáveis pelo avanço do Evangelho que nós proclamamos».27

Eis porque, referindo-me à missão evangelizadora da Igreja no campo da justiça e da paz, afirmei: « A Igreja está consciente, hoje mais que nunca, de que a sua mensagem social encontrará credibilidade primeiro no testemunho das obras e só depois na sua coerência e lógica interna».28

22. Como não recordar, aqui, que já a oitava Assembleia Plenária do S.C.E.A.M., realizada em Lagos, na Nigéria, no ano 1987, tinha examinado, com notável clareza, a questão da credibilidade e pertinência da mensagem da Igreja em África?! A referida Assembleia declarara que a credibilidade da Igreja em África dependia de Bispos e sacerdotes capazes de dar testemunho de uma vida exemplar, seguindo as pegadas de Cristo; de religiosos realmente fiéis, autênticas testemunhas pelo seu modo de viver os conselhos evangélicos; de um laicado dinâmico, com pais profundamente crentes, educadores conscientes das suas responsabilidades, dirigentes políticos animados de profundo sentido moral.29

Família de Deus em caminho sinodal

23. No dia 23 de Junho de 1989, dirigindo-me aos membros do Conselho da Secretaria Geral, falei com grande insistência sobre a participação, na preparação da Assembleia Especial, de todo o Povo de Deus, a todos os níveis, especialmente em África. «Se for bem preparada — disse —, a Assembleia do Sínodo permitirá envolver todos os níveis da comunidade cristã: indivíduos, pequenas comunidades, paróquias, dioceses e organizações locais, nacionais e internacionais».30

Desde o início do meu Pontificado até à inauguração da Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos, pude efectuar dez visitas pastorais ao Continente Africano, abrangendo trinta e seis nações. Por ocasião das viagens apostólicas sucessivas à convocação da Assembleia Especial, os temas do Sínodo e da necessidade de todos os fiéis se prepararem para a Assembleia Sinodal sempre estiveram presentes, de forma saliente, nos meus encontros com o Povo de Deus em África. Vali-me também das visitas ad limina dos Bispos daquele Continente para solicitar a colaboração de todos na preparação da Assembleia Especial para a África. Além disso, em três diferentes ocasiões, realizei, junto com o Conselho da Secretaria Geral do Sínodo, sessões de trabalho em terra africana: em Yamoussoukro na Costa do Marfim (1990), na cidade de Luanda em Angola (1992), e em Kampala no Uganda (1993), sempre com o objectivo de convidar os Africanos a tomarem parte activa e unânime na preparação da Assembleia Sinodal.

24. A apresentação dos Lineamenta em Lomé, a 25 de Julho de 1990, por ocasião da nona Assembleia Geral do S.C.E.A.M., constituiu, sem dúvida, uma etapa nova e importante do caminho preparatório para a Assembleia Especial. Pode-se justamente afirmar que a publicação dos Lineamenta desencadeou decididamente os preparativos do Sínodo, em todas as Igrejas particulares da África. A Assembleia do S.C.E.A.M., em Lomé, adoptou uma Oração pela Assembleia Especial e pediu que fosse rezada, publica e privadamente, em todas as paróquias africanas até à celebração do Sínodo. Esta iniciativa do S.C.E.A.M. foi verdadeiramente feliz e não passou despercebida na Igreja Universal.

Em seguida, para favorecer a difusão dos Lineamenta, numerosas Conferências Episcopais e dioceses fizeram traduzir o documento nas suas línguas, como, por exemplo, em suaíle, árabe, malgaxe, e outras línguas. «Publicações, conferências e simpósios sobre os temas do Sínodo foram organizados por diversas Conferências Episcopais, Institutos de Teologia e Seminários, Associações de Institutos de Vida Consagrada, dioceses, alguns jornais e periódicos importantes, Bispos e teólogos».31

25. Elevo fervorosas acções de graças a Deus Omnipotente pelo cuidado singular com que foram redigidos os Lineamenta e o Instrumentum laboris 32 do Sínodo. Foi um trabalho afrontado e realizado por africanos, Bispos e peritos, a começar da Comissão Preliminar do Sínodo, nos meses de Janeiro a Março de 1989. A Comissão seria, depois, revezada pelo Conselho da Secretaria Geral da Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos, que fora por mim instituído a 20 de Junho de 1989.

Estou profundamente grato, ainda, ao grupo de trabalho que tão bem cuidou as liturgias eucarísticas de abertura e encerramento do Sínodo. Contando entre os seus membros, teólogos, liturgistas e peritos em cânticos e instrumentos africanos de expressão litúrgica, o grupo quis, como era desejo meu, fazer com que aquelas cerimónias fossem marcadas por nítido carácter africano.

26. Agora devo acrescentar que a resposta dos Africanos ao meu apelo a participarem na preparação do Sínodo foi verdadeiramente admirável. O acolhimento reservado aos Lineamenta, tanto dentro como fora das comunidades eclesiais africanas, superou largamente toda e qualquer previsão. Muitas Igrejas locais serviram-se dos Lineamenta para mobilizar os fiéis, e podemos, desde já, afirmar com certeza que os frutos do Sínodo começam a manifestar-se num novo compromisso e numa renovada tomada de consciência por parte dos cristãos da África.33

Ao longo das várias fases de preparação da Assembleia Especial, numerosos membros da Igreja em África — clero, religiosos, religiosas, leigos — inseriram-se de foram exemplar no itinerário sinodal, «caminhando juntos», pondo cada um os próprios talentos ao serviço da Igreja e rezando juntos fervorosamente pelo bom êxito do Sínodo. Mais de uma vez, os Padres do Sínodo assinalaram, ao longo da Assembleia Sinodal, que o seu trabalho fora facilitado precisamente pela «preparação solícita e minuciosa deste Sínodo, realizada com o envolvimento activo da Igreja em África, a todos os níveis».34

Deus quer salvar a África

27. O Apóstolo dos Gentios diz-nos que Deus «quer que todos os homens se salvem e conheçam a verdade. Porque há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo Homem, que Se deu em resgate por todos» (1 Tim 2,4-6). Uma vez que Deus chama todos os homens a um único e mesmo destino, que é divino, «devemos manter que o Espírito Santo a todos dá a possibilidade de se associarem a este mistério pascal por um modo só de Deus conhecido».35 O amor redentor de Deus abraça a humanidade inteira: toda a raça, tribo e nação; por conseguinte, abraça também as populações do Continente Africano. A Providência divina quis que a África estivesse presente, durante a Paixão de Cristo, na pessoa de Simão de Cirene, obrigado pelos soldados romanos a ajudar o Senhor a levar a Cruz (cf. Mc 15,21).

28. A liturgia do sexto Domingo de Páscoa de 1994, vivida na solene Celebração Eucarística da conclusão da Fase de Trabalho da Assembleia Especial, proporcionou-me a ocasião de desenvolver uma reflexão sobre o desígnio salvífico de Deus a respeito da África. Uma das leituras bíblicas, tirada dos Actos dos Apóstolos, evocava um acontecimento que pode ser considerado como o primeiro passo na missão da Igreja ao encontro dos pagãos: o relato da visita feita por Pedro, sob o impulso do Espírito Santo, à casa de um pagão, o centurião Cornélio. Até àquele momento, o Evangelho fora proclamado sobretudo aos hebreus. Depois de ter hesitado bastante, Pedro, iluminado pelo Espírito, decidiu ir à casa de um pagão. Chegado lá, teve a alegre surpresa de constatar o facto de que o centurião esperava Cristo e o Baptismo. O livro dos Actos dos Apóstolos assim o narra: «Os fiéis circuncisos que tinham vindo com Pedro, ficaram maravilhados ao verem que o dom do Espírito Santo fora derramado também sobre os pagãos, pois ouviam-nos falar em línguas e glorificar a Deus» (10,45-46).

Em casa de Cornélio, reproduziu-se de algum modo o milagre do Pentecostes. Pedro disse então: « Reconheço, na verdade, que Deus não faz acepção de pessoas, mas que qualquer nação que O teme e põe em prática a justiça, Lhe é agradável. (...) Poderá alguém recusar a água do Baptismo aos que receberam o Espírito Santo como nós?» (Act 10,34-35.47).

Começou assim a missão da Igreja ad gentes, da qual Paulo de Tarso se tornará o principal arauto. Os primeiros missionários chegados ao coração de África sentiram seguramente uma admiração semelhante à experimentada pelos cristãos dos tempos apostólicos, perante a efusão do Espírito Santo.

29. O desígnio que Deus tem de salvar a África, está na origem da difusão da Igreja neste Continente. Ora, sendo a Igreja, segundo a vontade de Cristo, por sua natureza missionária, segue- -se daí que a Igreja em África é chamada a assumir ela própria um papel activo ao serviço do projecto salvador de Deus. Por isso, disse que «a Igreja em África é Igreja missionária e em missão».36

A Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos teve a missão de examinar os meios pelos quais os Africanos poderão realizar melhor o mandato que o Senhor ressuscitado deu aos seus discípulos: «Ide, pois, ensinai todas as nações» (Mt 28,19).