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Carta Encíclica
DIVINO AFFLANTE SPIRITU

INTRODUÇÃO

Ocasião da Encíclica «Providentissimus Deus». Modo de celebrar o seu quinquagésimo aniversário.

Sob a inspiração do Espírito Santo compuseram os escritores sagrados aqueles livros que Deus, pelo seu paternal amor ao gênero humano, quis prodigalizar «para ensinar, para convencer, para corrigir, para instruir na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e apto para toda a obra boa» (1). Não é pois para admirar que a Santa Igreja, assim como recebeu incontaminado, das mãos dos Apóstolos, este tesouro concedido pelo céu, que ela considera preciosíssima fonte e norma divina da doutrina de fé e costumes, o tenha também guardado com cuidado especial, o defenda de toda a interpretação falsa e perversa, e o utilize solicitamente na missão de granjear às almas a salvação suprema, como o demonstram amplamente quase inumeráveis documentos de todas as épocas. Mas como nos tempos recentes se discutiu de modo especial a origem divina e a reta interpretação das Sagradas Letras, a Igreja propôs-se defendê-las e protegê-las com denodo e empenho ainda maiores. E assim, já o sacrossanto Concílio de Trento decretou solenemente que era preciso reconhecer «como sagrados e canônicos os livros íntegros, com todas as suas partes, na forma como se costumavam ler na Igreja Católica e se contêm na antiga edição Vulgata Latina» (2). E no nosso tempo o Concilio Vaticano, para reprovar as falsas teorias sobre a inspiração, declarou que estes mesmos livros os tinha de considerar a Igreja «como sagrados e canônicos», «não porque, compostos unicamente pela indústria humana, tenham sido depois aprovados pela sua autoridade, nem precisamente porque contenham a revelação sem erro, mas porque, escritos sob inspiração do Espírito Santo, têm por autor a Deus, e como tais foram entregues à Igreja» (3). E posteriormente ainda, como contra esta solene definição da doutrina católica, segundo a qual os livros «íntegros, como todas as suas partes», gozam da dita autoridade divina, que implica a imunidade de todo o erro, certos escritores católicos se atrevessem a circunscrever a verdade da Sagrada Escritura unicamente às coisas de fé e costumes, reputando as outras, quer de ordem física quer de ordem histórica, como «ditos acidentais» e - como eles pretendiam - sem conexão com a fé, o Nosso Predecessor Leão XIII, de imortal memória, na Carta Encíclica «Providentissimus Deus» de 18 de Novembro de 1893, feriu de morte, com plena razão, aqueles erros, e deu ao mesmo tempo sapientíssimos preceitos e normas para o estudo dos Livros Divinos.

Ao apresentar-se a conveniência de comemorar o 50º aniversário da publicação daquela Encíclica, considerada lei fundamental nos estudos bíblicos, pareceu-Nos da maior oportunidade, segundo a solicitude que desde o princípio do Nosso pontificado temos consagrado às disciplinas sagradas (4), confirmar e inculcar o que o Nosso Predecessor estabeleceu sabiamente e os seus sucessores contribuíram para consolidar e aperfeiçoar, e determinar o que os tempos presentes parecem requerer para incitar cada vez mais a uma coisa tão necessária e louvável, todos os filhos da Igreja que se dedicam a estes estudos.