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Um dos mais sérios problemas que hoje atingem os adolescentes e jovens é a
dependência química. Infelizmente este é um problema que está atingindo
todas as classes sociais de norte a sul do Brasil. Tenho encontrado inúmeras
famílias dilaceradas por causa da drogas. Não tenho dúvida de que a Cura
Interior é um dos grandes meios que o Espírito está nos concedendo para
ajudar aos dependentes e seus familiares. Nosso trabalho não pode se
restringir na oração pelos dependentes. Precisamos trabalhar também com as
feridas deixadas pela droga em todos os membros da família. O alcoolismo não
atinge somente aquele que é dependente. Toda família sofre as mais terríveis
conseqüências: vergonha, violência física e moral, crises financeiras,
brigas, discussões, desconfiança, medo, angústia, desavenças, falta de
diálogo, de carinho, de ternura etc. Todos esses problemas precisam ser
trabalhados pelo ministério da Cura Interior.
Além disso, é absolutamente necessário compreender um pouco o mundo das
drogas. Ouvindo, aconselhando e vivendo com essas pessoas, estamos
aprendendo muitas coisas importantes para esse ministério. Quero partilhar
um pouco de nossa experiência para ajudar a todos que são chamados a atender
essas vítimas e suas famílias.
Todo o processo de recuperação precisa ser centralizado na palavra, na ação
e na pessoa de Jesus Cristo. Procuramos seguir a pedagogia de Jesus e isto
significa que procuramos seguir Jesus Cristo como conteúdo e também como
método de todo o trabalho. Cristo liberta todas as prisões. Sua pedagogia
partia da vida e centralizava-se nela. Ele habitou entre nós, sentou-se com
os pecadores, marginalizados e desprotegidos, para levá-lo à libertação.
Todo o processo precisa ser humanizador e personificador. O centro do
processo é o ser humano em sua caminhada rumo ao Reino e instaurado por
Jesus Cristo.
O que mais empobrece o ser humano e o faz escravo de si mesmo, e por
conseguinte de todas as superfícies de drogas existentes, é o processo
despersonalizador da sociedade moderna, embasada na eficiência e na
eficácia, em detrimento dos valores humanos fundamentais: amor, amizade,
fraternidade, convivência, respeito, valorização do outro, diálogo,
solidariedade e justiça. Por isso trabalhamos a terapia em grupos.
O ser humano precisa assumir a construção de sua história. Responsável por
si mesmo, a pessoa é também responsável pelo mundo. Essa responsabilidade
pela vida e pela sua história se enraíza na liberdade e se evidencia no
trabalho.
Além da terapia em grupos e da laboraterapia (trabalho), evidenciamos a
espiritualidade, procurando favorecer uma vida de íntima comunhão com Deus.
Sabemos que o vício da drogas é uma da grandes pedagogias do Inimigo para
destruir a juventude e a família. Olhando para e a realidade do fechamento
humano em si mesmo e para as profundas e terríveis conseqüências disso
(drogas, prostituição, doenças, fome, miséria, opressão etc.), percebemos o
mistério da iniqüidade. O ser humano pecador por si só é incapaz de
recuperar-se.
Ao seguir a pedagogia de Jesus procuramos evidenciar que a luta contra as
drogas é uma luta contra o maligno. Acima de tufo, buscamos reproduzir em
nossos relacionamentos tudo aquilo que foi vivido e experienciado por Jesus
de Nazaré. Ele sempre ensinou a partir dos acontecimentos. Por isso, em
Bethânia procuramos transformar cada acontecimento (positivo ou negativo)
num momento de encontro pessoal com Deus e numa grande oportunidade de
crescimento pessoal e comunitário.
Outros dado marcante da pedagogia de Jesus cristo é a sua profunda
coerência. Há uma identidade entre o que ele faz, diz e é. Em Bethânia
buscamos testemunhar mais do que ensinar; ser mais do que fazer; amar mais
do que falar! Nosso jeito de falar, de agir e de tratar cada um,
especialmente nos momentos mais difíceis, falam muito mais do que nosso
discurso. Por isso é preciso tratar cada um como de fato é: o próprio
Cristo.
Jesus vai ao encontro daqueles que a sociedade marginalizar. Ele está
rodeado desse marginalizados, amando-os e ajudando-os em seu processo de
libertação. A libertação do Reino acontece na vida dessas pessoas a partir
do encontro com Jesus: cura, perdão, milagres e libertação da marginalização
são sinais de que o Reino já está acontecendo. Por isso, em Bethânia,
procuramos dar uma atenção maior aos que se encontram desanimados e
machucados. Devemos Ter coragem de traduzir em gestos concretos a
misericórdia infinita de Deus para conosco. Por isso mesmo devemos lembrar
sempre de três princípios fundamentais da vida nosso Recanto: acolher cada
um com um sorriso; traduzir esta acolhida no abraço carinhoso e freqüente; e
não discutir NUNCA!
Outro aspecto fundamental da pedagogia de Jesus é a não massificação. Ele
sempre tem uma maneira específica e progressiva de chegar às pessoas, afinal
sabemos que é injustiça tratar de modo igual quem é diferente. Jesus parece
querer chegar a cada um a partir da realidade e percepção que esse ser tem
de seu caminho. Em Bethânia, procuramos olhar cada um a partir de sua
história. Não massificar é dar a cada um a oportunidade de tornar-se aquilo
para o que Deus o chamou. Por isso precisamos priorizar sempre mais a
prática do diálogo, da valorização do outro e do respeito pela dignidade da
pessoa humana. O diálogo exige considerar o outro igual ou superior nós
mesmos. Devemos evitar menosprezar o outro. Nunca gritar e nunca usar de
nenhuma forma de violência. É preciso acreditar no amor. Não podemos jamais
reproduzir para com nossos filhos o que a sociedade produz: violência,
discussão, o poder do mais forte, o domínio do outro, o aniquilamento de
qualquer possibilidade de crescimento. Este é um dos nossos grandes e
permanentes desafios.
Durante o dia são reservados três momentos específicos de oração
comunitária: Louvor da Manhã (com adoração ao Santíssimo Sacramento); Oração
do Terço e Oração da Noite. Além disso, antes do almoço e do jantar
reservamos um tempo para a oração do Ângelus. Todas as semanas celebramos a
Eucaristia e periodicamente temos o nosso Retiro Espiritual.
Temos uma especial atenção quanto à formação religiosa de nosso filhos,
especialmente no tocante à possibilidade da celebração periódica do
sacramento da reconciliação, bem como a preparação para a recepção dos
sacramentos do batismo e primeira Eucaristia.
Para um melhor acompanhamento personalizado de cada um de nossos filhos, a
comunidade está dividida em Grupos de Trabalho e de Vivência, tendo ca da
grupo um dos consagrados como responsáveis. Os consagrados são jovens que
deixam tudo e hoje vivem no Recanto. Vivem da providência de Deus e procuram
ser canais de amor para nossos filhos. Cabe ao consagrado promover reuniões
periódicas de avaliação com os membros de seu grupo, bem como reservar
diariamente um tempo mínimo de quinze minutos para diálogo pessoal com cada
um.
Em Bethânia procuramos tratar cada um como verdadeiro filho. Nunca vamos
curá-los. Nunca pensamos que vamos curá-los. Este é um processo que deve ser
assumido pessoalmente; somos colaboradores no processo. Para isso oferecemos
nossa amizade, nossas orações e uma oportunidade organizada de cada um se
ajudar. Não existem curas rápidas para dependência química. É preciso ajudar
cada dependente a descobrir um sentido para sua vida. E para que esta ajuda
se efetive é necessário amar cada um e ser compreensivo com suas
necessidades e imperfeições.
Não há um tempo fixo de permanência no Recanto. Cada caso precisa ser
avaliado individualmente. A recuperação depende do grau de dependência e da
força de vontade da pessoa em seu processo de libertação. O jovem precisa se
convencer de que nunca estará curado para poder fazer uso das drogas. Não é
como se tivéssemos quebrado uma perna e pudéssemos voltar a andar depois que
estivesse curada. Com a droga não existe convivência amigável, nunca! Por
isso mesmo evitamos os remédios químicos, bem como toda alimentação que
possa contribuir para conservar as drogas e seus efeitos no organismo. A
convivência na comunidade ajuda a pessoa a viver sem as drogas, a acreditar
na força do Espírito Santo, a se acostumar com uma alimentação correta, com
horários, com o trabalho etc.
Para ajudar nossos filhos na libertação de todas as dependências é
necessário motivá-los sempre para a coragem, a determinação, a sinceridade e
o esforço. É fundamental falar e testemunhar a importância da alegria, do
companheirismo e da amizade. Dois grandes obstáculos para a libertação são a
desonestidade e a mentira. O drogado está acostumado a mentir, a fingir, a
negar e a inventar desculpas para justificar seu comportamento e suas
atitudes erradas. Devemos ajudá-lo na busca de uma vida serena, sincera e
honesta diante de Deus, da família, da comunidade e, acima de tudo, diante
dele próprio.
Por fim, é absolutamente fundamental educar para a liberdade verdadeira.
Somente aceitamos adolescentes e jovens que manifestem, sob nenhuma forma de
pressão, o desejo de fazer parte da comunidade, a verdadeira liberdade é
fruto da verdade. Por isso procuramos vivê-la no amor. Acima de tudo nunca
podemos nos esquecer: é Deus quem opera em nós o querer e o fazer segundo
seu desígnio benevolente (cf. Fl 2,13).
O atendimento e o trabalho coma s vítimas das drogas é muito penoso e
necessário. Não tenha medo de pedir às luzes do Espírito Santo para que o
inspirem sempre sobre o que falar e o que fazer nesses momentos. Procure
ouvir a história de cada um e transforme cada experiência importante numa
oração de Cura Interior. É muito importante a oração de harmonização. É
fundamental também a oração com os familiares dos dependentes. Partilhe
amor! Partilhe Deus! Ele está sempre do nosso lado nessa grande luta.