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UNINDO NOSSOS CORAÇÕES A CRISTO
A Reforma Litúrgica Hoje

Autor: pe. James P. Moroney
Fonte: Revista "LayWitness" - nov./2000
Tradução: Sandra Katzman

A publicação recente da terceira edição do Missale Romanum e a esperada publicação do Missal Romano e Lecionário da Missa para as dioceses dos Estados Unidos fornece aos bispos, liturgistas, e na verdade a todos os fiéis seguidores de Cristo a oportunidade de parar e refletir na reforma litúrgica que ocasionou estes livros litúrgicos.

Vou refletir brevemente em alguns dos sucessos da reforma litúrgica para que possamos continuar este trabalho nobre, reconhecendo nossa falibilidade e mais uma vez abraçando os desafios colocados diante de nós pelos pais do Concílio Vaticano II.

As palavras de abertura do primeiro documento conciliar, Sacrosanctum Concilium, sobre a Sagrada Liturgia, oferecem quatro objetivos para o Concilio e para a reforma liturgica:

  1. Fomentar sempre mais a vida cristã entre os fiéis (Vigor)

  2. Acomodar melhor às necessidades de nossa época (Adaptação)

  3. Favorecer tudo o que possa contribuir para a união dos que crêem em Cristo (Unidade)

  4. Promover tudo o que conduz ao chamamento de todos ao seio da Igreja (Fortalecimento)

Vigor, mudança, unidade e fortalecimento formam uma agenda ambiciosa, que só agora começamos a entender. Olhemos cada um desses pontos.

  • Vigor: Quando era criança, eu sabia que vigor era algo que pertencia ao jovens, como as palavras do salmista que eu tinha acabado de aprender no pé do altar: "Ad Deum qui laetificat iuventutem meam".

    Por todo o criticismo que possa ser devido ao liturgistas, deve-se admitir que nós nos dispomos, naqueles anos pós-conciliares, semear vigor com abandono. Com um entusiasmo absoluto pela liturgia e seu poder, nós procuramos trazer uma energia vital e explosiva para a liturgia de uma maneira algumas vezes indiferenciada, mas sempre de coração.

    Estávamos inspirados pelos pais do Concílio que nos disseram que a meta a ser considerada antes de tudo na reforma litúrgica era a participação ativa, completa e consciente de todos na liturgia. A reforma conciliar estava baseada numa visão de liturgia como "o cume para o qual tende a ação da Igreja ... a fonte d'onde emana toda sua força" (Sacrosanctum Concilium, 10).

    Assim, nós com segurança destacamos, nas palavras do Institutio Generalis Missalis Romani, que "toda a celebração seja planejada de tal forma a dar início a participação dos fiéis em corpo e espírito consciente, ativo, completo, e motivado pela fé, esperança e caridade." (nº 18).

    Por quase 40 anos temos refletido no significado de "completo, consciente e ativo" mas raramente temos refletido no significado de "participação" na declaração do Concílio. A princípio, o significado de tal palavra parece evidente. Entretanto, existe uma nuance importante desta palavra que com frequência falhamos em reconhecer.

    Quando faço algum trabalho sozinho, eu digo "meu trabalho". Participar significa que eu me uno à obra de Cristo. A liturgia não é a obra da comunidade de minha paróquia, ou até mesmo só da Igreja. É a obra de Cristo, a cujo perfeito sacrifício de louvor (sacrificum laudis) nos unimos pela graça do batismo.

    Tal perspectiva pode ajudar a contextualizar nossos sucessos e falhas em planejar e celebrar a sagrada liturgia. Nossa meta não é cantar bem por causa de nossa música, mas cantar tão bem que nossos corações e mentes, e nossa própria vida, se unam ao perfeito ato de adoração divina de Cristo. Cada gesto, palavra, e nota de louvor têm só um objetivo: nos inflamar com o amor insistente de Cristo (cf. Sacrosanctum Concilium, 10).

  • Adaptação: O segundo objetivo que os pais do Concílio colocaram para a reforma litúrgica era adaptar a celebração da liturgia às necessidades de nossa época.

    Como foi bem recebido este mandato pelos americanos, que abraçaram a acessibilidade como um direito inato! Contudo, com bastante frequência, acessiblidade na América é entendida como não tendo limites.

    Com a liturgia - participação total tem sido interpretada como significando que eu devo "controlar" tudo; participação consciente como que eu 'saiba' tudo, e participação ativa significando que eu devo 'fazer' tudo.

    Com muita frequência, temos passado muito tempo adaptando a liturgia ao nosso próprio uso, que esquecemos que o verdadeiro trabalho a ser feito é nos adaptarmos e adaptarmos nossa cultura à ação litúrgica de Cristo! A liturgia é designada para este propósito.

  • Unidade: O terceiro objetivo do Concílio era unidade. As maravilhosas manifestações de unidade provocadas pelos diálogos ecumênicos e inter-religiosos das décadas passadas são incríveis primeiros passos no cumprimento da oração do Senhor de que todos sejam um: ut unum sint!

    Porém, ao mesmo tempo, a desunião que temos testemunhado dentro de nossa própria Igreja, especialmente em questões litúrgicas, tem com frequência sido motivo de escândalo para outros.

    Somos chamados à uma visão de unidade. A visão que diz que nada é importante exceto Cristo. Uma visão que é humilde. Uma visão que se ajoelha diante da Igreja e promete obediência e respeito verdadeiros. Uma visão que vê o bispo e o sacerdócio como o lócus de tal unidade. Recorde as palavras do Sacrosanctum Concilium, 41: "O Bispo deve ser tido como o sumo sacerdote de sua grei, da qual, de algum modo, deriva e depende a vida de seus fiéis em Cristo. Por isso faz-se mister que todos, particularmente na catedral, dêem máxima importância à vida litúrgica da diocese em redor do bispo; persuadidos de que a principal manifestação da Igreja se realiza na plena e ativa participação de todo o povo santo de Deus nas mesmas celebrações litúrgicas, sobretudo na mesma Eucaristia, numa única oração, junto a um só altar, presidido pelo Bispo, cercado de seu presbitério e ministros".

    Esta é a mesma visão de uma Igreja unida a Cristo em louvor que Sto. Inácio de Antioquia pregou nos dias dos mártires: "Vocês não devem assumir nada sem o bispo e os sacerdotes. Não tentem persuadir-se de que o que vocês fazem por si sós é correto e próprio, mas quando se reunirem deve haver uma petição, uma oração, uma mente, uma esperança em amor e em regojizo santo, pois Jesus Cristo é o único e perfeito diante de tudo o mais".

    Esta é um visão que ouve as palavras de Cristo nos lábios agonizantes de um papa e da caneta de outro: ut unum sint! Que todos sejam um!

    A mesma Igreja que evangelizou os gauleses e converteu os francos, que falou das mais profundas esperanças dos peregrinos da Ibéria e dos monges irlandeses - o mesmo rito é nossa herança e nossa alegria - um rito que nós devemos orgulhosamente viver e celebrar, e cuidar com carinho.

  • Força: Finalmente, os pais do Concílio nos chamaram a sermos fortes, para que todo o mundo possa nos ver e desejar abraçar a Igreja de Cristo.

    É dificil ser forte o bastante para admitir que somos fracos. É duplamente difícil admitir nossos erros. Quanta energia e tempo temos desperdiçado evitando perguntas legítimas, tudo porque elas foram feitas pelas pessoas erradas?

    Nós não devemos ter medo de admitir nos erros insensatos, nossos excessos, nossas insensibilidades, nosso egoísmo, ou nosso pecado. Pois nós, como a Igreja, somos totalmente dependentes da misericórdia gratuita de Cristo para nossa salvação.

    Os liturgistas, sobretudo, devem liderar o caminho da unidade servindo a Igreja como aqueles que são rápidos para se arrependerem e lentos para julgar, com os quais a negociação é um instinto e a compaixão e hospitalidade uma forma de vida. Que eles venham e nos digam: Sim, eu sei a diferença entre um liturgista e um terrorista: "Um liturgista é forte - forte o suficiente para ouvir!".

    Tal era a visão dos pais do Concílio quando eles abriram o caminho para a reforma litúrgica. É uma visão que, como disse o Papa João Paulo II, tem produzido os frutos mais visíveis do Concílio. Ao mesmo tempo, como cada uma de nossas tentativas de nos ajustarmos a Cristo, é uma obra inacabada.

    É, no final, uma visão tão antiga quanto do Evangelho e tão nova como a missa de hoje de manhã. É uma visão eterna dos pais do Concílio: "Na Liturgia terrena, antegozando, participamos da Liturgia celeste, que se celebra na cidade santa de Jerusalem, para a qual, peregrinos, nos encaminhamos. Lá, Cristo está sentado à direita de Deus, ministro do santuário e do tabernáculo verdadeiro; com toda a milícia do exército celestial entoamos um hino de glória ao Senhor, e venerando a memória dos Santos, esperamos fazer parte da sociedade deles; suspiramos pelo Salvador, Nosso Senhor Jesus Cristo, até que Ele, nossa vida, Se manifeste, e nós apareçamos com Ele na gloria" (Sacrosanctum Concilium, 8).


  • Fr. James P, Moroney é o diretor executivo para a Secretaria de Liturgia em Washington, DC.