»» Artigos Diversos

CARTA A UM ANTI-CATÓLICO*
Autor: Gary Hoge
Fonte: Site "A Protestant's Guide to the Catholic Church"
Tradução: Carlos Martins Nabeto

Prezado dr. DeVries,

Li sua página na Internet e senti a necessidade de respondê-la. Eu era um Protestante evangélico (Batista) e converti-me ao Catolicismo; assim, dentro do espírito da caridade cristã, venho dizer-lhe que o senhor não possui real compreensão da Igreja Católica ou das doutrinas que esta ensina. Nenhuma das sete diferenças apontadas pelo senhor entre o Catolicismo e os "Cristãos da Bíblia" reflete os reais ensinamentos da Igreja Católica. O que o senhor atacou não é a Igreja Católica como ela realmente é, mas uma caricatura dela. Provarei isso citando as relevantes seções do Catecismo da Igreja Católica (CIC), que é um escrito de autoridade.

1. OS CATÓLICOS PREGAM UM EVANGELHO FALSO

O senhor escreveu que a Bíblia ensina que fomos salvos pela graça através da fé e não pelas obras, mas que o Catolicismo nega isso. Isso é falso. Conforme a Igreja Católica, "a justificação nos foi merecida pela paixão de Cristo, que se ofereceu na cruz como hóstia viva, santa e agradável a Deus, e cujo sangue se tornou instrumento de propiciação pelos pecados de toda a humanidade... Nossa justificação vem da graça de Deus... Esta vocação para a vida eterna é sobrenatural. Depende integralmente da iniciativa gratuita de Deus, pois apenas ele pode se revelar e dar-se a si mesmo... Ninguém pode merecer a graça primeira, na origem da conversão, do perdão e da justificação" (CIC 1992, 1998, 2010). O Concílio de Trento, reunido em resposta a Reforma Protestante, declarou o mesmo: "também se diz que somos salvos pela graça pois nenhuma das coisas que precedem à salvação, seja a fé ou sejam as obras, merece a graça da salvação porque se é graça, não provém das obras, ou como diz o Apóstolo, a graça não seria graça" (Decreto sobre a Justificação, de 13.01.1547, [cap. VIII]).

2. OS CATÓLICOS CRÊEM NA SALVAÇÃO ANTERIOR AO ARREPENDIMENTO

O senhor declara que a Bíblia está em "firme oposição à doutrina da regeneração pelo Batismo". Como, então, o senhor explica o fato de que esta doutrina é ensinada não apenas pela Igreja Católica, mas também pelas Igrejas Ortodoxas Orientais e também pela maioria das [Igrejas] Protestantes? Se a sua doutrina é conforme o Evangelho, como o senhor explica o fato de que ninguém acreditava nela antes da Reforma? Acaso o senhor já leu os escritos dos primeiros cristãos? Seus escritos, mais que quaisquer outros, convenceram-me que a Igreja primitiva era Católica, e não Protestante. Entre outras coisas, eles são bem enfáticos na crença de "um só Batismo para a remissão dos pecados" (Credo de Nicéia). Porém, esta doutrina não é tão má quanto o senhor pensa. No caso de adultos, o arrependimento é sempre necessário para que o seu Batismo seja lícito. E se algum pecador não-arrependido for ilicitamente batizado, a Igreja Católica ensina que ele não receberá os frutos do Batismo (regeneração e remissão dos pecados). Não há remissão [dos pecados] sem arrependimento, nem mesmo na Igreja Católica. "Não existe ninguém, por mau ou culpado que seja, que não deva esperar com segurança o seu perdão, desde que o seu arrependimento seja sincero" (CIC 982).

Posso perguntar o que o senhor pensa que acontece com as crianças que morrem antes de atingirem a idade da razão? Em minha igreja Batista era comum dizer que todas essas crianças seriam salvas porque Jesus disse que o Reino dos Céus a elas pertencia (cf. Mat. 19,14). Portanto, embora digamos que a fé e o arrependimento são necessários para os adultos, sentimos que Deus faz abre uma exceção no caso das crianças. A Igreja Católica (e quase todas as demais igrejas também) admitem essa mesma exceção; logo, não consigo compreender a base de sua objeção para essa prática. Lembre-se também que a Igreja Católica, bem como as Igrejas Ortodoxas Orientais e muitas Igrejas Protestantes, crêem que é possível perder a salvação [depois do Batismo]. Desta forma, se uma criança batizada cresce, se transforma num pecador e não se arrepende [dos seus pecados], certamente não será salvo. Deus não pode ser ridicularizado, nem pode ser "manipulado" para conceder a salvação para um pecador não-arrependido.

3. OS CATÓLICOS DEPRECIAM NOSSO SENHOR JESUS CRISTO

O senhor parece estar dizendo aqui que, em razão de existir "um só Deus e mediador entre Deus e os homens, o homem Cristo Jesus", ninguém mais poderia servir como mediador entre Deus e o homem, nem mesmo em sentido secundário. Assim sendo, permita-me formular esta questão: o senhor intercede a Deus em benefício de seus irmãos e irmãs? O senhor pede a estes para que intercedam pelo senhor? Em caso positivo, não estaria o senhor agindo como mediador entre eles e Deus? E não estariam eles agindo como mediadores entre o senhor e Deus? Obviamente que sim! A oração intercessória, na qual um cristão se põe perante Deus em benefício de outro(s), é a melhor definição de "mediador". Verifique bem os versículos imediatamente precedentes àquele que o senhor citou: "Exorto, pois, antes de tudo, que se façam súplicas, intercessões e ações de graças por todos os homens, pelos reis, e por todos os que exercem autoridade, para que tenhamos uma vida tranqüila e sossegada, em toda piedade e honestidade. Pois isto é bom e agradável diante de Deus nosso Salvador, o qual deseja que todos os homens se salvem, e venham ao conhecimento da verdade" (1Tim. 2,1-4). Deus ordena que todos nós, cristãos, sejamos mediadores. Por quê? Porque "há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus homem" (1Tim. 2,5). Jesus é o único mediador da Nova Aliaça; assim, nossa mediação em benefício dos nossos irmãos e irmãs depende inteiramente da dele.

Ao dizer que "toda vez que a Missa é realizada, eles (=os católicos) cerimonialmente recrucificam nosso Salvador", o senhor cai num erro comum, mas elementar: este não é o ensinamento da Igreja Católica. Ao contrário, a Igreja ensina que "Cristo, nosso Deus e Senhor, ofereceu-se a si mesmo a Deus Pai uma vez por todas, morrendo como intercessor sobre o altar da cruz, a fim de realizar por eles (os homens) uma redenção eterna. Todavia, como a sua morte não devia pôr fim ao seu sacerdócio [Heb. 7,24.27], na Última Ceia, 'na noite em que foi entregue' [1Cor 11,13], quis deixar à Igreja, sua esposa muito amada, um sacrifício visível (como o reclama a natureza humana) em que seria re-presentado (feito presente) o sacrifício cruento que ia realizar-se uma vez por todas uma única vez na cruz, sacrifício este cuja memória haveria de perpetuar-se até ao fim dos séculos [1Cor 11,23]" (CIC 1366). Portanto, Cristo não é cerimonialmente recrucificado na Missa; Ele foi crucificado uma vez por todas no Calvário.

Também a sua charge de que realizamos um "canibalismo religioso" se volta contra o senhor, já que me encoraja a recordá-lo que no segundo século os pagãos fizeram essa mesma acusação contra a Igreja primitiva. Tertuliano e Minúcio Félix dedicaram muitas de suas obras para refutar essa charge do "canibalismo". Isto demonstra que a Igreja primitiva, possuindo a memória viva dos Apóstolos, também acreditava na transubstanciação, como poderia o senhor saber se lesse essas obras. Darei ao senhor um exemplo, livre de qualquer charge: assim escreveu Inácio de Antioquia: "Observem aqueles que têm opiniões heterodoxas sobre a graça de Jesus Cristo que veio até nós e notem como suas opiniões são contrárias à mentalidade de Deus... Eles se abstêm da Eucaristia e da oração porque não confessam que a Eucaristia é a carne de Nosso Salvador Jesus Cristo, carne esta que sofreu pelos nossos pecados e que, pela bondade do Pai, foi novamente erguida. Eles, que negam o dom de Deus, estão perecendo em suas próprias disputas" (Epístola aos Romanos; 110 dC). Inácio foi discípulo pessoal de João, o "discípulo que Jesus amava". Ele aprendeu sobre a Eucaristia diretamente da boca do homem que disse que Jesus afirmara "a minha carne é verdadeiramente comida e o meu sangue é verdadeiramente bebida" (Jo. 6,55). O senhor realmente acha que João (e os demais apóstolos) eram mestres incompetentes de maneira a não serem capazes de explicar algo tão simples quanto uma Ceia memorial simbólica? Talvez sim, porque a interpretação simbólica que o senhor advoga nunca foi ensinada a não ser mais de mil anos depois de Cristo (já que foi Berengério de Tours, falecido em 1088 dC, o primeiro cristão conhecido a defender tal entendimento).

4. OS CATÓLICOS IGUALAM O PAPA A DEUS

Esta afirmação certamente causaria grande surpresa ao Papa! A Igreja Católica ensina que ninguém é igual a Deus. Ao contrário, a Igreja ensina que "a fé cristã é diferente da fé em uma pessoa humana. É justo e bom entregar-se totalmente a Deus e crer absolutamente o que Ele diz. Seria vão e falso colocar tal fé em uma criatura" (CIC 150). Para declarar que o Papa não tem pecados, temo que o senhor tenha confundido "infalibilidade" (ausência de erro) com "impecabilidade" (ausência de pecado). O Papa é um pecador salvo pela graça, como o senhor e eu também somos. Certamente ele não é uma pessoa sem pecados, e a Igreja também não afirma isso. Com efeito, existiu um pequeno número de Papas (durante a Renascença) que estava tão ocupada com luxúria que mal tinham tempo a dedicar para a Igreja! Atualmente somos abençoados por ter um Papa muito bom e de moral irrepreensível, mas a teologia católica não garante que todo aquele que vem a ser eleito Papa também o seja.

Por outro lado, o conceito de infalibilidade não significa que tudo aquilo que o Papa diz seja Palavra de Deus. A maioria dos pronunciamentos dos Papas são tão falíveis quanto os seus e os meus. Contudo, a Igreja crê que quando o Papa, em sua capacidade oficial, faz uma declaração a respeito de fé ou moral, obrigando toda a Igreja, o Espírito Santo o previne de ensinar qualquer erro. Tais declarações, porém, são extremamente raras; a maioria dos Papas jamais fez esse tipo de declaração. Além disso, o Papa está atado ao ensino dos 2000 anos anteriores da Igreja (o que inclui o que está escrito na Bíblia); ele não pode ir em sentido contrário. Nenhum papa jamais contradisse a Palavra de Deus escrita. Jamais.

5. OS CATÓLICOS ADORAM ÍDOLOS

Isto é ridículo. Os católicos adoram o Deus Uno e Trino (Pai e Filho e Espírito Santo) e somente Ele. O senhor parece não conhecer a diferença entre "adoração" e "veneração". Os católicos veneram (guardam respeito) as imagens de Jesus, por exemplo, exatamente da mesma forma quanto uma pessoa patriota venera (guarda respeito) a bandeira de seu país. A bandeira é tão somente um pedaço de pano colorido, mas nós a veneramos por aquilo que ela representa. Do mesmo modo, uma imagem de Jesus é apenas gesso e tinta, mas nós a veneramos por causa Daquele a quem ela representa. Um católico não "adora" mais a imagem de Jesus do que um cidadão "adora" a bandeira de seu país.

6. A IGREJA CATÓLICA ESCRAVIZA E É HOMICIDA

O senhor disse: "A Igreja Católica sempre desencorajou seus membros de ler a Bíblia". De onde o senhor tirou essa idéia? Ao contrário, a Igreja Católica sempre encorajou a leitura da Bíblia:

Finalmente, o Catecismo da Igreja Católica declara: "A Igreja 'exorta com veemência e de modo peculiar todos os fiéis cristãos... a que, pela freqüente leitura das divinas Escrituras, aprendam «a eminente ciência de Jesus Cristo» [Fil. 3,8]. «Porquanto ignorar as Escrituras é ignorar Cristo»' [S. Jerônimo]" (CIC 133).

O senhor ainda escreveu: "Durante a Idade das Trevas, a Igreja Católica derramou o sangue de aproximadamente 68 milhões de Batistas, na tentativa de evitar que a Bíblia fosse posta nas mãos das pessoas comuns". De onde o senhor retira tais fatos? Primeiro, não havia Batistas na Idade das Trevas, já que a denominação Batista não existia antes de sua fundação em Amsterdã, em 1607. Como pode, então, o senhor alegar que a Igreja Católica assassinou 68 milhões (?!) de supostos Batistas? Que evidências teria o senhor para suportar tão selvagem acusação? O senhor acusou a Igreja Católica de genocídio e crimes contra a humanidade! Espero que, por amor a si mesmo, consiga o senhor provar tamanha calúnia, pois Deus certamente pedirá satisfações a respeito.

7. O CATOLICISMO NEGA A INSPIRAÇÃO E A AUTORIDADE DA BÍBLIA

Que dureza, hein! Eis o que a Igreja Católica realmente ensina sobre a "inspiração e autoridade da Escritura: "Os livros inspirados ensinam a verdade. 'Portanto, já que tudo o que os autores inspirados ou os hagiógrafos afirmam, deve ser tido como afirmado pelo Espírito Santo, deve-se professar que os livros da Escritura ensinam com certeza, fielmente e sem erro a verdade que Deus em vista da nossa salvação quis fosse consignada nas Sagradas Escrituras'" (CIC 107).

O senhor escreveu: "Em 300 dC, nossos antepassados Batistas decidiram viver nas cavernas ao invés de submeter suas igrejas a Roma". Com todo o respeito, senhor, sua compreensão de História da Igreja é pura fantasia. O primeiro Batista não viu a luz do dia até 1307 anos depois de 300 dC! Estou seguro de que o senhor não é capaz de mostrar a continuação histórica de sua denominação até os tempos de Cristo, simplesmente pelo fato de que não tem como fazê-lo. A igreja Batista só existia antes de 1607 na sua imaginação. Quem são estes supostos Batistas dos tempos primitivos? Quais eram os seus nomes? Onde estão os seus escritos? Por favor, não me diga que a Igreja Católica destruiu seus escritos e suprimiu toda memória deles (se isto fosse verdade, como o senhor ficou sabendo disso?). Os escritos dos antigos hereges (Arianos, Monofisitas, Nestorianos, Docetistas etc.) chegaram até nossos dias. Poderia o senhor afirmar que a Igreja Católica sumiu apenas com os escritos desses míticos Batistas primitivos e permitiu que os escritos de todos os outros hereges sobrevivessem até nós? Talvez seja este o pensamento desejado, mas é pura fantasia.

Finalmente, o senhor escreve: "Eu poderia escrever um livro inteiro explicando que o Catolicismo não é cristão". Eu aposto como o senhor realmente pode, mas tão somente porque os seus "fatos" não têm base na realidade. O que o senhor faz é criar um espantalho, uma caricatura da Igreja Católica, preenchido com doutrinas ridículas que a Igreja realmente não ensina. É lógico que esse seu espantalho não pode ser considerado cristão, da mesma forma como também não é o Catolicismo. Eu o convido, senhor, a aprender o que a Igreja Católica diz de suas próprias doutrinas e, então, tente o senhor provar que estas doutrinas não são realmente cristãs. Eu mesmo tentei fazê-lo e não consegui; essa é a razão porque abandonei o Protestantismo. Descobri que não apenas as doutrinas católicas estavam em harmonia com a Bíblia, como também essas doutrinas eram as mesmas da primitiva Igreja, como está evidenciado nos escritos das pessoas que pertenciam à Igreja primitiva.

Suponho que o senhor, de boa-fé, está tentando conduzir as pessoas àquilo que o senhor acha que é verdade; que Deus o abençoe para isso. Quanto a mim, fico pedindo a Deus para que Ele o conduza à Verdade plena do Cristianismo bíblico, a qual só pode ser encontrada na Igreja Católica. Que Deus o abençoe!


*Resposta ao Site "Estamos Sendo Conduzidos a Roma?" do dr. Ed DeVries.