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Com a data de 6/08/83, a S. Congregação para a Doutrina da Fé publicou uma Carta dirigida aos Bispos e, por meio destes, aos presbíteros e aos fiéis, a propósito do ministério do sacrificio eucarístico; segundo novas correntes teológicas e pastorais, o sacramento do Batismo mesmo capacitaria o cristão, em determinadas circunstâncias, a celebrar validamente a Eucaristia, convertendo o pão e o vinho em Corpo e Sangue do Senhor Jesus.
Dada a importância de tal documento, publicaremos, a seguir, o seu texto, ao qual se seguirá breve comentário. Logo de inicio, faz-se mister observar que o problema não versa sobre a distribuição da S. Eucaristia por parte de leigos (como inadequadamente anunciou a imprensa), mas, sim, a pretensa consagração do pão e do vinho por leigos para que se tomem o corpo e o sangue de Cristo.
» A - O TEXTO
1. Introdução
1. Quando o Concílio Vaticano II ensinou que o sacerdócio ministerial ou
hierárquico difere essencialmente, e não apenas em grau, do sacerdócio
comum dos fiéis, exprimiu a certeza de fé de que somente os Bispos e os
Presbíteros podem realizar o Ministério eucarístico. Com efeito, embora
todos os fiéis participem do único e idêntico Sacerdócio do Cristo e
concorram para a oblação da Eucaristia, só o Sacerdote ministerial está
habilitado, em virtude do sacramento da Ordem, para realizar o Sacrifício
eucarístico in persona Cristi (personificando Cristo) e para oferecer
em nome de todo o Povo cristão.
2. Nos últimos anos, porém, começaram a ser difundidas e, por vezes, a ser
postas em prática opiniões que, negando estes ensinamentos, ferem no mais
íntimo a vida da Igreja. Tais opiniões, divulgadas sob formas e com
argumentos diversos, começam a aliciar os simples fiéis, quer pelo fato de
se afirmar que elas possuem uma certa base científica, quer pelo fato de se
apresentarem como solução para as necessidades do serviço pastoral das
comunidades cristãs e da sua vida sacramental.
3. Por isso, esta Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, movida pelo
desejo de prestar aos Pastores de almas os próprios serviços, com espírito
de afeto colegial, propõe-se chamar a atenção, com a presente Carta, para
alguns pontos essenciais da doutrina da Igreja acerca do Ministro da
Eucaristia, os quais têm vindo a ser transmitidos pela Tradição viva e a
ser expressos em precedentes documentos do Magistério. Supondo aqui a
visão integral do ministério sacerdotal, como é apresentada pelo Concílio
Vaticano II, a Congregação considera urgente, na situação atual, uma
intervenção esclarecedora sobre esta função essencial e peculiar do
Sacerdote.
2. Opiniões errôneas
1. Os fautores das novas opiniões afirmam que toda e qualquer comunidade cristã,
pelo fato de se reunir em nome de Cristo e, portanto, de se beneficiar da
sua presença (cf. Mt 18,20), estaria dotada de todos os poderes que o
Senhor quis conceder à sua Igreja.
Opinam ainda que a Igreja é apostólica no sentido de que todos aqueles que
pelo santo Batismo foram purificados e nela incorporados e tornados participantes
do múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, seriam também realmente
sucessores dos Apóstolos. E, uma vez que nos mesmos Apóstolos está prefigurada
toda a Igreja, seguir-se-ia daí que também as palavras da instituição da
Eucaristia a eles dirigidas, seriam destinadas a todos.
2. Daqui se seguiria igualmente que, por muito necessário que seja para a
boa ordem da Igreja o ministério dos Bispos e dos Presbíteros, ele não se
diferenciaria do sacerdócio comum por um motivo de participação do
Sacerdócio de Cristo no sentido estrito, mas somente em razão do exercício.
0 chamado ofício de dirigir a comunidade - o qual inclui também o múnus de
pregar e de presidir à sagrada 'Sinaxe' - seria um simples mandato conferido
tendo em vista o bom funcionamento da mesma comunidade, mas não deveria ser
'sacralizado'. 0 chamamento a tal ministério não acrescentaria uma nova capacidade
'sacerdotal' no sentido estrito - e é por isso que a maior parte das vezes
se evita até o termo 'sacerdócio' - nem imprimiria um caráter que constitua
alguém ontologicamente na condição de ministro, mas tão somente expressaria
diante da comunidade que a capacidade inicial conferida no sacramento do
Batismo se torna efetiva.
3. Em virtude da apostolicidade de cada comunidade local, em que Cristo
estaria presente não menos do que na estrutura episcopal, qualquer
comunidade, por mais pequena que seja, se viesse a encontrar-se privada
durante muito tempo daquele seu elemento constitutivo que é a Eucaristia,
teria a possibilidade de respropriar-se do seu poder originário e
teria o direito de designar o próprio presidente e animador, outorgando-lhe
todas as faculdades necessárias para ele passar a ser o guia da mesma
comunidade, sem excluir a de presidir e de consagrar a Eucaristia. Ou então
- afirma-se ainda - o próprio Deus não se recusaria a conceder, em
semelhantes circunstâncias, mesmo sem o Sacramento, o poder que normalmente
concede mediante a Ordenação sacramental.
Leva também à mesma conclusão o fato de que a celebração da Eucaristia muitas
vezes é entendida simplesmente como um ato da comunidade local reunida para
comemorar a última Ceia do Senhor mediante a fração do pão. Seria, por
conseguinte, mais um convívio fraterno, no qual a comunidade se reúne e se
exprime, do que a renovação sacramental do Sacrifício de Cristo, cuja
eficácia salvífica se estende a todos os homens, presentes e ausentes,
vivos e defuntos.
4. Por outro lado, em algumas regiões as opiniões errôneas sobre a
necessidade de Ministros ordenados para a celebração da Eucaristia,
induziram alguns a atribuir cada vez menor valor à catequese sobre os
sacramentos da Ordem e da Eucaristia.
3. A doutrina da Igreja
1. Embora sejam propostas de formas bastante diversas e matizadas, as
referidas opiniões convergem todas na mesma conclusão: que o poder de
realizar o sacramento da Eucaristia não está necessariamente ligado com a
Ordenação sacramental. E é evidente que esta conclusão não pode coadunar-se
de maneira nenhuma com a fé transmitida, dado que não só nega o poder
confiado aos Sacerdotes, mas também deprecia toda a estrutura apostólica
da Igreja e deforma a própria economia sacramental da Salvação.
2. Segundo o ensino da Igreja, a Palavra do Senhor e a Vida divina por Ele
proporcionada estão destinadas, desde o princípio, a ser vividas e
participadas num único corpo, que o próprio Senhor para si edifica ao longo
dos séculos. Este corpo, que é a Igreja de Cristo, dotado continuamente por
Ele com os dons dos ministérios, 'bem alimentado e bem coeso por meio de
junturas e de ligamentos, recebe o desenvolvimento desejado por Deus'
(Col. 2,19). Esta estrutura ministerial na sagrada Tradição concretiza-se
nos poderes outorgados aos Apóstolos e aos seus sucessores, de santificar,
de ensinar e de governar em nome de Cristo.
A apostolicidade da Igreja não significa que todos os fiéis sejam
Apóstolos, nem sequer de um modo coletivo; e nenhuma comunidade tem o
poder de conferir o ministério apostólico que fundamentalmente é outorgado
pelo próprio Senhor. Quando a Igreja se professa apostólica nos Símbolos da
fé, portanto, exprime, além da identidade doutrinal do seu ensino com o
ensino dos Apóstolos, a realidade da continuação do múnus dos Apóstolos
mediante a estrutura da sucessão, por meio da qual a missão apostólica deverá
perdurar até o fim dos séculos.
Esta sucessão dos Apóstolos que faz com que toda a Igreja seja apostólica,
constitui parte da Tradicão viva, que foi, desde o princípio, e continua a
ser para a mesma Igreja a sua forma de vida. Por isso, afastam-se do reto
caminho aqueles que opõem a esta Tradição viva algumas partes isoladas da
Escritura, das quais pretendem deduzir o direito a outras estruturas.
3. A Igreja Católica, que cresceu no decorrer dos séculos e continua a
crescer pela vida que lhe doou o Senhor com a efusão do Espírito Santo,
manteve sempre a sua estrutura apostólica, sendo fiei à tradição dos
Apóstolos, que nela vive e perdura. Ao impor as mãos aos eleitos com a
invocação do Espírito Santo, ela está cônscia de administrar o poder do
Senhor, o qual torna participantes de modo peculiar os Bispos, sucessores dos
Apóstolos, da sua tríplice missão sacerdotal, profética e real. E os Bispos,
por sua vez, conferem, em grau diferente, o ofício do seu ministério a
diversos outros na Igreja.
Portanto, ainda que todos os batizados possuam a mesma dignidade diante de
Deus, na comunidade cristã, que o seu divino Fundador quis hierarquicamente
estruturada, existem desde os seus primórdios poderes apostólicos específicos,
que dimanam do sacramento da Ordem.
4. Entre estes poderes, que Cristo confiou de maneira exclusiva aos
Apóstolos e aos seus sucessores, figura o de realizar a Eucaristia. Somente
aos Bispos e aos Presbíteros, a quem os mesmos Bispos tornaram participantes
do próprio ministério, está reservada a faculdade para renovar no
Ministério eucarístico aquilo mesmo que Cristo fez na última Ceia.
A fim de poderem exercer as próprias funções, especialmente a tão
importante função de realizar o Ministério eucarístico, Cristo Senhor marca
espiritualmente aqueles que chama ao Episcopado e ao Presbiterado com um
sigilo, chamado também, em documentos solenes do Magistério, 'caráter', e
configura-os de tal modo consigo próprio que, ao pronunciarem as palavras
da consagração, não agem por mandato da comunidade, mas sim 'in persona Christi',
o que quer dizer algo mais do que 'em nome de Cristo' ou 'fazendo as vezes
de Cristo', dado que o celebrante, por uma razão sacramental particular,
se identifica com o 'sumo e eterno Sacerdote', que é o autor e o principal
Agente do seu próprio Sacrifício, no que não pode na realidade ser substituído
por ninguém.
Uma vez que faz parte da própria natureza da Igreja que o poder de
consagrar a Eucaristia seja outorgado somente aos Bispos e aos Presbíteros,
os quais são constituídos Ministros para isso, mediante a recepção do sacramento
da Ordem, a mesma Igreja professa que o Ministério eucarístico não pode ser
celebrado em nenhuma comunidade a não ser por um Sacerdote ordenado,
conforme ensinou expressamente o Concílio Ecumênico Lateranense IV.
A cada um dos fiéis ou às comunidades que por motivo de perseguição ou por
falta de Sacerdotes se vejam privadas do celebração da Sagrada Eucaristia,
durante breve tempo ou mesmo durante um período longo, não faltará, de
alguma maneira, a graça do Redentor. Se estiverem animados intimamente pelo
voto do Sacramento e, unidos no oração com toda a Igreja, invocarem o
Senhor e elevarem para Ele os próprios corações, tais fiéis e comunidades vivem,
por virtude do Espírito Santo, em comunhão com a Igreja, corpo vivo de
Cristo, e com o mesmo Senhor. Mediante o voto do Sacramento em união com a
Igreja, ainda que estejam muito afastados externamente, estão unidos a ela
íntima e realmente e, por isso, recebem os frutos do Sacramento; ao passo
que aqueles que procuram atribuir-se indevidamente o direito de realizar o
Ministério eucarístico, acabam por fechar em si mesma a própria comunidade.
A consciência disto não dispensa, contudo, os Bispos, os Sacerdotes e todos
os membros da Igreja do dever de pedir ao 'Senhor da messe que mande
trabalhadores' segundo as necessidades dos homens e dos tempos
(cf. Mt 9,37ss), e de se aplicarem com todas as forças para que seja ouvida
e acolhida, com humildade e generosidade, a vocação do Senhor ao Sacerdócio
ministerial.
4. Exortação à vigilância
Ao propor à atenção dos Pastores sagrados da Igreja estes pontos, a Sagrada
Congregação para a Doutrina da Fé tem o desejo de prestar-lhes um serviço
no seu ministério de apascentar a grei do Senhor com o alimento da verdade,
de guardar o depósito da fé e de conservar íntegra a unidade da Igreja. É
necessário resistir, firmes na fé, ao erro, mesmo quando este se apresenta sob
as aparências de piedade, para poder abraçar com a caridade do Senhor os que
erram, professando a verdade na caridade (cf. Ef 4,15). Os fiéis que
atentam a celebração da Eucaristia à margem do vínculo da sucessão
apostólica, estabelecido com o sacramento da Ordem, excluem-se a si mesmos
da participação na unidade do único corpo do Senhor e, por conseqüência não
nutrem nem edificam a comunidade, mas destroem-na.
Incumbe, pois, aos Pastores de almas o múnus de vigiar, para que na
catequese e no ensino da Teologia não continuem a ser difundidas as opiniões
errôneas acima mencionadas e especialmente para que elas não encontrem
aplicação concreta na prática; e, se porventura se dessem casos do gênero,
incumbe-lhes o sagrado dever de os denunciar como totalmente estranhos à
celebração do Sacrifício eucarístico e ofensivos da comunhão eclesial. E
têm o mesmo dever em relação àqueles que diminuem a importância central dos sacramentos
da Ordem e do Eucaristia para a Igreja. Também a eles, efetivamente, são
dirigidas estas palavras: 'Prega a palavra, insiste tempo e fora de
tempo, confuta, exorta com toda a longanimidade e desejo de instruir...
Vigia atentamente, resiste à provação, prega o Evangelho e cumpre o teu
ministério' (2 Tim 4,2-5).
Que a solicitude colegial encontre, pois, nestas circunstâncias, uma
aplicação concreta, de modo que a Igreja, mantendo-se indivisa, mesmo dada
a sua variedade de Igrejas locais que colaboram conjuntamente, guarde o
depósito que lhe foi confiado por Deus através dos Apóstolos. A fidelidade à
vontade de Cristo e a dignidade cristã exigem que a fé transmitida permaneça
a mesma e assim proporcione a todos os fiéis a paz na fé (cf. Rom 15,13).
0 Sumo Pontífice João Paulo II, em Audiência concedida ao abaixo-assinado
Cardeal Prefeito, aprovou a presente Carta decidida na reunião ordinária desta
S. Congregação e ordenou a sua publicação.
Roma, da Sede da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, aos 6 dias do
mês de agosto, Festa da Transfiguração do Senhor do ano de 1983.
Joseph Card. Ratzinger
d. fr. Jérôme Hamer, O.P.
» B - COMENTÁRIO
Como se vê, o texto da Santa Sé compreende quatro partes:
Examinemos sumariamente o problema e a respectiva resposta da Igreja.
1. 0 problema
Em sua última ceia, celebrada tão somente com os doze apóstolos, Jesus
consagrou o pão e o vinho e transmitiu aos Apóstolos a ordem de repetir o
que Ele tinha feito "em memória de Mim (Jesus)"; cf. Lc 22,19;
lCor 11,23-25. 0 Senhor, desta maneira, instituiu a Eucaristia, que,
segundo entendeu a Tradição cristã desde as suas origens, é a perpetuação
do sacrifício da Cruz; é uma re-presentação (no sentido etimológico de
tornar de novo presente) do sacrifício do Calvário, para que a Igreja, isto
é, os fiéis, sob a presidência de um ministro devidamente ordenado (como os
Apóstolos o foram), possam tomar parte desse sacrifício ou desse ato de
entrega de Cristo ao Pai. No Calvário, Jesus se ofereceu, a sós, ao Pai;
na Eucaristia, Ele se oferece com a sua Igreja.
Em todos os tempos, a Igreja entendeu que a celebração da Eucaristia é
função própria dos Apóstolos e dos ministros que, pelo sacramento da Ordem,
participam especialmente do sacerdócio de Cristo. Aliás, Jesus na última cela
só tinha os Apóstolos como convivas e só a eles deu a ordem de repetir o
seu gesto.
Nos últimos anos, porém, tem-se espalhado a concepção de que também os
leigos, não ordenados presbíteros, podem confeccionar a Eucaristia. Esta
tese é fundamentada pelos seus arautos em razões teológicas assim concebidas:
Dentro da literatura teológica do Brasil, encontra-se um espécimen representativo
das concepções em pauta. Tenha-se em vista a obra "Eclesiogênese" de Frei
Leonardo Boff OFM.
Neste livro, o autor considera algumas Questões Disputadas, entre as quais
"0 Leigo e o Poder de celebrar a Ceia do Senhor" (ef. pp. 73-81, Ed.
Vozes, Petrópolis 1977).
Que poderá e talvez também deverá dizer a teologia? ... As CEBs caminham
para uma legítima autonomia e uma expressão sacramental cada vez mais
completa. A recepção do sacramento eucarístico, onde se expressa e se cria
a unidade da comunidade, é de direito divino. Pode um direito eclesiástico
obstaculizá-la?" (ob. cit. pp. 73s).
Então a comunidade em função disto tudo:
Talvez não se devesse chamar a isso de missa, pois missa é uma categoria
bem definida, teologicamente. Melhor faríamos denominá-la de celebração da
Ceia do Senhor. Não se deveria reproduzir o rito litúrgico da santa missa,
que tem seu contexto litúrgico, histórico e oficial estabelecido. Mas
dever-se-ia preferir um rito organizado pela comunidade, nascendo de sua
capacidade criadora, dentro do qual houvesse a celebração da Ceia do
Senhor" (pp. 79s).
Em suma, os dizeres até aqui propostos habilitam o leitor perceber
vivamente a problemática que a S. Congregação para a Doutrina da Fé houve
por bem considerar em sua Carta de agosto pp. Por conseguinte, pergunta-se:
Já aos 15/02/1975, a S. Congregação para a Doutrina da Fé teve que censurar
a opinião do teólogo suíço Hans Küng (posteriormente destituído do título
de mestre da doutrina católica) nos seguintes termos:
Neste sentido a teologia professa que a santissima humanidade de Cristo é
o sacramento primordial, pois em Cristo-homem estava depositada a vida do
próprio Deus, que transparecia e se comunicava através das palavras e dos
gestos do Senhor Jesus.
Em segunda instância, a Igreja é Sacramento, ou seja, uma realidade sensível,
de face humana, que é portadora e comunicadora da graça divina. Por ela
passa a vida que vem do Pai, se derrama na humanidade de Cristo e se
destina finalmente a cada um dos homens mediante ulteriores sacramentos que
são o Batismo, a Crisma, a Eucaristia, a Reconciliação, a Unção dos
Enfermos, a Ordem e o Matrimônio.
É tal fluxo da vida divina procedente do Pai para atingir cada cristão que
o gráfico anexo esquematiza [...]: nele se vê a ordem sacramental, ou seja,
a - grande realidade sacramental que compreende a humanidade de Cristo, o
corpo de Cristo prolongado que é a Igreja, e os sete ritos ditos
"sacramentos" em sentido mais estrito. Se, pois, a Igreja é um sacramento,
verifica-se que as funções e os ministérios não têm sua fonte nos homens ou
no "povo de Deus", mas no próprio Deus. As três pessoas da SS. Trindade,
querendo doar-se aos homens, seguem a lei da "encarnação", isto é, vão
utilizando elementos sensíveis e humanos para chegar a todos os homens. É
por isto que não se pode equiparar a Igreja a uma democracia; nem é lícito
tender a transformar a Igreja em tal forma de convívio humano, pois isto
equivaleria a destruir a Igreja ou a fazer dela um aglomerado de pessoas
bem intencionadas... e mais nada.
De quanto foi dito, depreende-se que, se uma comunidade resolve designar um
de seus membros para consagrar a Eucaristia, não pode dizer que está em
comunhão com a Igreja universal, pois, precisamente ao proceder assim, tal
comunidade rompe com a doutrina e a praxe da Igreja universal.
Como se vê, o texto de Mt 18,20 é citado pelo Concílio, texto que também as
novas teorias evocam. Todavia o Concílio não deduz dessa presença de
Cristo numa comunidade orante a conclusão de que todos os membros dessa
comunidade possuem indistintamente o mesmo grau de participação do sacerdócio de
Cristo. Ao contrário, a diversidade de participação do sacerdócio de Cristo
é realçada quando o texto conciliar se refere particularmente ao ministro da
celebração eucarística.
Na verdade, a habilitação para consagrar o pão e o vinho eucaristicos não
é uma questão de autorização ou de direito apenas (como o pregar em alguma
igreja pode depender de autorização do Bispo local); com efeito, não é uma
questão jurídica, mas é questão ontológica. Questão de ser ou não ser
inserido adequadamente no sacerdócio de Cristo.
Por isto não se pode dizer que a Igreja, com seu direito eclesiástico, se
torna obstáculo ao exercício de direitos conferidos aos fiéis por Deus. 0
assunto em pauta transcende à esfera discutível do direito, pois pertence ao
plano ontológico.
Em sua parte final, a Carta da Santa Sé mostra que a atitude da Igreja, no
caso, é um serviço... "serviço de apascentar a grei do Senhor com o
alimento da verdade e de conservar íntegra a unidade da Igreja". Quem
inova em 'coisas essenciais na Igreja, não edifica a comunidade, mas
destrói a sua face humana'. Na verdade, não é possível alguém unir-se
ao Corpo de Cristo por uma pretensa celebração da Eucaristia, se dilacera o
Corpo do Senhor que é a Igreja.
Por conseguinte, incumbe aos Pastores o grave dever de vigiar para que não
se difundam as errôneas idéias denunciadas na Carta, nem sejam aplicadas
na prática das comunidades católicas. Toca-lhes também o dever de cuidar
para que na catequese sejam congruamente valorizados os sacramentos da
Ordem e da Eucaristia. É o Apóstolo quem exorta: "Prega a palavra,
insiste a tempo e fora de tempo, confuta, exorta com toda a longanimidade e
o desejo de instruir. Vigia atentamente, resiste a provação, prega o
Evangelho e cumpre o teu ministério" (2Tm 4,2-5).
Com estas palavras, o Apóstolo incute uma missão que, sem dúvida, é árdua,
mas se torna inevitável ao bom pastor, que pode chegar a ter que dar a vida
por suas ovelhas.
5. Reflexão final
As novas teses impugnadas pela S. Congregação para a Doutrina da Fé têm
importância a mais de um título:
Em última análise, elas se devem a duas fontes de inspiração:
Em última análise, é a visão de fé que parece ressentir-se de oscilações em
nossos dias, acarretando as dolorosas conseqüências apontadas no documento
em pauta. Exorta o Senhor no Apocalipse:
Prefeito
Arcebispo tit. de Lonum
Secretário
2. Um espécimen brasileiro
3. Que diz a Igreja?
"Evidentemente toda comunidade organizada terá seus ministros
consagrados. Mas que fará uma comunidade, que sem culpa e por longo tempo
se vê privada do mistério eucarístico, sacramento de unidade e de
salvação? As CEBs mostram que o leigo pode fazer tudo o que, pastoralmente,
um sacerdote faz. Apenas não pode consagrar e perdoar os pecados. '0 povo
pergunta: por que nós não podemos celebrar a Eucaristia?' (Mesters, C.,
'0 futuro de nosso passado', em Uma Igreja que nasce do povo, op.
cit., 137). Sabemos da existência de grupos nos quais o chefe da
comunidade, por delegação dela ad hoc, unido à Igreja universal,
preside à ceia do Senhor. Que valor possui tal gesto? Diz-nos um relatório dos
EUA: 'Porque eles procuram novos ministérios, os católicos comunitários não
se sentem completamente ligados ao passado. Eles sabem que é o Senhor que
renova tudo pela sua própria Palavra (Ap 21,5). Se o grupo acha que deve
se reunir para o partir do pão, nem sempre se preocupa em ter um
sacerdote; eles fazem o que têm que fazer. E, se forem perguntados se o que
eles fizeram era sacramento ou missa, provavelmente responderão que não
sabem. Tomarão isso como uma pergunta teológica e deixarão assim aos teólogos
dizerem o que é que eles fizeram. Em todo caso, eles não se sentem
compelidos a fazer nenhuma reivindicação nesse sentido' (R. Westley,
'Comunidades de base nos Estados Unidos', em Concilium 104, 18).
"Cremos possuir dados teológicos suficientemente assegurados para
avançar a seguinte hipótese:
0 texto transcrito suscita várias interrogações, entre as quais a de saber
qual a diferença entre Missa e Cela do Senhor, no entender de Frei
Leonardo. A fé sempre ensinou que a Ceia do Senhor celebrada na quinta-feira
santa foi a primeira Missa da história, que Jesus mandou repetir através
dos séculos. A fé também ensina que o sacrifício da Cruz é feito presente
sobre os altares dentro da moldura de uma ceia, pois Jesus se serviu do
ritual de uma ceia para entregar aos Apóstolos o sacrifício do seu corpo e
do seu sangue.
"A opinião, insinuada pelo Prof. Küng no livro Die Kirche, segundo a
qual a Eucaristia, pelo menos em caso de necessidade, pode ser consagrada validamente
por pessoas batizadas carentes da Ordem sacerdotal, não pode estar de
acordo com a doutrina dos Concílios do Latrão IV e do Vaticano II" (cf.
SEDOC 7,1975, 1236).
De novo, em 1983 a S. Congregação para a Doutrina da Fé volta ao assunto,
lembrando os seguintes pontos:
4. Vigilância
Donde se vê que, dentro da diversidade de funções existente na Igreja, o
ministério do presbítero e o do Bispo têm significado próprio, que não pode
ser reduzido ao do serviço de outros fiéis.
"Cristo está sempre presente em sua Igreja, sobretudo nas ações
litúrgicas. Presente está no sacrifício da Missa, tanto na pessoa do
ministro, pois aquele que agora oferece pelo ministério dos sacerdotes é o
mesmo que outrora se ofereceu na cruz, quanto sobretudo sob as espécies eucarísticas.
Presente está pela sua força nos sacramentos, de tal forma, que, quando
alguém batiza, é Cristo mesmo quem batiza. Presente está pela sua
palavra, pois é Ele mesmo, que fala quando se lêem as Sagradas Escrituras na
Igreja. Está presente finalmente quando a Igreja ora e salmodia, Ele que
prometeu: 'Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, aí estarei no
meio deles' (Mt 18,20).
Em síntese, diz-nos o Concilio que Cristo se faz presente:
É claro que estas formas de resolver o problema não dispensam os Bispos, os
sacerdotes e os fiéis de rezar para que se multipliquem as vocações
sacerdotais, e de contribuir com seus esforços para que o chamado do
Senhor nos corações de jovens e adultos encontre os meios necessários para
chegar à plena realização.
"Cânon 910 - § 1º Ministro ordinário da Sagrada Comunhão é o Bispo, o
presbítero e o diácono.
Eis o teor do Canon 230, § 3º mencionado:
§ 2º Ministro extraordinário da Sagrado Comunhão é o acólito ou outro fiel
designado de acordo com o cân. 230, § 3º".
"Onde a necessidade da Igreja o aconselhar, podem também os leigos, na
falta de ministros, mesmo não sendo leitores ou acólitos, suprir alguns de
seus ofícios, a saber, exercer o ministério da palavra, presidir às
orações litúrgicas, administrar o batismo e distribuir a Sagrada Comunhão,
de acordo com as prescrições do Direito"
Observam os comentadores que este último Canon não reserva os referidos
ministérios aos homens apenas, mas, falando de leigos (laici)
compreende tanto homens como mulheres.
0 Concilio do Vaticano II respondeu às tendências democráticas do nosso
tempo, utilizando a imagem de Povo de Deus para designar a Igreja. Tal
imagem lembra a igualdade fundamental de todos os cristãos, baseada nos
sacramentos do Batismo e da Crisma; todavia não exclui que, sobre a mesma
base comum, se sobreponham vocações particulares incutidas pelo próprio
Deus para a edificação do Corpo de Cristo; assim o próprio Sumo Pontífice,
pelo fato de ser batizado, é um cristão como os demais, mas, por ter sido
chamado por Deus a especial forma de pastoreio ou de construção da Igreja,
distingue-se dos demais homens, não por arrogância pessoal, mas por servir fiel
e humildemente a Deus e aos irmãos dentro do seu ministério próprio. Veja-se
a Constituição Lumen Gentium, que apresenta no capitulo II a imagem do Povo
de Deus; a seguir, explana as vocações particulares, que são a da
hierarquia (c. III), a dos leigos (c. IV), a dos Religiosos (c. VI). O novo
Código de Direito Canônico seguiu o mesmo esquema.
"Guarda o que tens, para que ninguém arrebate a tua coroa" (Ap 3,19).