A g n u s D e i
"SERÁ MESMO CRISTÃO O CATOLICISMO ROMANO?"
Autor: d. Estevão Tavares Bettencourt
Fonte: Revista "Pergunte e Responderemos" nº 452
Em Síntese: Eis mais um livro de origem protestante que visa a atacar
a Igreja Católica de maneira sectária ou preconceituosa, com distorção da
verdade. O artigo abaixo se detém sobre alguns tópicos das objeções levantadas
e mostra a sua inconsistência.
Hugh P. Jeter escreveu um livro, que, entre muitos outros, procura impugnar
a Igreja Católica, seu Credo e sua história. Intitula-se: "Será mesmo cristão
o Catolicismo Romano?". A Redação de PR recebe vários escritos de tal natureza
por parte de pessoas que pedem uma resposta às objeções levantadas. A nossa
Redação já tem escrito repetidamente sobre tais assuntos: como quer que seja,
[a seguir] serão focalizados alguns aspectos dos mais representativos do
livro de H. Jeter e de escritos congêneres. De modo geral pode-se dizer que
tais obras se caracterizam por:
- Alusões falsas ou preconceituosas à Igreja. Os autores armam um fantoche
não católico e atiram nele, tencionando atacar a Igreja Católica.
- Citação parcial da Bíblia, pondo em relevo apenas os textos que correspondem
ao pensamento do autor e omitindo os demais.
- Tom proselitista dissimulado sob o aspecto de querer bem ao irmão
católico.
1. A Igreja
Da pág. 11 à pág. 24, H. Jeter trata da Igreja. Eis algumas de suas afirmações:
- Ao referir-se a Mt 16,13-18, Jeter escreve:
"Existe uma diferença entre petros (Pedro) e petra. Petros
significa 'um pedaço maciço de pedra'. Parece que o Senhor estava usando um
jogo de palavras e dizia o seguinte: 'Pedro, tu és uma pequena pedra, mas
sobre esta pedra maciça eu construirei a minha Igreja'" (pág. 13).
A propósito, o autor parece esquecer que Jesus não falou em grego, mas em
aramaico. Se em grego o trocadilho é falho, em aramaico ele é exato, pois
versa sobre Kepha...Kepha. Jesus mudou o nome de Simão para
Kepha em Jo 1,42, preparando assim, desde a vocação de Pedro, a promessa
de primado que lhe faria em Mt 16,18. De resto, está averiguado que é mais
fácil entender o texto do Evangelho traduzido do grego para o aramaico
(língua de Jesus e dos primeiros pregadores) do que o texto grego canônico.
Outro exemplo seria o uso de adelphoi em grego, palavra que traduz o
aramaico 'ah, cujo significa é mais amplo do que o grego adelphoi
(irmãos).
O autor H. Jeter nos diz que o Novo Testamento só conhece um fundamento da
Igreja: o Cristo Jesus, mencionado em 1Cor 3,11. Observemos contudo que o
Senhor que disse ser a luz do mundo (cf. Jo 8,12; 9,15; 12,46), atribui o
mesmo título aos seus discípulos (cf. Mt 5,14): por meio de Pedro, e mais
fundo que Pedro, Cristo fica sendo a Rocha, o fundamento invisível da Igreja.
É esse mesmo Jesus que "possui a chave de Davi, que abre de modo que ninguém
fecha, que fecha de sorte que ninguém abre" (Ap 3,7). Em Cristo e em Pedro,
portanto, residem análogos poderes (designados pelas mesmas metáforas); é de
Cristo que eles dimanam para o Apóstolo, de sorte que este vem a ser o Vigário
ou Representante de Jesus na terra.
O texto de Mt 16,13-19 é muito claro em favor do primado de Pedro. Jeter o
impugna e não cita dois outros textos que corroboram o mesmo primado:
- Lc 22,31s: "Simão, Simão, eis que Satanás pediu insistentemente
para vos peneirar como trigo; eu, porém, roguei por ti, a fimde que tua fé
não desfaleça. Quando te converteres, confirma teus irmãos".
- Jo 21,15-17: "Jesus disse a Simão Pedro: 'Simão, filho de João,
tu me amas mais do que esses?' Ele respondeu: 'Sim, Senhor, tu sabes que te
amo'. Jesus lhe disse: 'Apascenta as minhas ovelhas'. Pela segunda vez lhe
disse: 'Simão, filho de João, tu me amas?' 'Sim, Senhor', disse ele, 'tu sabes
que te amo'. Disse-lhe Jesus: 'Apascenta as minhas ovelhas'. Pela terceira
vez disse-lhe: 'Simão, filho de João, tu me amas?' Entristeceu-se Pedro
porque pela terceira vez lhe perguntara: 'Tu me amas?' e lhe disse: 'Senhor,
tu sabes tudo, tu sabes que te amo'. Jesus lhe disse: 'Apascenta as minhas
ovelhas'."
O fato de que Pedro e seus sucessores foram fracos do ponto de vista moral
indica bem que não é o homem quem rege a Igreja, mas é Cristo mediante os
homens que Ele quer escolher e que são meros instrumentos do Senhor. Este
governa a Igreja prolongando, de certo modo, o mistério da Encarnação,
isto é, utilizando a precariedade humana como canal de graça e salvação.
- À pág. 15 escreve H.P.Jeter:
"Se a Igreja Católica é infalível em doutrina, por que então através dos
séculos tantas doutrinas têm sido mudadas e outras acrescentadas?
Por que já não são ensinados os poderes temporais da Igreja como enumerados
por Pio IX? Por que já não se pratica a Inquisição? Por que deixaram o ensino
acerca do Limbo desde o Concílio Vaticano II? Por que foram acrescentadas
mais algumas coisas às doutrinas e práticas já aprovadas: a transubstanciação
(1215 dC), a confissão auricular (1215 dC), a do Purgatório (proclamada em
1438 dC), a infalibilidade papal (1870 dC), a imaculada conceição de Maria
(1854 dC) e a ascensão de Maria (1850 dC)?"
Em resposta, dir-se-ia:
- O poder temporal da Igreja não é artigo de fé. Trata-se de um fator
contingente, que contribui para o livre exercício da missão pastoral do
Papa; não subordinado a um poder civil, pode ele mais desimpedidamente
cumprir sua tarefa de Pastor Universal.
- A Inquisição também nunca foi matéria de fé. Era tida como um dever de
consciência dos cristãos medievais, que não podiam conceber uma sociedade
pluralista como ela é hoje; nem os maiores Santos da Idade Média protestaram
contra ela. Quanto à Inquisição de Espanha e Portugal, a partir do século XV,
tornou-se mais e mais o joguete dos monarcas que assim desajavam unificar
a população de seu país, à revelia mesmo das intervenções da Santa Sé.
- A doutrina do Limbo nunca foi declarada artigo de fé. Tornou-se doutrina
comum a partir de S. Anselmo de Cantuária (+1109). Hoje em dia a Teologia
propõe outro modo de encarar a sorte das crianças que morrem sem Batismo.
- A Transubstanciação é a conversão do pão e do vinho no Corpo e no Sangue
de Cristo, de acordo com as afirmações do próprio Jesus em Jo 6,51-58; Mt 26,26-28;
Mc 14,23-24; Lc 22,19; 1Cor 11,23-25. A fidelidade à Bíblia, que os protestantes
tanto professam, exigem que se entendam as palavras do Senhor em todo o seu
realismo, como foram entendidas durante dezesseis séculos e até hoje são
entendidas tanto por católicos como por orientais ortodoxos.
- A Confissão Auricular é praxe fundamentada no próprio Evangelho, onde
Jesus transmite aos Apóstolos o poder de perdoar os pecados (cf. Jo 20,22s).
Para poder exercer a faculdade de perdoar ou não perdoar em nome de Cristo,
deve o ministro poder avaliar o estado de alma do penitente - o que só é
viável se este manifesta o que lhe vai no íntimo.
- A crença na existência do Purgatório, longe de ter sido aceita em
1438 (por que tal data?), remonta ao século II aC, como professa 2Mc 12,39-45.
É de notar que Lutero não quis reconhecer como canônico este livro da Bíblia
dos cristãos; eliminou-o do catálogo sagrado.
- A Infalibilidade Papal é professada desde os primeiros séculos, não com
a clareza de que goza em nossos dias, mas de maneira tal que os historiadores
a identificam no decorrer dos séculos. [...]
- A Imaculada Conceição de Maria é deduzida do fato de que Maria, chamada
a ser a Mãe de Deus feito homem, não pode ter estado alguma vez sujeita ao
pecado. Tal verdade de fé não é explicitamente enunciada nos Evangelhos
porque estes não foram escritos para relatar traços de Mariologia; Maria aí
só aparece tão somente como a Mãe de Jesus, que é a figura central do texto
sagrado. Todavia, a Tradição Oral professou tal artigo de fé.
- A Assunção (não Ascenção) de Maria é conseqüência da vitória de Maria
sobre o pecado: aquela que nunca esteve sob o domínio do pecado, não podia
ficar nas garras da morte, que, como refere São Paulo (Rm 5,12-17), resulta
do pecado dos primeiros pais.
- Às págs. 15 e seguinte, escreve H. P. Jeter:
"Se a Igreja Católica é infalível, por que Mussolini, sendo católico,
invadiu a Etiópia? Por que existiu a Inquisição em países como a Espanha e
Portugal, que se dizem católicos? Por que espanhóis e portugueses não queriam
permitir que suas colônias se emancipassem? Por que proibiram aos leigos a
leitura da Bíblia e em outras épocas a recomendaram?"
A resposta a tais questões não é difícil, como se depreenderá:
- Mussolini não invadiu a Etiópia a mando da Igreja Católica. Embora seja
filho da Igreja, um católico pode errar: o próprio Senhor Jesus predisse
que no seu campo haveria trigo e joi; Ele não quer que se arranque o joio
antes do fim dos tempos. O Papa ultimamente tem pedido perdão pelos pecados
dos filhos da Igreja infiéis à sua Santa Mãe. Distingamos entre pessoa
e pessoal da Igreja; a pessoa é a Igreja enquanto vivificada
pelo Cristo ou como Esposa sem mancha nem ruga (Ef 5,27); o pessoal
da Igreja são os filhos da Igreja, nem sempre dóceis aos ensinamentos de sua
Mãe. [...]
- Sobre a Inquisição já foi dito algo neste artigo. É de notar que na
península ibérica a Inquisição foi muito manipulada pelos monarcas, desejosos
de eliminar de seus territórios judeus e muçulmanos. A Inquisição Espanhola,
extinta no começo do século XIX, era dita "Inquisição Régia".
- Nenhum dos países colonizadores viu com prazer a descolonização de suas
posses na África ou na Ásia. As razões para tanto eram complexas. Tal
atitude não afeta a infalibilidade da Igreja.
- Quanto à leitura da Bíblia, observe-se quanto vai dito no artigo de
PR 451/1999, págs. 547-549: [Ouve-se, por vezes, dizer que a Igreja Católica
proibiu a leitura da Bíblia. A resposta há de ser deduzida de um percurso
da história. Ora, está averiguado que, nos primeiros séculos, muito se
recomendava a leitura do texto sagrado. Na Idade Média e em épocas posteriores
(especialmente no século XVI) surgiram hereges (cátaros, valdenses, wycliff,
reformadores protestantes) que traduziam a Bíblia do latim para o vernáculo
instilando no livro sagrado idéias contrárias à reta fé. Daí proibições,
formuladas por Concílios, de se utilizar a Bíblia em língua vernácula, a não
ser que o leitor recebesse especial autorização para fazê-lo. As restrições
foram impostas não ao texto latino, mas às traduções vernáculas, em virtude
de fatores contingentes; a Igreja, como Mãe e Mestra, sente o dever de zelar
pela conservação incólume da fé a Ela entregue por Cristo e ameaçada pelas
interpretações pessoais dos inovadores da pregação; eis por que lhe pareceu
oportuno reservar o uso da Bíblia a pessoas de sólida formação cristã nos
séculos em que as heresias pretendiam apoiar no texto sagrado as suas
proposições perturbadoras. Ainda no
século XIX a Igreja via nas traduções vernáculas da Bíblia (patrocinadas
pelas Sociedades Bíblicas protestantes) o canal de concepções heréticas.
Todavia, a partir do papa S. Pio X (+1903), deu-se uma volta às fontes, que
incluiu a recomendação da leitura da Bíblia, por parte de todos os fiéis,
em língua vernácula. No momento presente, dado que existem boas edições
da Escritura nas línguas vivas, a Igreja fomenta o recurso assíduo à
Palavra de Deus escrita e lida no concerto da Tradição da Igreja.]
- À pág. 16 pondera Hugh P. Jeter:
"Durante vários séculos, a missa foi celebrada em latim. Desde o
Concílio do Vaticano II pode ser celebrada na linguagem do povo, embora
saibamos que houve uma forte objeção a esta mudança. Se anteriormente era
algo sacrílego, por que agora deve ser aceito?"
- A pergunta parece ignorar que há certas leis que devem ser periodicamente
revistas e reformuladas, pois toda lei visa a promover o bem comum da
sociedade nas sucessivas situações por que os homens passam. No tocante à
língua da celebração eucarística, foi o vernáculo (latim) na antiguidade; o
latim ficou sendo o idioma culto até o fim da Idade Média. No século XVI os
reformadores protestantes pleitearam o uso do vernáculo, que naquelas
circunstâncias foi rejeitado pela Igreja Católica, pois havia o risco de
que o vernáculo se tornasse veículo de teses protestantes infiltradas
sorrateiramente na Liturgia. Em nossos dias tal perigo já não existe; daí a
permissão de se celebrar a Missa em vernáculo. Tais fatos não afetam artigos
de fé ou de moral.
- À pág. 18 lê-se:
"É bom salientar que o conceito evangélico de santo é o de alguém
que vive de modo santo, enquanto que, no Catolicismo, os santos são
unicamente aqueles que foram oficialmente beatificados e declarados santos
pelo papa"
- Realmente o autor de compraz em caricaturar para escarnecer. É claro que,
também para os católicos, a santidade é um valor íntimo, sem o qual não há
santos; a declaração pontifícia consiste apenas em proclamar esse valor
íntimo, depois de cuidadosamente comprovado.
- Ainda à pág. 18 encontra-se o seguinte:
"O título de 'Igreja Católica Romana' é em si mesmo uma contradição,
pois 'romana' estabelece uma área geográfica, enquanto que 'Católica'
significa 'universal'."
- Deve-se responder que a Igreja é católica, ou seja, universal, mas ela
tem um governo central situado em Roma - o que explica o predicado "romana";
este não limita a universalidade da Igreja, mas apenas indica qual é a
"caixa postal" da Igreja. Da mesma forma, Jesus era e é o Salvador universal
ou de todos os homens, mas é chamado "Nazareno" porque, vivendo na terra,
precisava de ter um endereço ou um pouso.
2. A Bíblia Sagrada
Passamos a considerar outro capítulo do livro de Hugh P. Jeter.
2.1. O catálogo bíblico
Às págs. 32 e seguinte, diz o autor:
"Há, de imediato, uma diferença entre a Bíblia católica e a versão
protestante. A Bíblia católica inclui no Antigo Testamento os livros de
Tobias, Judite, Sabedoria, Siraque, Baruque, e o primeiro e o segundo livros
de Macabeus. Também há acréscimos aos livros de Ester e Daniel. Essa é a
principal diferença entre as duas Bíblias.
Por que os cristãos evangélicos rejeitam esses livros chamados "apócrifos"?
A seguir, expomos algumas razões:
- Os próprios livros não se dizem inspirados. No segundo livro de Macabeus
15:37-38, lemos: 'Assim se passaram os acontecimentos relacionados com Nicanor.
Como desde aquela época a cidade ficou em poder dos hebreus, eu também terminarei
aqui mesmo meu relato. Se foi bem escrito em sua composição, isto é o que eu
pretendia; se imperfeito e medíocre, fiz o máximo que me foi possível'.
- Os livros apócrifos nunca foram citados por Cristo ou pelos apóstolos,
mas eles, sem dúvida, citaram muitas partes da Bíblia.
- O material não mostra nenhuma inspiração. Em 2Macabeus 12:43-45 lemos
acerca de uma coleta que devia ser enviada a Jerusalém para que se oferecesse
sacrifícios e oferendas pelo pecado e orações pelos mortos... algo que não
figura em nenhuma parte das Escrituras.
- Todos os livros apócrifos foram acrescentados ao Antigo Testamento.
Conforme expõe Romanos 3:2, foi 'confiada a palavra de Deus ao povo judeu'.
Portanto, todos deveríamos considerar de suma importância a rejeição desses
livros quanto à sua inspiração."
Eis o que a propósito se pode observar:
- O fato de que o autor sagrado confesse ter-se esforçado ou mesmo ter
penado para escrever seu livro não significa que não usufruiu da inspiração
bíblica. Esta não é um ditado mecânico, que dispense o homem de refletir,
pesquisar e, em suma, fazer tudo o que deve realizar um bom escritor. A
inspiração (que não é revelação) consiste em que Deus ilumine a mente do
homem antigo para que, utilizando os dados de sua cultura arcaica, ponha por
escrito uma mensagem que corresponde fielmente ao pensamento de Deus, mas
não deixa de estar revestida da roupagem humana. Assim, o livro sagrado é, ao
mesmo tempo, divino e humano. É através das vicissitudes de uma redação
característicamente semita ou grega, portadora de todas as marcas do trabalho
humano, que Deus quer falar aos homens. São Lucas o atesta no prólogo do
seu Evangelho, quando afirma que, "após acurada investigação de tudo desde
o princípio, resolveu escrever" (Lc 1,3).
- Assim como Jesus e os Apóstolos nunca citaram explicitamente os livros
que os protestantes têm por apócrifos e os católicos consideram deuterocanônicos,
assim também Jesus e os Apóstolos nunca citaram alguns livros que são
unanimemente reconhecidos como canônicos; tal é o caso de Eclesiastes,
Ester, Cântico, Esdras, Neemias, Abdias, Naum.
Verificamos também que nos escritos do Novo Testamento há citações implícitas
dos livros deuterocanônicos. Assim, por exemplo: Rm 1,19-32->Sb 3,1-9;
Rm 13,1; 2,11->Sb 6,4.8; Mt 27,43->Sb 2,13.18; Tm 1,19->Eclo 4,34; Mt 11,29s->Eclo 51,23-30;
Hb 11,34s->2Mac 6,18-7,42.
Nos mais antigos escritos patrísticos são citados os deuterocanônicos como
Escritura Sagrada: Clemente Romano (em cerca de 95), na epístola aos
Coríntios, recorre a Jt, Sb, fragmentos de Dn, Tb e Eclo; o Pastor de
Hermas, em 140, faz amplo uso do Eclo e do 2Mac (cf. Semelhanças 5,3.8;
Mandamentos 1,1...); Hipólito (+235) comenta o livro de Daniel com os
fragmentos deuterocanônicos; cita como Escritura Sagrada Sb, Br e utiliza
Tb e 1/2Mac.
- O fato de que em 2Mac 12,43-45 se lê algo que "não figura em nenhuma
parte das Escrituras" nada significa. O raciocínio de Jeter equivale a uma
petição de princípio: o autor quer dizer que 2Mac 12,43-45 não pode ser
bíblico porque Jeter de antemão o exclui, eliminando as Escrituras Sagradas
o 2º de Macabeus. De resto, não se pode excluir tal livro, datado do século
II aC, por apresentar algo que não esteja em livros mais antigos, pois é
notório que a Revelação progrediu no Antigo Testamento.
- O autor parece ignorar que a Bíblia Sagrada continha os sete livros
deuterocanônicos ou "apócrifos" até Lutero. Foi Lutero que os eliminou e
não foi o Concílio de Trento (1545-1563) que os acrescentou. [...]
2.2. O uso da Bíblia entre os católicos
Às págs 25-32 Hugh P. Jeter se detém em alegar que durante séculos a Igreja
restringiu ou proibiu o uso da Bíblia entre os fiéis católicos. [...]
[Quanto a esta questão, foi dado um breve resumo acima].
Muitos outros pontos do livro de Hugh P. Jeter poderiam ser considerados,
evidenciando-se a sua inconsistência. Em geral, a literatura polêmica
protestante se ressente de preconceitos que obcecam os respectivos autores
e os levam a atribuir à Igreja Católica o que ela jamais disse ou fez. O
amor à VERDADE há de ser característica do autêntico cristão.
De resto, o baixo nível das acusações se depreende de outras objeções
propagadas em folhas volantes. Assim, por exemplo:
"A 500 anos atrás o Papa mandou 'matar' Galileu só porque ele disse
que a terra é redonda. A 2.700 anos atrás a Bíblia já dizia que a terra
é redonda (Isaías 40:22)".
Estas frases contêm várias imprecisões, próprias de quem fala sem saber ao
certo ao que diz:
- Galileu faleceu em 1642, portanto há pouco mais de 350 anos; faleceu de
morte natural. Foi controvertido porque defendia o heliocentrismo, em lugar
do geocentrismo. O dêutero-Isaías (Is 40-55) profetizou durante o exílio
(587-538 aC), ou seja, há 2.500 anos aproximadamente; ao falor do "ciclo
da terra", não se pode dizer que tinha em vista a esfericidade da terra.
Mais:
"Disse Deus: 'Não é bom que o homem esteja só, dar-lhe-ei uma
mulher' (Gênesis 2,18). O papa Gregório 7º proibiu o casamento dos padres
em 1074 dC".
- O autor deste texto esquece que São Paulo, após a entrada do Reino do
Messias neste mundo, recomenda a vida una ou indivisa; cf. 1Cor 7,25-35.
Aliás, estes versículos são geralmente silenciados pelos protestantes
quando querem impugnar o celibato. Este foi, a princípio, espontaneamente
abraçado pelo clero; só aos poucos foi-se tornando lei.