A g n u s D e i

O CÂNON BÍBLICO
Autor: Mauro Sérgio Alves Pereira da Silva

Dentre as minhas tantas conversas com nosso irmãos separados, eles sempre alegam que a Lista dos livros da Bíblia Católica está errada, pois, segundo eles, "os católicos adulteraram a lista colocando 7 livros apócrifos (chamados "Deuterocanônicos" pelos católicos no Sixto de Sena) para justificar suas práticas idolatras".

Partindo da idéia protestante acima é que iremos avaliar se há verdade em tal argumento.

Cânon: vem de "cana", mas é empregado no sentido de "doutrina", "norma" que rege a vida (Gl 6,16). A Igreja também utiliza o termo para indicar a "relação", ou "lista" dos livros que são inspirados por Deus e que servem de "norma" da fé, de "base e critério" para o ministério da pregação e do ensino no caminho da Justiça (cf. 2Tm 3,14-16). Lembremos, de antemão, que em harmonia com a Bíblia há também a Tradição da Igreja. Juntas, elas constituem a Palavra de Deus.

Segundo a Tradição dos Judeus da Palestina, a coleção dos "Livros Sagrados" concluiu-se no Tempo de Esdras e Neemias (v. Lc 16,29; 24,27.44; At 13,15).

Em Ne 8,1.13-14.18; 1Mc 12, 9; 2Mc 2, 13-15; Dn 9,2, dá a entender que, em seu respectivo tempo, já existia uma coleção de livros que eram colecionados e considerados inspirados por Deus.

O Evangelista Lucas menciona a Bíblia usando a seguinte divisão: "A Lei de Moisés, os profetas e os Salmos" para significar a Bíblia inteira do AT (cf. Lc 16,29; 24,27.44; At 13,15). No prólogo do livro do Eclesiástico em grego, pelos anos 132 ou 130 a.C., informa que os livros sagrados se dividem em : "A Lei, os Profetas e os outros escritos".

Somente por volta do ano 100 d.C. é que os Judeus se pronunciaram oficialmente sobre o cânon dos livros considerados inspirados. Isto ocorreu no sínodo de Jâmnia. A cidade de Jâmnia se situa na fronteira de Judá (Js 15,11), a atual Yebna, a 19 km ao sul de Jafa. No Talmud, Jâmnia era centro de cultura judaica, para onde fugiram muitos sábios judeus logo após a queda de Jerusalém (70 d.C.).

Os rabinos que se reuniram em Jamnia, seguiram os seguintes critérios para definir os cânon da Bíblia Hebraica:

  • Somente os livros antigos, que tivessem sido escritos antes de Esdras e Neemias.

  • Redigidos em língua sagrada, isto é, o hebraico.

  • Originados e compostos na palestina e não em terras estrangeiras;

  • Que estivessem de acordo com a lei de Moisés.

Estabelecidos estes critérios de canonicidade, os rabinos não aceitaram os seguintes livros:

  1. Tobias.
  2. Judite.
  3. Sabedoria.
  4. Eclesiástico.
  5. Baruc.
  6. 1Macabeus.
  7. 2Macabeus.

Segundo eles, estes livros foram escritos depois de Esdras – Neemias, em grego, fora da Palestina e estariam em desacordo com a Lei de Moisés...

Desse modo, a Bíblia Hebraica contém um cânon de 39 livros chamado "cânon curto" ou "Palestinense", adotado pelos judeus até os nossos dias.

a. A TRADUÇÃO DOS LXX

Por detrás desses critérios, estava o desejo de pôr de lado os escritos do Novo Testamento (Cartas de Paulo, Evangelhos, etc.), que já eram lidos e respeitados pelas comunidades com a mesma veneração e valor que se davam aos escritos do Antigo Testamento.

Porém, os judeus da Diáspora (=dispersão dos judeus), em Alexandria (Egito), com o desejo de ensinar seus filhos na Tradição dos Pais, precisavam de uma "tradução" dos livros sagrados do Hebraico para o grego. Na época, o grego era a língua comum (koiné) entre o povo fora da Palestina.

Quem pediu essa tradução foi Ptolomeu II Filadelfo (283-246 a.C.), que desejava ter uma tradução dos livros sagrados na sua grande biblioteca que fundou em Alexandria.

Foram enviados 72 peritos, 6 de cada uma das 12 tribos, para fazerem a Tradução. No prólogo do Eclesiástico (1,24) menciona o rei Evergetes. Este rei é Ptolomeu VII Evergetes (v. 38). A pedido desse rei, o Eclesiástico foi traduzido para o grego, pelo ano 132 ou 130 a.C. Assim estabelecemos o período da Tradução dos LXX (250 a 130 a.C.).

Na Tradução dos LXX estavam inclusos os 7 livros (Tobias, Judite, Sabedoria, Eclesiástico, Baruc, 1 e 2 Macabeus), que depois seriam rejeitados pelos Rabinos em Jâmnia.

A Bíblia dos LXX, conhecida também como SEPTUAGINTA, é composta de 45 ou 46 livros, com a divisão dos livros de Jeremias e Lamentações. Ficou conhecida como "cânon longo" ou "Alexandrino", escrito em grego.

b. OBSERVAÇÕES PARTICULARES

Jesus e os seus Apóstolos adotam em suas pregações a tradução alexandrina; esta parece constituir o Antigo Testamento de Jesus e seus discípulos.

Se verificarmos as 350 citações bíblicas no NT, 300 são tiradas da tradução dos LXX. São citações implícitas de Deuterocanônicos no Novo Testamento:

  1. Tobias 12, 15, em Ap 8,2; 13, 21-22, em Ap 21, 18-20.

  2. Judite 13, 10, em Lc 1, 42.

  3. Sabedoria 2, 18-20, em Mt 27, 43; 7, 25-27, em Hb 1,3; 11, 15; 12, 24; 13, 10-11, em Rm 1, 24; 13, 1 – 9, em Rm 1,20.

  4. Eclesiástico 1,10, em 1Cor 2, 9; 5, 11, em Tg 1, 19; 17, 8, em Rm 1, 20; 24, 19; 51, 23-30, em Mt 11, 28.

  5. 1Macabeus 12, 9, em Rm 15, 4.

  6. 2 Macabeus 6, 18; 7, 42, em Hb 11, 35.

A Igreja, cabeça de Cristo e sucessora dos Apóstolos, continua preservando o mesmo cânon, que nos foi dado por Cristo e pelos Apóstolos.

Em todos os pronunciamentos oficiais da Igreja sobre o cânon dos livros inspirados, aparece sempre a tradição dos LXX, quando ela determina: "Estes livros devem ser aceitos como sagrados e canônicos na sua integridade total e em suas partes" (Denz. 1809).

Vejamos alguns dos pronunciamentos Oficiais da Igreja sobre a lista dos Livros Inspirados:

  • Sínodo de Hipona(392(3))
  • Sínodo de Cartago(379)
  • Concílio de Toledo (400 e 447)
  • Símbolo "Quicumque" (Denz. 32)
  • Concílio Romano(382) - Papa São Dâmaso I (366-384) (Denz. 84)
  • III Concílio de Cartago(397) - Papa São Síriaco(384-398) (Denz. 92)
  • Concílio Vaticano I (1869 – 1870) Sessão III (de 24 de abril de 1870)
  • Concílio Vaticano II (1693 – 1965) Constituição Dogmática "Dei Verbum", n° 11.

Observando a história da Igreja desde o Concílio de Jerusalém (At 15) e olhando a lista dos Concílios acima, entende-se o que seja Tradição...

O termo canônico significa que um dado livro é reconhecido pela Igreja como Inspirado e pertencente, por essa causa, ao cânon Bíblico.

No Sixto de Sena (1520- 1569), introduziu-se as seguintes terminologias para os livros canônicos:

  1. Protocanônicos: são os 39 livros aceitos pelos judeus e pelos alexandrinos.

  2. Deuterocanônicos: são os 7 livros aceitos pelos alexandrinos e pela Igreja Cristã.

Esses termos causam às vezes certa confusão, pois dão a impressão de a Igreja tivesse definido primeiro(proto) um cânon; depois tê-lo-ia completado com um segundo (deutero = que vem depois). Os protestantes chamam de apócrifos os sete livros ("deuterocanônicos" para os Católicos). Mas "apócrifos" para os Católicos são os livros de autores desconhecidos e que não fazem parte do cânon bíblico.

No século XVI os "reformadores" protestantes, seguidores de Lutero, reassumiram a posição dos judeus de Jâmnia, e recusaram os sete livros Deuterocanônicos. Essa atitude foi iniciada por KARLSTADT em 1520. Lutero adotou tal atitude e colocou os Deuterocanônicos em apêndice sob o título de "apócrifos".

CONCLUSÃO

São estas as razões que fazem a Bíblia protestante diferente da Bíblia Católica (embora ainda hajam os erros de tradução na Bíblia deles). Para eles, como para os Judeus, o AT é composto de 39 livros.

Os protestantes rejeitaram os 7 livros provavelmente porque os católicos citavam-nos para defender certas doutrinas como:

  • Purgatório (Sb 3, 4 – 6; 2 Mc 12, 43 – 46).

  • Boas obras (Tb 4, 7 – 12; 12, 8 – 9; Eclo 3, 33 – 34; 29, 11 – 12).

Doutrinas estas não aceitas pelos protestantes.


Bibliografia: "Curso Fé e Doutrina" (ed. Pelicano)