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APOLOGIA
de Aristides de Atenas

Tradução: Carlos Martins Nabeto

OS FALSOS DEUSES DOS CALDEUS

III. Vejamos, pois, quais destes [homens] participam da verdade e quais [partcipam] do erro. Os caldeus, com efeito, por não conhecerem a Deus, se extraviaram por detrás dos astros e passaram a adorar às criaturas no lugar d'Aquele que os havia criado; e fazendo daqueles [astros] certas representações, passaram a clamar às imagens do céu e da terra, do sol, da lua e dos demais astros ou luminares; e, confinando-os em templos, os adoram, dando-lhes nome de deuses, guardando-os com toda a segurança, para que não sejam roubados por ladrões, sem perceber que os que guardam são superiores aos guardados, e os que constroem são superiores às suas próprias obras. Assim, se os seus deuses são impotentes para sua própria salvação, como poderiam oferecer a salvação aos outros? Logo, se extraviaram os caldeus, prestando culto a imagens mortas e inúteis.

E fico maravilhado - ó Rei - como aqueles que são, entre eles, chamados de "filósofos" não perceberam absolutamente que também esses mesmos astros são corruptíveis. Sim, e se os astros são corruptíveis e dominados pela necessidades, como podem ser deuses? E se os astros não são deuses, como poderiam ser [deuses] as imagens feitas em honra deles?

IV. Passemos, portanto - ó Rei - aos próprios elementos, para provar que não são deuses, mas sim corruptíveis e mutáveis, desprovidos de tudo por ordem do Deus verdadeiro, Aquele que é incorruptível, imutável e invisível. Ele tudo vê, tudo muda e transforma como quer. Que posso então dizer dos astros?

Os que crêem que a terra é Deusa se enganam, pois a vemos incomodada e dominada pelos homens, cavada e emporcalhada, tornando-se inútil, porque se não a aduba, converte-se em infértil como uma telha, onde nada nasce. Só que, se for regada em demasia, corrompe-se ela mesma bem como os seus frutos. Ela também é pisada pelos homens e pelos animais; se mancha com os sangue dos assassinatos; é cavada para receber os cadáveres e, assim, se converte em depósito de mortos. Sendo assim, não é possível que a terra seja deusa, mas obra de Deus, para utilidade dos homens.

V. Os que pensam que a água é Deus erram, pois também ela foi feita para a utilidade dos homens e por eles é dominada; fica suja e se corrompe; se altera quando é servida, muda de cor e congela com o frio; é levada para lavar todas as imundícies... Por isso, é impossível que a água seja Deus, mas é obra de Deus.

Os que crêem que o fogo é Deus estão equivocados, pois o fogo foi feito para a utilidade dos homens e por eles é dominado; é levado de um lugar para outros para cozer e assar toda espécie de carnes e até mesmo para cremar cadáveres. Além disso, se corrompe de várias maneiras ao ser apagado pelos homens. Por isso, não é possível que o fogo seja Deus, mas obra de Deus.

Os que crêem que o sopro dos ventos é Deus se equivocam, pois é óbvio que está a serviço de outro e que foi preparado por Deus, em graça aos homens, para mover os navios, transportando os alimentos, e atender às suas demais necessidades; fora isso, aumenta ou cessa pela ordem de Deus. Portanto, não é possível pensar que o vento seja Deus, mas obra de Deus.

VI. Os que crêem que o sol é Deus se equivocam, pois vemos que ele se move por necessidade, muda e altera de signo, pondo-se e nascendo para desenvolver as plantas e ervas em utilidade aos homens; vemos também que possui divisões com os demais astros, que é muito menor que o céu, que sofre eclipses em sua luz e não goza de qualquer autonomia. Por isso, não é possível pensar que o sol seja Deus, mas obra de Deus.

Os que pensam que a lua é Deusa se equivocam, pois vemos que ela se move por necessidade e muda de fase, pondo-se e nascendo para a utilidade dos homens; ela é menor que o sol, cresce, reduz e sofre eclipses. Por isso, não é possível pensar que a lua seja deusa, mas obra de Deus.

VII. Os que crêem que o homem é Deus erram, pois vemos que ele é concebido por necessidade, se alimenta e envelhece ainda contra a sua vontade; às vezes está alegre, outras vezes está triste, e precisa de comida, bebida e roupas; vemos, ainda, que ele guarda raiva, inveja e ambição, muda seus propósitos e tem mil defeitos; corrompe-se também de muitos modos em razão dos elementos, dos animais e da morte que lhe é imposta. Não é, portanto, admissível que o homem seja Deus, mas obra de Deus.

Assim, os caldeus se extraviaram em suas concupiscências, pois adoram os astros, elementos corruptíveis e às imagens mortas, sem compreenderem o que divinizam.